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SociedadeDinamarca

Dinamarca quer menos "não ocidentais" em bairros pobres

Stephanie Burnett
29 de março de 2021

O governo dinamarquês quer aprovar lei controversa para reduzir a parcela de residentes "não ocidentais" em bairros desfavorecidos, de 50% para 30%. Grupos de direitos humanos alertam para discriminação.

Pessoas de braços dados em corrente diante de prédios de tijolos
Moradores e ativistas dos direitos humanos num protesto em 2020 contra a chamada "Lei do Gueto" em CopenhagueFoto: Philip Davali/Ritzau Scanpix/AP/picture alliance

Um projeto de lei apresentado em meados de março na Dinamarca concentra-se nas chamadas "sociedades paralelas". O governo dinamarquês usa este termo para se referir a áreas residenciais que acredita não estarem suficientemente integradas na sociedade dinamarquesa. A nova lei visa reduzir a proporção de residentes "não ocidentais" em bairros desfavorecidos para 30% nos próximos dez anos e realocar as famílias afetadas para outras partes do país.

Mesmo hoje, a proporção de residentes "não ocidentais" em distritos desfavorecidos não deve exceder 50%, segundo prevê a "Lei do Gueto", aprovada em 2018. O regulamento aplica-se aos bairros da cidade com mais de mil habitantes, cuja estrutura populacional é medida com base em quatro critérios: desemprego, renda, educação e criminalidade.

A proposta visa evitar "sociedades paralelas", um termo que o governo usa para rotular áreas consideradas carentes de integração na sociedade dinamarquesa.

A data da votação no Parlamento ainda não foi definida, mas é alta a probabilidade de obtenção da maioria necessária. Advogados de direitos humanos anunciaram resistência, caso o projeto seja aceito conforme planejado.

Violação da proibição de discriminação?

"Nossa preocupação é que a etnia esteja mais em foco do que antes", explica Nanna Margrethe Kusaa, especialista do Instituto Dinamarquês de Direitos Humanos. "Estamos muito preocupados porque, quando se trata de etnia, se acendem todas as luzes de advertência."

O gabinete da comissária de direitos humanos da ONU, Michelle Bachelet, já havia alertado para as consequências de tal mudança na lei no ano passado: "A população não branca e não europeia da Dinamarca é particularmente afetada pelas medidas contra os chamados "moradores não ocidentais", diz um comunicado.

De acordo com Kusaa, há três processos contra a atual Lei do Gueto pendentes na Dinamarca. "Somos da opinião que estes casos são muito provavelmente de discriminação, o que viola a legislação nacional e europeia", assinala a especialista.

Quem é "não ocidental"?

O Ministério do Interior da Dinamarca observa que a categorização "não ocidental" está de acordo com a Agência de Estatísticas dinamarquesa. Países ocidentais sob este conceito incluem os Estados da União Europeia (UE), assim como Reino Unido, Andorra, Islândia, Liechtenstein, Mônaco, Noruega, San Marino, Suíça, Vaticano, Canadá, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia.

"Todos os outros países são nações não ocidentais", informou o ministério em uma declaração à DW. "A distinção entre países ocidentais e não ocidentais não tem nada a ver com o sistema político, religião, economia ou cultura de um país", acrescentou.

Os críticos argumentam que esse tipo de projeto de lei estigmatiza os dinamarqueses de origem migratória, especialmente os muçulmanos e as "pessoas de cor", nome dado a quem não é percebido como branco e ocidental, e que têm experiências de racismo.

A ex-deputada do Parlamento Europeu Özlem Cekic, que é curda e foi uma das primeiras mulheres muçulmanas a ingressar no Parlamento da Dinamarca, considera o último projeto de lei contraproducente. "Concordo com o governo que há grandes problemas em alguns bairros", disse ela à DW. Mas estes não seriam tão grandes a ponto de ter de realocar as pessoas de seus bairros.

Özlem Cekic: projeto de lei visa as populações marginalizadas em geralFoto: Özlem Cekic

De acordo com Cekic, o projeto de lei visa as populações marginalizadas em geral. "Não se trata apenas de muçulmanos ou imigrantes, mas também da classe trabalhadora". Segundo ela, muitos moradores de bairros desfavorecidos não têm um meio de vida seguro.

Linha dura de Copenhague

A Dinamarca é um dos países da Europa com as mais duras leis de imigração e asilo. Ao contrário de outros Estados da UE, porém, este curso no país é apoiado por todos os principais partidos, tanto da esquerda como da direita.

A mudança começou em 2015, sob a então líder dos sociais-democratas dinamarqueses, Mette Frederiksen, que governa o país como primeira-ministra desde 2019. "A liderança partidária decidiu que os sociais-democratas seriam mai rígidos no que concerne à imigração, e foi exatamente isso que fizeram", explica Rune Stubager, cientista político da Universidade de Aarhus. "Agora eles estão defendendo esse curso com unhas e dentes".

Mette Frederiksen, premiê da DinamarcaFoto: Jens Dresling/Ritzau Scanpix/dpa/picture alliance

De acordo com Stubager, é provável que os sociais-democratas dinamarqueses também marquem pontos com o novo projeto de lei − mesmo que o Judiciário dinamarquês considere o critério "não-ocidental" uma violação da lei nacional e europeia.

Ganhos políticos − ou retrocessos?

Segundo a agência de estatística dinamarquesa, apenas 5,3% dos imigrantes "não ocidentais" viviam nas chamadas áreas problemáticas no ano passado. Para Özlem Cekic, esse curso político é arriscado. "As crianças dos bairros desfavorecidos se sentem dinamarqueses", diz ela. "Você nasceu na Dinamarca, tem passaporte dinamarquês, fala dinamarquês e estuda aqui."

Mas, segundo ela, as crianças teriam que continuar ouvindo: "Você não é dinamarquês porque é muçulmano". E Cekic termina com a pergunta: "Como você pode esperar que essas crianças sejam leais ao Estado se este não as aceita como são?"

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