Com nova sentença proferida pelo juiz Sérgio Moro, penas do ex-ministro somam 32 anos de prisão. Ele é acusado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro e emprestou jatinho de lobista 113 vezes.
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O ex-ministro José Dirceu foi condenado pela segunda vez nesta quarta-feira (08/03) por envolvimento em crimes investigados pela Operação Lava Jato. Desta vez, a pena imposta pelo juiz Sérgio Moro foi de 11 anos e três meses de reclusão em regime fechado.
Dirceu foi acusado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo a sentença de Moro, Dirceu recebeu propinas que somam 2,1 milhões de reais para agir em favor da empresa Apolo Tubulars em um contrato com a Petrobras para o fornecimento de tubos entre 2008 e 2012. O caso foi revelado na 30ª fase da Lava Jato, batizada de Operação Vício, realizada no dia 24 de maio de 2016.
"A corrupção com pagamento de propina de mais de dois milhões de reais e tendo por consequência prejuízo equivalente aos cofres públicos merece reprovação especial", escreveu Moro na sentença.
"O mais perturbador, porém, em relação a José Dirceu de Oliveira e Silva consiste no fato de que praticou o crime inclusive enquanto estava sendo processado e julgado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal na Ação Penal 470 [julgamento do mensalão], havendo registro de recebimento de propina, no presente caso, até pelo menos 23/07/2012. Nem o processo e o julgamento pela mais Alta Corte do País representou fator inibidor da reiteração criminosa", prosseguiu.
Além de Dirceu, outras quatro pessoas também foram condenadas na mesma ação penal. São elas: o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque (condenado a seis anos e oito meses); Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, irmão do ex-ministro (dez anos de prisão); Eduardo Aparecido de Meira, sócio da construtora Credencial (oito anos e nove meses); Flávio Henrique de Oliveira Macedo, também sócio da Credencial (oito anos e nove meses).
Outras duas pessoas, os executivos da Apolo Tubulars Paulo Cesar Peixoto de Castro Palhares e Carlos Eduardo de Sá Baptista foram absolvidas.
Esquema
Segundo a denúncia do caso, o valor de propinas do contrato chegou a 7 milhões de reais – 30% desse valor foi remetido para Dirceu por meio do empréstimo de dois jatinhos e pagamentos em dinheiro.
Os procuradores do caso afirmam que o ex-diretor da Petrobras Renato Duque viabilizou a contratação da Apolo Tubulars para o "fornecimento de tubos" e recebeu ajuda de Dirceu no processo. O valor inicial do contrato era de 255.798.376,40 de reais, mas o total explodiu com intervenção de Duque.
No final, a empresa foi contratada por 450.460.940,84 reais. Segundo a sentença, os valores de propina foram incluídos no próprio valor do contrato. Inicialmente, a operação fraudulenta foi dirigida pelo lobista Júlio Camargo, que não foi alvo de denúncia nessa ação penal por ter colaborado com a Justiça. Foi ele quem emprestou os jatinhos para Dirceu. No total, o ex-ministro utilizou as aeronaves 113 vezes, entre novembro de 2010 e julho de 2011.
Condenação anterior
Em maio do ano passado, Dirceu foi condenado a 23 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Dias depois, o juiz Moro acatou recurso da defesa e reduziu a pena para 20 anos e 10 meses de reclusão. Neste caso, Dirceu foi acusado de participar de um esquema de contratos superfaturados da construtora Engevix com a Petrobras. Na sentença, Moro havia apontado que Dirceu recebeu 15 milhões de reais em propinas.
Dirceu permanece preso no Complexo Médico-Penal em Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba. Ele foi detido em agosto de 2015, na deflagração da 17ª etapa da Lava Jato, batizada de Pixuleco.
O advogado de Dirceu, Roberto Podval, criticou a nova condenação em declaração ao jornal Folha de S.Paulo. "Hoje não se julgam mais os fatos e sim o nome de quem aparece na capa do processo. Estão matando o Zé Dirceu. E mais fácil matá-lo que admitir sua inocência. Espero com a teimosia dos burros que nossos juízes voltem a julgar se guiando pela Constituição, e não pela opinião pública."
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
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As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
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As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
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De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
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Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.