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Discurso contra sistema eleitoral dominou redes em novembro

23 de dezembro de 2020

Eleições nos EUA e pleito municipal no Brasil impulsionaram publicações que pedem o voto impresso e alimentam desconfiança no processo eleitoral. Não houve mobilização similar entre defensores do sistema.

Celular
Quase 1,5 milhão de publicações no Twitter, Facebook e YouTube abordaram temas de "desconfiança eleitoral" em novembroFoto: Nicolas Economou/NurPhoto/picture alliance

As redes sociais no Brasil foram inundadas durante o mês de novembro por publicações que contestaram a integridade do sistema eleitoral e que levantaram velhas bandeiras do bolsonarismo, como o voto impresso, aponta levantamento da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV DAPP).

O período foi marcado tanto pela eleição presidencial dos Estados Unidos quanto pelo pleito municipal no Brasil. Segundo a FGV DAPP, quase 1,5 milhão de publicações no Twitter, Facebook e YouTube abordaram temas de "desconfiança eleitoral" no intervalo de 1 a 30 de novembro.

Segundo o levantamento, o ataque hacker ao Superior Tribunal Eleitoral (TSE) e a demora do órgão em divulgar os resultados no primeiro turno e o resultado das eleições americanas – com desfecho desfavorável para Donald Trump, aliado de Jair Bolsonaro – serviram de catalisadores para essas publicações, mesmo que nenhuma prova de irregularidade tenha sido efetivamente encontrada nos pleitos.

Tanto no Twitter quanto no Facebook, houve um aumento expressivo nesse tipo de publicação a partir de 3 de novembro, data do pleito nos EUA. O pico ocorreu entre 15 e 17 de novembro, na esteira do primeiro turno das eleições municipais do Brasil. No Twitter, foram mais de 187 mil menções no dia 16. No Facebook, foram mais de 8,7 mil no dia 17.

No início de novembro, as redes só registravam algumas centenas de publicações nesse sentido. No YouTube, o pico de visualizações diárias de vídeos que reverberaram desconfiança sobre integridade das eleições ocorreu em 7 de novembro, dia do anúncio da vitória de Joe Biden nos EUA. Foram quase 2 milhões de visualizações a partir do Brasil. Uma nova alta (1,79 milhão) ocorreu em 16 de novembro, após o tumultuado primeiro turno brasileiro.

Bandeira do bolsonarismo

Segundo a FGV DAPP, a narrativa dominante nas publicações abordou a necessidade do voto impresso, uma ideia que já havia sido agitada por Bolsonaro e seus apoiadores em 2018, e que é rejeitada pelo TSE. Em 29 de novembro, durante o segundo turno, Bolsonaro voltou a defender a instituição do voto impresso no Brasil e ainda afirmou, sem provas, que as urnas eletrônicas são passíveis de fraude.

No início de março, antes da pandemia de covid-19 dominar o debate público, Bolsonaro chegou a afirmar que tinha "provas" de que foi vítima de fraude nas eleições de 2018. Segundo o presidente, ele só não foi eleito no primeiro turno por causa dessas "fraudes". À época, ele chegou a apontar que apresentaria as "provas" brevemente, mas nunca as apresentou.

Tal narrativa tem norteado a bandeira do voto impresso desde então, mesmo sem base na realidade. Os eventos do mês de novembro serviram como ponte para reestruturar a velha bandeira do bolsonarismo.

Segundo a FGV DAPP, as hashtags #votoimpressoem2022 e #votoimpressojá figuraram entre as mais compartilhadas no mês de novembro, somando quase 90 mil menções.

Repercussão das acusações de fraude de Trump

As eleições americanas também serviram de impulso para a narrativa de desconfiança sobre a integridade do processo eleitoral, com canais reverberando as acusações infundadas do presidente Trump sobre fraudes no pleito presidencial dos EUA.

Um mapa de interações feito a partir do sistema de recomendações do YouTube também mostrou um predomínio entre canais brasileiros das acusações de Trump sobre supostas fraudes. O estudo da FGV DAPP destaca o domínio da narrativa antissistema, normalmente disseminada por contas que associadas ao bolsonarismo.

"A organização e a coordenação em torno do tema produziram engajamento expressivo quando direcionado à crítica ao sistema eleitoral; do ponto de sua defesa não houve mobilização relevante", conclui o estudo.

JPS/ots