Produzido para a TV em duas partes, filme combina documentário e cenas com atores para ilustrar trajetória de um dos maiores dramaturgos alemães do século 20. Em foco, as tumultuadas relações amorosas de Bertolt Brecht.
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O cineasta Heinrich Breloer acredita que "todos nós carregamos conosco imagens diversas de Bertolt Brecht". Para confirmar a tese, ele lança na Berlinale, o Festival Internacional de Cinema de Berlim, seu olhar próprio sobre o dramaturgo e poeta alemão. Trata-se de uma produção para TV em duas partes, que irá ao ar no país no fim de março.
Juntamente com o colega Horst Königstein, morto em 2013, Breloer é considerado o criador do docudrama, uma forma híbrida, hoje estabelecida, entre filme de ficção e documentário. Ele alcançou maestria nesse gênero, sendo muito elogiado por suas produções a respeito de personalidades e acontecimentos políticos, históricos e culturais.
Especialistas elogiam o docudrama justamente por sua "forma aberta". Eles mostram a "realidade" por trás da ficção e ao mesmo tempo enriquecem o documento cinematográfico com um nível interpretativo adicional. E aqui é possível ver paralelos com o trabalho brechtiano, já que também o dramaturgo defendia uma cultura teatral "aberta", em que os espectadores não se sentissem seguros dentro de uma ilusão.
"Assim como Brecht leva os atores até o proscênio para falarem de seus papéis, quebrando, assim, a ilusão, esse distanciamento também ocorre quando eu interrompo a representação cênica com a documentação", comenta o diretor sobre a relação entre conteúdo e forma em sua nova produção.
Na primeira parte de Brecht, o espectador é confrontado com o autor durante a República de Weimar, quando ele ascende a astro do teatro alemão, primeiro como adolescente que, na escola secundária, lia em público seus ensaios antipatrióticos; depois como jovem e selvagem gênio da poesia, celebrando na peça Baal a si mesmo e ao teatro enquanto máquina de emoções.
Por fim, ele aparece como o criador de Tambores na noite e A Ópera dos Três Vinténs, a qual se torna o maior sucesso teatral da República de Weimar. Ao fim da primeira parte da minissérie, o ano é 1933, a tomada de poder pelos nacional-socialistas. Brecht está a caminho de seu primeiro exílio, em Praga.
A segunda parte o encontra nos primeiros anos do pós-guerra. Na Alemanha Oriental, sob regime comunista, ele é festejado por uns como grande inovador, enquanto outros o olham com desconfiança. Breloer explora com sensibilidade o fato de o ator ter amigos e inimigos em ambas as Alemanhas, de admiradores públicos aos guardiães da ideologia unificada socialista.
Em nenhuma época ou lugar de sua vida ele é um homem sobre quem haja uma opinião unânime. Pois, até mesmo na Alemanha Ocidental do pós-guerra, havia tanto patrocinadores quanto uma maciça frente contra o fundador do teatro Berliner Ensemble, que sempre se definiu como "comunista".
O que eleva o docudrama de Heinrich Breloer acima de uma bem comportada narrativa biográfica é o olhar sobre a vida privada do também ativista político. O tema "Brecht e as mulheres" se estende sobre todos os 180 minutos do filme, e o cineasta o coloca sob uma luz bastante crítica. Não como um misógino, mas sim como mulherengo que pouco ligava para moral e empatia.
"Amigos e colaboradores que já viram o filme dizem que tiveram que pensar constantemente no movimento #MeToo, é quase inevitável", conta Breloer. De fato: Elisabeth Hauptmann, Ruth Berlau, Marianne Zoff, Paula Banhölzer, Regine Lutz e, é claro, a atriz Helene Weigel acompanharam o autor durante anos, por vezes vivendo ao mesmo tempo com ele, e todas sofriam com a situação.
Um dos pontos fortes da série em duas partes é Breloer não evitar explorar essas arestas de caráter de Bertolt Brecht, e sim entrelaçar com elegância os diferentes aspectos biográficos: vida e obra, amor e refinamento poético.
Nem todos apreciarão essa decisão, contudo, alguns talvez percebam como íntima e pessoal demais essa penetração na vida particular, tantos anos após a morte do artista. Outros gostarão, justamente, que Brecht desça um pouco do "pedestal". Para o diretor Heinrich Breloer, a resposta é fácil: "Todos nós carregamos conosco imagens diversas de Brecht."
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As representações teatrais sempre fizeram parte do cotidiano brasileiro, mesmo antes da construção das primeiras casas de espetáculos no país. Veja aqui uma seleção dos mais belos e mais antigos teatros do Brasil.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Teatro Municipal de Ouro Preto
Quem diria que por trás desta casa alaranjada (dir. na foto) se encontra o mais antigo teatro em funcionamento das Américas, o Teatro Municipal de Ouro Preto, antiga Casa da Ópera de Vila Rica. O teatro foi inaugurado em 6 de junho de 1770. Localizado no Largo do Carmo, o prédio não se destaca do casario vizinho. Somente a lira de Apolo sobre o frontão da fachada denuncia a função do edifício.
Foto: DW/C. Albuquerque
Antiga Casa da Ópera de Vila Rica
A disposição interna remonta aos teatros barrocos italianos. Em Ouro Preto, três pisos distintos se distribuem em plateia, camarotes, frisas e galerias, totalizando 300 lugares. As mulheres confinavam-se nos camarotes. Os atores eram pardos ou negros. O teatro de Vila Rica introduziu duas atrizes no ano de sua inauguração, revolucionando a moral da época, que não admitia mulheres no palco.
Foto: imago/imagebroker
Teatro Arthur Azevedo, São Luís
Este teatro com fachada neoclássica e frontão triangular onde se vê a lira de Apolo em alto relevo foi construído em São Luís por dois comerciantes portugueses. Na Europa, esse esquema de teatro correspondeu à ascensão da burguesia. Ele foi inaugurado com o nome de Teatro União em 1817, dois anos após a inclusão do Brasil ao Reino Unido de Portugal e Algarves, fato que originou o nome do prédio.
Foto: Teatro Arthur Azevedo
Antigo Teatro União
O projeto era grandioso. A simbologia teatral, baseada na mitologia greco-romana, é abundante. Na época, São Luís era a quarta maior cidade do Brasil e os 800 lugares do teatro representavam 5% da população local. Nos últimos anos do Império, as mulheres descem finalmente à plateia. O nome Teatro Arthur Azevedo viria somente na década de 1920 em homenagem ao importante teatrólogo maranhense.
Foto: Teatro Arthur Azevedo
Teatro Santa Isabel, Recife
Projetado em estilo neoclássico, este teatro foi inaugurado em 1850 no Recife em homenagem à princesa Isabel, a quem lhe deve o nome. Seus jardins foram mais tarde incorporados à Praça da República, cujas palmeiras imperiais valorizaram a arquitetura, integrando-a na paisagem. Durante muitos anos, o Santa Isabel foi considerado a mais bela construção teatral do império.
Foto: CC BY 2.5/P. Camelo
Exemplo pernambucano
O Santa Isabel é um dos poucos exemplos do genuíno neoclassicismo no Brasil na primeira metade do século 19. A sociedade vinha atravessando um lento, mas decisivo processo de transformações no que diz respeito à mentalidade e aos hábitos sociais que justificavam um desejo de contato social e busca de divertimento. A iniciativa de construir um teatro de porte serviu de exemplo para outras capitais.
Foto: imago/Fotoarena
Teatro São Pedro, Porto Alegre
A construção de um teatro que abrigasse dignamente as diferentes manifestações culturais era um sonho que acompanhava governantes e população da província de São Pedro do Rio Grande do Sul desde a colônia. Em 1833, o presidente da província doou um terreno para o início das obras, mas com o início da Revolução Farroupilha em 1835, a construção foi suspensa, sendo retomada anos depois.
Foto: Diego Neves
Projetado por um alemão
Projetado pelo arquiteto alemão Georg Karl Phillip Theodor von Normann, o teatro foi inaugurado em 27 de junho de 1858 na capital gaúcha, trazendo o estilo neoclássico prematuramente para a província. O arquiteto buscou fugir da rigidez prismática característica do neoclassicismo, mas o prédio sofreu reformas, que modificaram significativamente o projeto original.
Foto: Marcelo Nunes
Teatro da Paz, Belém
No final do século 19, a Amazônia se tornou uma das regiões mais ricas do planeta. Nesse período áureo do ciclo da borracha, foi fundado em Belém o Theatro da Paz. Inaugurada em 1878, ele foi projetado em estilo neoclássico pelo engenheiro pernambucano José Tibúrcio Pereira de Magalhães. Mas sua fachada teve de ser modificada para conciliar o projeto com os rigorosos cânones clássicos.
Foto: CC BY 2.0/C. R. de Abreu Silva
Características grandiosas
Foi a primeira casa de espetáculos construída na Amazônia com características grandiosas: acústica perfeita, lustres de cristal, piso em mosaico de madeiras nobres, afrescos nas paredes e teto, elementos decorativos revestidos com folhas de ouro. A sala de espetáculos comporta hoje 900 pessoas. As cadeiras conservam o estilo da época em madeira e palhinha adequadas ao clima da região.
Foto: L. Santa Brígida
Teatro Amazonas, Manaus
Inaugurado em dezembro de 1896, a construção do Teatro Amazonas também se deve ao crescimento econômico proporcionado pelo ciclo da borracha, numa época em que a burguesia de Manaus enviava a sua roupa de cama para ser lavada na Europa. Ele foi construído num estilo eclético neoclássico, adornado pela cúpula com as cores da bandeira nacional que se eleva acima da cobertura.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Nomes famosos
Para executar painéis e pinturas, foram contratados artistas europeus que hoje compõem um dos mais ricos acervos do gênero no Brasil. A variedade de artistas também é grande, já tendo passado por seu palco nomes como Heitor Villa-Lobos, em 1911; José Carreras, em 1996; e Luciano Pavarotti, que cantou no palco do Teatro Amazonas durante uma visita turística: ele queria experimentar a acústica.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Teatro Municipal do Rio de Janeiro
O teatro, que se autodenomina o mais importantes do país, foi inaugurado no Rio de Janeiro em 1909. O projeto foi resultado de um concurso, em que o primeiro e segundo vencedores fundiram as propostas. A distribuição dos volumes em três corpos – entrada, corpo central (sala de espetáculos) e caixa de cena (palco) – é claramente inspirada na Ópera de Paris, construída por Charles Garnier em 1875.
Foto: Ministério da Cultura/P. França
Inspiração barroca
O neobarroco foi o estilo empregado preferencialmente em casas de espetáculo, como se vê na exuberante decoração do teatro carioca. A escada principal é revestida com dois tipos de ônix, bronzes dourados e cristais. Inicialmente, o Municipal recebia apenas companhias estrangeiras. A partir dos anos 1930, no entanto, ele passou a ter seus próprios corpos artísticos: orquestra, coro e balé.
Foto: Secretaria de Cultura/RJ
Teatro Alberto Maranhão, Natal
Inaugurado em 1904, o antigo Teatro Carlos Gomes manteve forma de chalé até 1910, quando foi reconstruído por Herculano Ramos, arquiteto que já havia trabalhado no Teatro José de Alencar de Fortaleza, e pouco aproveitou da estrutura anterior, acrescentando elementos do ecletismo do século 19. Sua arquitetura é semelhante à do José de Alencar, com parte interna em estrutura metálica independente.
Foto: CC BY 2.0/A. R. Costa
Teatros-jardim
Eles chamam atenção pela existência de avarandados e pátios internos, especialmente criados para o arejamento desses edifícios erguidos em regiões de temperaturas elevadas. Na reforma executada durante o governo de Alberto Maranhão, o teatro ganhou em 1912 um pavimento superior, portões e grades de ferro vindas da França, assim como balcões e obras de arte na fachada. Seu nome foi mudado em 1957.
Foto: gemeinfrei
Teatro José de Alencar, Fortaleza
Inaugurado na capital alencarina em 1910, a construção é dividida em bloco frontal, onde se encontra o vestíbulo e foyer; pátio interno, sala de espetáculos e caixa de cena. A fachada eclética apresenta elementos do neobarroco. Na época, a caixa de palco e plateia construídas em estrutura metálica ainda não eram vistas como "arquitetura", tendo de ser escondida por elementos clássicos de fachada.
Foto: DW/C. Albuquerque
Fundição escocesa
O Teatro José de Alencar é um dos mais belos exemplos da arquitetura de ferro no Brasil. Sua estrutura metálica foi executada pela fundição escocesa Walter MacFarlane & Co. A ideia de construir um teatro-jardim foi concebida em 1904 pelo capitão Bernardo José de Melo. Mas o jardim mesmo, projetado por Burle Marx, só foi construído na reforma de 1975. Ele ocupa todo o espaço vizinho ao teatro.
Foto: CC BY 3.0 br/ME/Portal da Copa/Embratur
Teatro Municipal de São Paulo
Inaugurado em 1911, o teatro paulista é fruto do ciclo do café. Segundo a instituição, "o Theatro Municipal surgiu para a cidade de São Paulo como um grande símbolo das aspirações cosmopolitas do início do século 20." Trata-se de uma construção eclética, que recorre à sobrecarga ornamental com o objetivo de atingir acentuados efeitos de luz e sombra, à semelhança do municipal do Rio de Janeiro.
Foto: imago/Fotoarena
Grande teatro, grandes nomes
Com a construção influenciada pela Ópera de Paris, São Paulo integrou-se, finalmente, ao roteiro internacional dos grandes espetáculos. Por seu palco, passaram nomes como Enrico Caruso, Maria Callas, Renata Tebaldi, Bidu Sayão, Arturo Toscanini, Camargo Guarnieri, Villa-Lobos, Ana Pawlova, Arthur Rubinstein, Isadora Duncan, Margot Fonteyn, Nijinsky, Nureyev, Baryshnikov e muitos outros.