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Doença respiratória deixa hospitais alemães no limite

6 de dezembro de 2022

Vírus sincicial respiratório (VSR) que circula na Alemanha afeta principalmente crianças e causa superlotação de hospitais. "Não há capacidade, e temos que garantir que nenhuma criança morra neste período", diz pediatra

Enfermeira cuida de criança em UTI pediátrica
Enfermeira de terapia intensiva em um hospital de Stuttgart: criança está sendo ventilada porque está infectada com o VSRFoto: Marijan Murat/dpa/picture alliance

Um bebê – que precisou ser reanimado – foi internado em um hospital infantil superlotado e, por isso, um menino de três anos terá que esperar pelo terceiro dia consecutivo por sua operação cardíaca urgente. Outra criança percorreu 150 quilômetros para ser transferida durante a noite, de um hospital em Hannover para outro em Magdeburg, porque todos os leitos estavam ocupados – e 21 hospitais próximos não tinham vagas. E há ainda centenas de crianças que ficam na recepção à noite toda e, depois, são mandadas para casa. Ou recebem cuidados em enfermarias normais, embora devessem estar há muito tempo em um leito de UTI.

"Crianças estão morrendo, porque não conseguimos mais cuidar delas", alerta Michael Sasse, médico de terapia intensiva pediátrica da Escola de Medicina de Hannover, em referência à situação de calamidade vivida pelos hospitais infantis alemães.

A pediatra do Hospital Charité, em Berlim, Mehrak Yoosefi, também usa palavras duras para descrever a realidade. "Todos os hospitais infantis estão funcionando 24 horas por dia, sete dias por semana [para dar conta da demanda]. Não há capacidade, e não podemos mais assegurar atendimento. Temos que garantir que nenhuma criança morra neste período."

VSR é especialmente perigoso para crianças pequenas

Na Alemanha, este mês de dezembro é a época em que ocorre o auge dos vírus que causam resfriados. De acordo com o Instituto Robert Koch (RKI), agência governamental responsável pelo controle e prevenção de doenças infecciosas, quase uma em cada dez pessoas no país sofre atualmente de uma doença respiratória – ou seja, quase nove milhões de pessoas.

Os vírus são particularmente comuns entre crianças de cinco a 14 anos. E o vírus sincicial respiratório (VSR) é particularmente perigoso para crianças e, especialmente, bebês: ele afeta as vias respiratórias e pode causar casos graves que até mesmo requerem respiração artificial.

O fato de que o vírus está atualmente atingindo a Alemanha com toda força tem a ver com a pandemia de coronavírus. Devido à exigência do uso de máscara facial e aos lockdowns, crianças pequenas contraíram o VSR com menos frequência – e agora, com o relaxamento das regras sobre o uso de máscaras faciais na Alemanha, elas estão se contagiando com a doença. E isso causa graves consequências para o sistema de saúde alemão, que já está sobrecarregado.

Yoosefi afirma que parte das crianças não pode ser internada devido à falta de leitos. "Algumas delas não podem receber ventilação mecânica, porque não há equipamentos suficientes para monitorar a saturação de oxigênio. São crianças que podem ter paradas respiratórias", afirma. "Crianças estão recebendo alta e sendo transferidas mais cedo de unidades de terapia intensiva para enfermarias normais."

A pediatra Mehrak Yoosefi alertou as autoridades competentesFoto: Privat

Quase não restam leitos hospitalares livres

Uma pesquisa da Associação Alemã Interdisciplinar de Medicina Intensiva e de Emergência (Divi) aponta que metade dos hospitais em todo o país já teve que rejeitar a internação de crianças em unidades de cuidados intensivos pediátricos.

E de 110 hospitais infantis, 43 não tinham recentemente um único leito livre na enfermaria. Além disso, embora existam leitos suficientes em UTIs pediátricas, quase 40% deles não podem ser usados por falta de pessoal. "Estamos totalmente sobrecarregados", diz Yoosefi, pediatra do Hospital Charité. "Falta pessoal em todas as enfermarias para lidar com o grande volume de trabalho."

Apesar da situação dramática, hospitais infantis alemães anteciparam o que iria acontecer no inverno. Em janeiro, Mehrak Yoosefi e a Iniciativa Hospitais Infantis – um grupo de pediatras da capital alemã – alertaram políticos.

Porém, não houve nenhuma reação das autoridades. A segunda carta para a secretária estadual de Saúde de Berlim, Ulrike Gote, e para o ministro da Saúde alemão, Karl Lauterbach, foi enviada em setembro. "Nós previmos essa onda. E agora, claro, o desânimo é muito grande, porque acabou sendo muito pior do que era esperado."

300 milhões de euros para hospitais infantis nos próximos dois anos

Os políticos reagiram tarde demais para este inverno. O Parlamento alemão, o Bundestag, aprovou um pacote de leis que repassará mais dinheiro para os cofres dos hospitais infantis.

Em 2023 e 2024, um adicional de 300 milhões de euros deverá ser repassado aos hospitais a cada ano, além de um extra de 120 milhões de euros para enfermarias de obstetrícia. Mas Yoosefi não concorda com uma proposta que o ministro da Saúde, Karl Lauterbach, propõe para lidar com a crise atual: retirar funcionários de outras enfermarias e levá-los para os hospitais infantis.

"No papel, é certamente possível transferir funcionários de um lugar para outro. Mas de onde essas pessoas virão? As outras enfermarias não têm pessoal em excesso que possa ser simplesmente redistribuído", conta Yoosefi. "Além disso, a pediatria é uma especialidade à parte: médicos que lidam com adultos não se sentem seguros o suficiente para trabalhar com crianças."

"Falta-nos pessoal qualificado, e é por isso que não podemos operar todos os leitos", diz Jörg Dötsch, diretor da clínica pediátrica do Hospital Universitário de ColôniaFoto: Klinik und Poliklinik für Kinder- und Jugendmedizin/Uniklinik Köln

Desvantagens do ensino da enfermagem generalista

O Ministério Federal da Família anunciou que a formação de enfermagem se tornaria mais moderna e atraente a partir de 1º de janeiro de 2020. Mas, quase três anos depois, os hospitais infantis perceberam que a formação geral de enfermagem, com a qual os profissionais podem trabalhar com todas as faixas etárias e áreas, também tem desvantagens.

O professor Jörg Dötsch, diretor da clínica pediátrica do Hospital Universitário de Colônia e presidente da Sociedade Alemã de Medicina Infantil e do Adolescente, explica que, há alguns anos, as autoridades decidiram adaptar a formação de enfermagem às práticas europeias.

"Esperava-se que algumas dessas pessoas pudessem se especializar em enfermagem pediátrica", afirma. "O problema é que a proporção daqueles que se especializam é muito pequena. Talvez ainda mais crítico é que essas especializações não são oferecidas em todos os estados."

Além disso, como no caso da enfermagem de adultos, muitos enfermeiros em hospitais infantis deixaram seus empregos durante e depois da pandemia de coronavírus. No passado era normal um enfermeiro trabalhar por 30 ou 40 anos. Hoje, esses profissionais abandonam a profissão depois de oito ou nove anos, observa Dötsch. Quer dizer, essas pessoas faltam agora para garantir o atendimento ideal para crianças e jovens. "Falta-nos pessoal qualificado, e é por isso que não podemos operar todos os leitos."

Compensação fixa para cuidados de saúde, especialmente para hospitais infantis

E há ainda a chamada Fallpauschale, uma compensação fixa paga pelo governo que causa dor de cabeça – principalmente aos hospitais infantis. Desde 2004, os serviços hospitalares são pagos de acordo com o diagnóstico feito – e não com os gastos de pessoal e tempo efetivos.

Enquanto um exame de sangue num adulto leva apenas alguns minutos, coletar sangue de crianças pequenas e explicar questões aos pais pode levar meia hora. "Você precisa de muita energia e tempo, porque crianças, adolescentes e seus pais necessitam de um nível de cuidado completamente diferente", diz Dötsch.

Entretanto, o ministro da Saúde, Karl Lauterbach, anunciou que, no futuro, as necessidades médicas – em vez das restrições econômicas – deverão ser o pilar do tratamento dispensado a pacientes em hospitais. E, ainda, que a compensação fixa para cuidados de saúde será, em breve, uma coisa do passado. Mehrak Yoosefi, a pediatra de Berlim, mal pode esperar por isso. "A pediatria não deve ser regida pela taxa fixa. Tem de haver outra forma de compensação", conclui.

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