Dono do Infowars é condenado nos EUA por desinformação
5 de agosto de 2022
Ativista de extrema direita Alex Jones foi sentenciado a pagar US$ 49,3 milhões por espalhar mentiras sobre o massacre de Sandy Hook. Pais de uma das crianças mortas no ataque relataram que receberam ameaças.
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Dono do site de desinformação Infowars, o ativista de extrema direita americano Alex Jones foi condenado pela primeira vez pela Justiça dos EUA por espalhar informações falsas, ao negar a existência do pior atentado a uma escola na história dos Estados Unidos: o massacre de Sandy Hook, em 2012, em que 20 crianças com idade entre seis e sete anos e seis funcionários foram mortos por um jovem de 20 anos com livre acesso a armas de fogo.
A decisão da Justiça do estado do Texas sentenciou Jones nesta quinta-feira (05/08) ao pagamento de indenização no valor de 4,1 milhões de dólares (R$ 21,4 milhões) mais danos punitivos de 45,2 milhões de dólares (R$ 233 milhões) à família de uma das crianças mortas no ataque.
O jornalista alegou falsamente que o tiroteio em Sandy Hook havia sido uma "encenação” orquestrada por interessados em aumentar o controle sobre armas nos Estados Unidos – no país, famoso pelo acesso fácil a armas de fogo e massacres recorrentes, há menos cidadãos que armas em poder de civis.
O valor total da indenização nesse caso poderá estabelecer um marco no futuro para outros processos contra Jones e o deixa sob pressão financeira. Também levanta dúvidas sobre a existência do Infowars no futuro – o site foi banido do YouTube, Spotify e Twitter por propagar mensagens que incitam o ódio.
Jones é amplamente conhecido em círculos de extrema direita e seu estilo serviu de modelo para imitadores mundo afora. Ele já foi chamado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro de "guerreiro", e suas publicações já foram compartilhadas por figuras do bolsonarismo como as deputadas Bia Kicis e Carla Zambelli. Em março de 2020, Jones entrevistou o filho do presidente da República sobre os perigos do "socialismo (...) e como o despertar global está acontecendo e levará a grandes coisas para os amantes da liberdade".
Além de espalhar mentiras sobre o massacre de Sandy Hook, Jones regularmente repete teorias conspiratórias sobre os atentados de 11 de Setembro, o ex-presidente Barack Obama, a pandemia de covid-19 e sobre uma suposta “Nova Ordem Mundial”. Mais recentemente, ele esteve diretamente envolvido no protesto de 6 de janeiro de 2020 que resultou na invasão da sede do Congresso americano por uma turba de extremistas.
Família sofreu ameaças e intimidações
Neil Heslin e Scarlett Lewis, que moveram o processo, haviam relatado em depoimento ao tribunal o sofrimento por que passaram ao longo de dez anos de trauma: primeiro com a morte do filho e, depois, ao terem sua casa alvejada por tiros, serem intimidados por pessoas estranhas na rua e receberem ameaças pela internet e pelo telefone – tudo, afirmam, foi incentivado por Jones e seu site Infowars.
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A mãe da criança chegou a confrontar Jones em um dos momentos do julgamento. "É incrível que nós tenhamos que estar aqui fazendo isso, que tenhamos que implorar para que você seja punido e pare de mentir.”
Ao longo do processo, Jones também foi confrontado pelos advogados da família ao alegar que não usava emails. A defesa apresentou uma correspondência do Infowars em que um funcionário relatava receitas de 800 mil dólares em um único dia com a venda de produtos no site.
Durante o julgamento, a empresa de Jones, Free Speech System, controladora do portal Infowars, entrou com pedido de falência. Pais das vítimas de Sandy Hook afirmam que o movimento foi uma estratégia para evitar as indenizações e alegam que o jornalista tirou 62 milhões de dólares da companhia e criou dívidas inexistentes no valor de 65 milhões de dólares – valor que seria inteiramente devido a uma outra companhia controlada por Jones, a PQPR Holdings.
Não é o único julgamento que o jornalista deve enfrentar no estado do Texas – ele responde a um processo semelhante em Connecticut movido por parentes de outras vítimas e um agente do FBI, o serviço de inteligência norte-americano, que cuidava das investigações sobre o atentado, e a um outro processo na cidade de Austin.
Em pronunciamento em vídeo, Jones, que anteriormente classificou processos contra ele na Justiça como ataques à sua liberdade de expressão, declarou: "Admito que espalhei desinformação, mas não o fiz de propósito. Pedi desculpas às famílias, e o tribunal entendeu isso. Foi errado o que fiz a essas famílias, mas não o fiz de propósito." Sua defesa também tentou eximir o jornalista da responsabilidade pelo assédio que o casal Neil Heslin e Scarlett Lewis passaram a sofrer após as mentiras espalhadas pelo Infowars.
ra (AP, Reuters, EFE)
As piores matanças com arma de fogo nos EUA desde Columbine
Com uma cultura de armamento popular que contrasta com outras nações desenvolvidas, EUA são palco regular de massacres. Até mesmo terroristas islâmicos conseguiram comprar legalmente armas para cometer atentados no país.
Foto: Getty Images/E. Miller
Massacre na escola Columbine, 20/04/1999: 13 mortos
Em 1999, os estudantes Eric Harris e Dylan Klebold assassinaram 12 colegas e um professor, antes de cometerem suicídio. Imagens da frieza demonstrada pela dupla provocaram choque nos EUA. "Columbine" se tornou sinônimo para massacres em escolas. Foi até cunhada a expressão "efeito Columbine" para descrever o impacto que a chacina teve sobre as medidas de segurança e na inspiração de imitadores.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Jefferson County Sheriff's Department
Ataque terrorista em San Bernardino, 02/12/2015: 14 mortos
Em 2015, o casal Syed Rizwan Farook e Tashfeen Malik abriu fogo na sede de um centro de atendimento para portadores de deficiências em San Bernardino, matando 14 e ferindo 22. Farook e Malik haviam se tornado radicais islâmicos nos anos precedentes. Ambos acabaram sendo mortos pela polícia. Os dois fuzis de assalto usados na chacina haviam sido comprados legalmente por um cúmplice
Foto: picture-alliance/dpa
Massacre na base militar de Fort Hood, 05/11/2009: 14 mortos
O major Nidal Hasan, psiquiatra do Exército dos EUA, matou 14 pessoas, entre as quais uma grávida de oito meses, e feriu 30 na base militar de Fort Hood, Texas, em 2009. Mesmo demonstrando sinais de radicalização islâmica, Hasan conseguiu comprar legalmente a pistola semiautomática usada no massacre. Preso em seguida, Hasan foi condenado à morte em 2013 e ainda aguarda execução.
Foto: Reuters
Matança em escola de Parkland, 14/02/2018: 17 mortos
Armado com um fuzil de assalto comprado legalmente, o ex-estudante Nikolas Cruz, de 19 anos, dirigiu-se a sua antiga escola em Parkland, Flórida, onde matou três funcionários e 14 estudantes. Tendo se entregado e se declarado culpado, ele ainda aguarda sentença. Semanas depois do massacre, milhões de jovens protestaram nos EUA por mais controle sobre as armas.
Foto: picture-alliance/newscom/G. Rothstein
Duplo ataque no Maine, 25/10/2023: 18 mortos
Armado com um fuzil, Robert Card, um reservista do Exército dos EUA de 40 anos, abriu fogo em uma pista de boliche da cidade de Lewiston, no estado do Maine. Depois, seguiu para um bar e voltou a disparar. Dezoito pessoas morreram nos dois ataques. Outras 13 ficaram feridas. A caçada ao agressor durou dois dias. Card foi encontrado morto em uma área rural, aparentemente depois de cometer suicídio
Foto: Androscoggin County Sheriff's Office via AP/picture alliance
Massacre em escola de Uvalde, 24/05/2022: 21 mortos
Após comprar legalmente dois fuzis de assalto, Salvador Ramos, de 18 anos, invadiu a escola de ensino fundamental Robb, em Uvalde, Texas. matando dois professores e 19 alunos entre 9 e 10 anos. A polícia demorou mais de uma hora para entrar no local e abater Ramos. O crime reacendeu o debate sobre o comércio desenfreado de armas de fogo nos EUA.
Foto: San Antonio Express-News/ZUMA Press/IMAGO
Ataque racista em hipermercado de El Paso, 03/08/2019: 23 mortos
Com um fuzil de assalto comprado legalmente, o supremacista branco Patrick Wood Crusius, de 21 anos, viajou até El Paso, Texas, cidade com mais de 80% da população de origem latina. Num hipermercado, matou 20 imediatamente, e mais três morreram no hospital. A polícia o identificou também como autor de um manifesto racista publicado na internet.
Foto: picture-alliance/dpa/Bildfunk/AP/The El Paso Times/M. Lambie
Chacina em igreja batista de Sutherland Springs, 05/11/2017: 26 mortos
Devin Patrick Kelley, ex-militar de 26 anos, com histórico de indisciplina e violência doméstica, matou 26, incluindo uma gestante de oito meses, na Primeira Igreja Batista em Sutherland Springs, Texas. Durante a chacina, Kelley foi baleado por um morador da vizinhança. Após fugir, cometeu suicídio. Ele comprara legalmente o fuzil e a pistola usadas no massacre.
Massacre de crianças na escola Sandy Hook, 14/12/2012: 27 mortos
Armado com um fuzil comprado legalmente por sua mãe, Adam Lanza, de 20 anos, abriu fogo na Escola Sandy Hook em Newtown. Das 26 vítimas, 20 eram crianças entre 6 e 7 anos. Antes de se dirigir à escola, Lanza assassinou sua mãe. A escala do massacre provocou indignação, mas ativistas pró-armas tentaram minimizar o episódio, espalhando mentiras de que o massacre fora encenado
Foto: Reuters
Massacre da Universidade Virginia Tech, 16/04/2007: 32 mortos
Armado com duas pistolas semiautomáticas, o estudante sul-coreano Seung-Hui Cho, de 23 anos, matou 32 e feriu 17 no campus da Universidade Virginia Tech, em Blacksburg. Cercado pela polícia, Cho cometeu suicídio. Mesmo sofrendo problemas mentais, ele conseguiu comprar legalmente as armas usadas na chacina. Num manifesto, Cho chamara os autores do massacre de Columbine de "mártires"
Foto: TIM SLOAN/AFP/Getty Images
Ataque terrorista em boate gay de Orlando, 12/06/2016: 49 mortos
Armado com um fuzil de assalto e uma pistola, o americano de origem afegã Omar Mateen, de 29 anos, entrou na boate gay Pulse, em Orlando, e matou 49, ferindo ainda 53. Em telefonema à polícia durante a chacina, Mateen fez um juramento de lealdade ao grupo jihadista "Estado Islâmico". Ele acabou sendo abatido pela polícia. As armas usadas na chacina haviam sido compradas legalmente .
Foto: Reuters/S. Nesius
Massacre em show de Las Vegas, 01/10/2017: 60 mortos
Stephen Paddock, investidor de 64 anos, se hospedou num hotel de Las Vegas e estocou mais de 20 fuzis de assalto comprados legalmente em duas suítes do 32º andar, que tinham vista para um espaço de concertos a céu aberto. Quando o local sediou um festival, Paddock abriu fogo, matando 60 e ferindo 413, e suicidou-se em seguida. Foi o pior massacre cometido por um só individuo na história dos EUA