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Drogas experimentais contra o ebola podem ser "faca de dois gumes"

Richard Walker (rc)7 de setembro de 2014

O atual surto da doença já causou mais de 1.500 mortes. Segundo especialista, a resistência das comunidades em aceitar os controles sanitários pode ter tido papel fundamental no alastramento da doença.

Foto: picture-alliance/dpa

O atual surto do vírus ebola é considerado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como o pior da história. Desde março, mais de 3 mil casos da doença já foram confirmados, resultando em mais de 1.500 mortes.

A OMS liberou o uso de substâncias experimentais em pacientes infectados na África Ocidental. A especialista em ebola Barbara Knust, epidemiologista do Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos, entende que tais medicamentos podem ser uma "faca de dois gumes". Ela aponta que as drogas experimentais devem ser previamente testadas antes de serem aplicadas na população afetada.

Segundo a especialista, a resistência de algumas comunidades em aceitar as medidas sanitárias de controle da epidemia teve papel fundamental nas proporções do surto que ocorre atualmente na região.

DW: Há grande curiosidade em relação aos medicamentos experimentais contra o vírus ebola, como os utilizados nos pacientes americanos Kent Brantly e Nancy Writebol, que sobreviveram a doença. A senhora acha que essas drogas podem ter um papel decisivo no surto na África Ocidental?

Barbara Knust: As drogas experimentais foram utilizadas apenas em poucos pacientes. É claro que há grande interesse em todo o mundo sobre a possibilidade de elas poderem ajudar. Há também terapias adicionais que estão sendo discutidas. No entanto, há muito trabalho a ser feito para se descobrir quais seriam os benefícios terapêuticos.

É importante que esse trabalho seja levado adiante, especialmente no contexto da epidemia atual. Mas também é importante garantir que sejam seguras para as pessoas e que haja também alguma comprovação de sua efetividade.

Barbara Knust (esq.), epidemiologista do Centro de Controle de Doenças dos EUAFoto: Center for Disease Control

Há também temas éticos envolvidos e decisões bastante difíceis a serem tomadas, já que essas drogas têm disponibilidade limitada. Qual seriam, em sua opinião, as regras essenciais para lidar com esses dilemas éticos?

Os dilemas éticos fazem com que essa situação seja uma "faca de dois gumes". Por um lado, temos um medicamento que ainda não foi realmente testado em seres humanos. E se aplicarmos essa droga em uma população desfavorecida como a da África, poderão dizer que estamos utilizando essas pessoas para testar os medicamentos.

Mas se não fornecermos as drogas a essa população gravemente afetada pela doença, e onde há claramente uma crise, alguns poderão dizer: "vocês estão se omitindo, não ajudam a situação". Acho muito importante assegurar que essas drogas sejam efetivas e seguras, antes de distribuí-las a essa população que já tem um histórico de resistir e não confiar nos esforços da saúde pública. Se não forem seguras, e mesmo assim distribuídas a uma população que já desconfia desses esforços, a situação poderá piorar.

Mas em longo prazo, a senhora vê essas drogas como uma linha de pesquisa promissora? Acha que elas poderão oferecer uma solução?

Adoraria ver surgir disso tudo algo como uma vacina que pudesse prevenir a doença entre uma população. Para alguém como eu, que pensa em como prevenir doenças em populações, eu prefiro pensar mais nessas linhas de pesquisa do que em ser o "departamento de combate ao fogo" que somos atualmente – onde temos um fogo ardendo fora de controle, que não tínhamos, inicialmente, como prevenir que começasse.

Enquanto isso, a epidemia continua a se alastrar na África Ocidental. A OMS fala agora no surgimento de 20 mil novos casos nos próximos meses. O que faz com que esse surto tenha dimensões tão grandes?

A epidemia está realmente se espalhando rapidamente, e isso tem muito a ver com as regiões onde as pessoas estão sendo infectadas. Essencialmente, os surtos acontecem em regiões precárias, em particular na Libéria e em Serra Leoa, onde o contato entre as pessoas é grande.

Há também muita dificuldade em se identificar as pessoas que estariam mais aptas a serem infectadas, que é a forma com que lidávamos anteriormente com os surtos. A essa altura, temos que pensar em outras coisas além de fazer um rastreamento dos contatos. Temos que pensar em providenciar bons cuidados e prevenir que os doentes transmitam a doença para outras pessoas.

A senhora acha que no futuro os surtos de ebola serão semelhantes a esse? Devemos esperar mais epidemias deste tipo?

Não necessariamente. A situação típica onde as pessoas são infectadas pelo vírus ebola ainda é em regiões remotas. Na África Ocidental, as áreas remotas são afetadas, mas existem também regiões com boas estradas, o que não é o caso de muitas das áreas onde tivemos surtos no passado. A capacidade das pessoas infectadas – além daquelas que foram expostas ao vírus – de se locomover facilmente pelos países da região pode ter tido um grande papel na maneira como o surto se espalhou rapidamente.

Resistência das comunidades em aceitar os controles sanitários pode ter sido fundamental no alastramento da doençaFoto: DW/B. Darame

Outro fator que continua a ter papel fundamental é a resistência das comunidades em participar nos esforços de controle da epidemia. Existem ainda muitas regiões onde as comunidades não permitem a entrada dos trabalhadores sanitários – e onde existe o medo da violência. Isso é algo que ainda deve ser tratado. Há muitos trabalhos em andamento para tentar fazer com que as comunidades participem e permitam o controle do surto nessas áreas.

A comunidade internacional foi demasiadamente lenta para identificar a seriedade desta epidemia?

Foi uma situação onde, em razão da resistência das comunidades, às vezes não conseguíamos obter informações corretas. O termo "zonas de sombras" foi utilizado para se referir às áreas onde não era possível ir e coletar as informações necessárias para avaliar as dimensões do surto. Acho que isso afetou os esforços, assim como as regiões onde os esforços foram levados adiante. Isso continua sendo problemático.

Devemos continuar com o trabalho de coleta de dados sobre a epidemia e de tentar compreendê-la, mesmo nos lugares onde não conseguimos o acesso necessário para contabilizar os casos, como normalmente faríamos.

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