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DW analisa boatos sobre eleição nos EUA

Sam Baker | Uta Steinwehr | Joscha Weber
5 de novembro de 2020

Enquanto o drama do pleito presidencial americano avança para o terceiro dia, acusações e desinformação enchem as redes sociais, incluindo tuítes do presidente. Checagem de fatos da DW separa realidade de ficção.

Espectadores assistem a candidato democrata Joe Biden em telão
Foto: Carlos Barria/REUTERS

Boatos sobre o processo de apuração das urnas nos Estados Unidos ou supostos casos de irregularidades têm circulado freneticamente pelo Twitter. Alguns foram até tuitados e retuitados pelo presidente Donald Trump e seus familiares. A equipe de checagem de fatos da DW filtra os ruídos e mostra o que até agora se sabe – ou não –sobre esta apertada disputa eleitoral.

1- Observadores das apurações sendo barrados?

Boato:

Copiando uma manchete do veículo de mídia de extrema direita Breitbart, Trump tuitou que havia caos, janelas tapadas e observadores barrados no local de contagem dos votos postais em Detroit, Michigan. O artigo incluía vídeos de apuradores cobrindo janelas, enquanto transeuntes do lado de fora tentavam acompanhar a contagem.

Fato:

A polícia realmente repeliu multidões que batiam nas portas e janelas do local de contagem em Detroit, gritando: "Parem a contagem!"

O que o artigo do Breitbart não menciona, porém, é que as autoridades eleitorais determinaram que os cidadãos não podiam entrar na sala por questões de capacidade. Cada facção podia ter 134 observadores para monitorar e criticar o processo de apuração, mas esse número foi excedido quando os funcionários contavam os votos dos residentes de Detroit. Além do contingente limitado de observadores republicanos, democratas e apartidários, também estavam presentes jornalistas e advogados.

"A monitoração das eleições é regulada pela lei estatal, mas alguns estados entregam a decisão às autoridades eleitorais", explica o relatório preliminar da Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) sobre as eleições de 2020 nos Estados Unidos, publicado em 4 de novembro, e prossegue: "Devido à pandemia de covid-19, autoridades eleitorais de diversas jurisdições limitaram o número de observadores permitidos."

O jornal Detroit Free Press cita diversos advogados segundo os quais os problemas começaram quando opositores republicanos intimidaram os funcionários, tirando suas máscaras, aproximando-se demasiado e agredindo-os verbalmente, inclusive instando-os a suspender a contagem porque a equipe de campanha trumpista haveria aberto um processo. A DW não pôde verificar se os advogados eram independentes ou representavam um partido político.

Às 17h56 (hora local, 19h56 em Brasília) da quarta-feira, a agência Associated Press declarou o candidato democrata, o ex-vice-presidente Joe Biden, vencedor no estado de Michigan.

2. Misteriosos 23.722

Boato:

Entre os adeptos de Trump circula o boato que Biden teria recebido 23.722 votos unânimes numa leva de votos da Filadélfia. O filho de Trump Donald Jr. também retuitou essa mensagem.

Fato:

Os votos da Pensilvânia ainda estão sendo contados, e no momento da presente publicação não apresentava um vencedor definido do pleito presidencial. A plausibilidade da afirmativa também é questionada por gente que não pertence nem ao Partido Democrata, nem ao Republicano.

A origem da cifra em questão parece ser um tuíte do site agregador de dados de jornalismo e pesquisas de opinião FiveThirtyEight, de propriedade da emissora ABC News. Por volta das 22h00 (na Europa Central, 16h00 em Brasília) de 4 de novembro, o serviço de notícias divulgou que uma leva de 23.722 votos contados de Filadélfia fora "toda para Biden". Portanto, o atual presidente republicano teria ficado com zero.

A checagem da DW examinou os resultados de todas as seções que haviam encerrado suas apurações até o momento desta publicação, totalizando 98% das cédulas. Em oito das 1.665 seções, Biden recebeu todos os votos, somando 1.286. Acrescentando os 426 das outras quatro seções em que Trump não recebeu nenhum voto, chega-se a 1.712 votos, bem abaixo dos 23.722 alegados.

Uma explicação possível é as cédulas terem sido agrupadas durante a contagem, e assim só foram relatados os votos para o candidato democrata. A FiveThirtyEight ainda não se manifestou à consulta da DW sobre a origem do polêmico número.

3. "Sharpiegate"

Boato:

O filho de Trump Eric retuitou uma afirmativa de que nas áreas republicanas os votantes teriam recebido canetas hidrocor (Sharpie, nos EUA) para que seus votos fossem invalidados.

Fato:

Segundo uma teoria de conspiração, as cédulas marcadas com canetas de ponta de feltro seriam inválidas, por não serem legíveis pelas máquinas de apuração. No entanto, os funcionários teriam especificamente fornecido marcadores hidrográficos aos eleitores de Trump.

As autoridades do Arizona asseguram tratar-se de uma alegação inteiramente falsa, e que os votos marcados com canetas hidrográficas também serão computados. Citada pelo jornal New York Times, a secretária de Estado do Arizona, Katie Hobbs, disse terem sido tomadas medidas para assegurar que manchas e tinta borrada não invalidassem os votos.

Segundo funcionários eleitorais, os marcadores de ponta fina foram expressamente escolhidos por serem a tinta que seca mais rápido, prevenindo borrões nas cédulas.

4. Giuliani vê fraudes postais

Boato:

Rudy Giuliani, advogado de Trump, declarou a uma multidão na Filadélfia, em 4 de novembro: "Nem um único republicano pôde ver nenhuma dessas cédulas postais. Se depender do que sabemos, elas poderiam ser enviadas de Marte. Ou poderiam ser do Comitê Nacional Democrata [DNC]. Joe Biden pode ter votado 50 vezes, até onde sabemos, ou 5 mil! Essas cédulas podem ser de Camden. A Filadélfia, infelizmente – e estou dizendo isso da minha própria cidade – tem reputação de fraudes eleitorais."

Fato:

Durante uma coletiva de imprensa, Giuliani afirmou, sem fornecer provas, que os observadores estavam sendo mantidos a 6 a 9 metros de distância das urnas. Segundo o site do governo da Pensilvânia, contudo, as normas de saúde e segurança ditadas pela covid-19 requerem que os voluntários se mantenham a 1,80 metro dos demais presentes.

Além disso, quem vota pelo correio, seja Biden ou qualquer outro cidadão, não pode apresentar um número ilimitado de cédulas, pois deve se registrar e só tem direito a um voto. Diversos estudos atestam que fraudes são raras nos pleitos americanos.

O professor Justin Levitt, da Escola de Direito Loyola, só computou 31 casos de fraude entre os anos 2000 e 2014, nos quais foram entregues um total de mais de 1 bilhão de votos. "Continuei procurando, e agora cheguei a uns 45 incidentes plausíveis em mais de 1,5 bilhão de cédulas, portanto a taxa ficou mais ou menos a mesma. É realmente muito, muito raro. É mais frequente americanos serem mortos por relâmpagos."

Observadores eleitorais independentes tampouco encontraram indícios de votos de Marte, do DNC, ou mesmo de eleitores mortos, como afirmou o advogado de Trump, sem apresentar quaisquer provas.

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