Economia de Israel dá sinais de recuperação apesar da guerra
Arthur Sullivan
24 de abril de 2024
Depois da forte contração no último trimestre de 2023, em decorrência dos ataques terroristas de 7 de Outubro e do conflito subsequente, dados recentes mostram melhora no cenário.
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A economia israelense está mostrando sinais de retorno à normalidade, apesar da pressão que a guerra contra o grupo terrorista Hamas exerceu sobre ela.
Apesar de os dados econômicos oficiais dos primeiros três meses de 2024 ainda não terem sido divulgados pelo governo, dados recentes do mercado de trabalho do órgão oficial de estatísticas e de transações com cartões de crédito do Banco Central sugerem que a economia de Israel está se recuperando do choque causado pelos ataques terroristas de 7 de Outubro e da guerra que se seguiu.
A economia israelense sofreu uma grande contração no último trimestre de 2023, após os ataques terroristas: ela encolheu 5,2% em comparação com o trimestre anterior. Grande parte desse cenário se deve à diminuição da força de trabalho resultante da convocação de cerca de 300 mil reservistas para as Forças Armadas.
Entretanto, o economista Benjamin Bental, da Universidade de Haifa, diz que o mercado de trabalho está se recuperando da saída repentina de tantos trabalhadores e proprietários de pequenas empresas.
"O mercado de trabalho está realmente se estabilizando com bastante rapidez", diz. Ele ainda não alcançou o nível anterior à guerra, mas o desemprego formal está 1% menor do que em setembro de 2023, observa.
O retorno contínuo de alguns reservistas elevou a oferta de mão de obra, enquanto os dados positivos dos cartões de crédito sugerem o retorno do otimismo do consumidor após uma grande queda no final de 2023.
No entanto, Bental lembra que certos setores continuam a ser gravemente afetados pela escassez de mão de obra, especialmente a construção civil. Isso se deve, em grande parte, ao fato de o setor depender muito de trabalhadores palestinos vindos da Cisjordânia ocupada por Israel, que agora não podem trabalhar em Israel devido à situação de segurança.
Cerca de 75 mil palestinos costumavam se deslocar diariamente da Cisjordânia para Israel para trabalhar na construção civil. A ausência deles fez com que o trabalho nas obras fosse quase totalmente interrompido: a construção residencial caiu 95% no final de 2023.
O setor se recuperou um pouco depois que Israel trouxe milhares de trabalhadores da Índia, do Sri Lanka e do Uzbequistão, mas o quadro completo só estará claro quando os dados do primeiro trimestre forem divulgados.
Déficit orçamentário
A guerra forçou o governo israelense a um forte aumento de gastos, sobretudo na defesa, mas também na reconstrução associada aos ataques do Hamas e na necessidade de realojar dezenas de milhares de israelenses deslocados no norte e no sul do país.
No mês passado, Israel anunciou um orçamento revisado para 2024 de 584 bilhões de shekels (cerca de R$ 800 bilhões). O orçamento prevê um déficit de 6,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2024, acima do nível anterior à guerra, de 2,25%. Mas Bental diz que já está claro que o novo percentual está subestimado e que um déficit de 8% parece mais realista.
"Isso supondo que não haja uma deterioração ainda maior da situação de segurança", disse ele, referindo-se às atuais tensões com o Irã.
Há uma pressão óbvia sobre as finanças do governo, que planeja emitir dívidas no valor de cerca de 60 bilhões de dólares este ano, além de aumentar impostos, e insiste que isso tudo é possível.
"Os fundamentos econômicos estão aí", afirmou o contador-geral do Ministério das Finanças israelense, Yali Rothenberg, ao jornal britânico Financial Times antes do anúncio do orçamento revisado. Ele citou como exemplos os indicadores do setor de alta tecnologia, dos investimentos em infraestrutura e do consumo privado.
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Aprender com o passado
Antes dos ataques terroristas do Hamas, em 7 de outubro, a economia de Israel estava indo bem. "A inflação estava caindo, e toda a situação monetária estava sob controle", observa Bental. Ele destaca que Israel caminhava para um crescimento de 3,5% antes dos ataques terroristas e que ainda conseguiu um crescimento de 2% em 2023, apesar do choque do último trimestre.
Bental enfatiza que nas ruas de cidades como Tel Aviv ou Haifa há pouca evidência de uma economia de guerra ou qualquer sensação de escassez ou privação. No entanto, ele adverte que a experiência de Israel com o impacto na economia de guerras e crises de segurança anteriores deve orientar o atual governo.
Bental se diz preocupado com os elevados gastos em defesa, por exemplo. Durante a Guerra do Yom Kippur de 1973, Israel também aumentou drasticamente os gastos com defesa, a ponto de chegarem a 30% do PIB, o que é "totalmente insustentável".
Junto com a crise do petróleo e a crise econômica global da época, o conflito de então "levou a um verdadeiro desastre econômico" para Israel, com "uma inflação muito alta e basicamente nenhum crescimento por quase dez anos".
Para Bentai, a Segunda Intifada dos palestinos, que ocorreu entre 2000 e 2005, tem mais semelhanças com o conflito atual por envolver civis. "É possível aprender um pouco sobre os danos causados pela perda de confiança da população civil e a perda da sensação de segurança durante esse episódio específico", diz. "E há estimativas de que, ao longo desses anos, digamos três ou quatro anos, o PIB israelense encolheu cerca de 10% só por causa disso."
Outro exemplo que ele deu foi o conflito de 2006 com o Hisbolá e o Líbano – um conflito que mostrou a rapidez com que a economia pode se recuperar quando os combates cessam.
"Estamos falando de uma situação em que, por basicamente um mês, a região norte de Israel não funcionou", observa. "Mas quando você olha para os dados e procura qualquer vestígio disso, não encontra. Isso é realmente incrível. A economia, findo o conflito, recuperou-se em pouco tempo."
Bental espera que esse seja o caso quando o conflito atual terminar e sugere que os recentes sinais de recuperação indicam que assim deverá ser.
A longa história do processo de paz no Oriente Médio
Por mais de meio século, disputas entre israelenses e palestinos envolvendo terras, refugiados e locais sagrados permanecem sem solução. Veja um breve histórico sobre o conflito.
Foto: PATRICK BAZ/AFP/Getty Images
1967: Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU
A Resolução 242 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, aprovada em 22 de novembro de 1967, sugeria a troca de terras pela paz. Desde então, muitas das tentativas de estabelecer a paz na região referiram-se a ela. A determinação foi escrita de acordo com o Capítulo 6 da Carta da ONU, segundo o qual as resoluções são apenas recomendações e não ordens.
Foto: Getty Images/Keystone
1978: Acordos de Camp David
Em 1973, uma coalizão de Estados árabes liderada pelo Egito e pela Síria lutou contra Israel no Yom Kippur ou Guerra de Outubro. O conflito levou a negociações de paz secretas que renderam dois acordos 12 dias depois. Esta foto de 1979 mostra o então presidente egípcio Anwar Sadat, seu homólogo americano Jimmy Carter e o premiê israelense Menachem Begin após assinarem os acordos em Washington.
Foto: picture-alliance/AP Photo/B. Daugherty
1991: Conferência de Madri
Os EUA e a ex-União Soviética organizaram uma conferência na capital espanhola. As discussões envolveram Israel, Jordânia, Líbano, Síria e os palestinos – mas não da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) –, que se reuniam com negociadores israelenses pela primeira vez. Embora a conferência tenha alcançado pouco, ela criou a estrutura para negociações futuras mais produtivas.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Hollander
1993: Primeiro Acordo de Oslo
Negociações na Noruega entre Israel e a OLP, o primeiro encontro direto entre as duas partes, resultaram no Acordo de Oslo. Assinado nos EUA em setembro de 1993, ele exigia que as tropas israelenses se retirassem da Cisjordânia e da Faixa de Gaza e que uma autoridade palestina autônoma e interina fosse estabelecida por um período de transição de cinco anos. Um segundo acordo foi firmado em 1995.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Sachs
2000: Cúpula de Camp David
Com o objetivo de discutir fronteiras, segurança, assentamentos, refugiados e Jerusalém, o então presidente dos EUA, Bill Clinton, convidou o premiê israelense Ehud Barak e o presidente da OLP Yasser Arafat para a base militar americana em julho de 2000. No entanto, o fracasso em chegar a um consenso em Camp David foi seguido por um novo levante palestino, a Segunda Intifada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/R. Edmonds
2002: Iniciativa de Paz Árabe
Após Camp David, seguiram-se encontros em Washington e depois no Cairo e Taba, no Egito – todos sem resultados. Mais tarde, em março de 2002, a Liga Árabe propôs a Iniciativa de Paz Árabe, convocando Israel a se retirar para as fronteiras anteriores a 1967 para que um Estado palestino fosse estabelecido na Cisjordânia e em Gaza. Em troca, os países árabes concordariam em reconhecer Israel.
Foto: Getty Images/C. Kealy
2003: Mapa da Paz
Com o objetivo de desenvolver um roteiro para a paz, EUA, UE, Rússia e ONU trabalharam juntos como o Quarteto do Oriente Médio. O então primeiro-ministro palestino Mahmoud Abbas aceitou o texto, mas seu homólogo israelense Ariel Sharon teve mais reservas. O cronograma previa um acordo final sobre uma solução de dois estados a ser alcançada em 2005. Infelizmente, ele nunca foi implementado.
Foto: Getty Iamges/AFP/J. Aruri
2007: Conferência de Annapolis
Em 2007, o então presidente dos EUA George W. Bush organizou uma conferência em Annapolis, Maryland, para relançar o processo de paz. O premiê israelense Ehud Olmert e o presidente da ANP Mahmoud Abbas participaram de conversas com autoridades do Quarteto e de outros Estados árabes. Ficou acordado que novas negociações seriam realizadas para se chegar a um acordo de paz até o final de 2008.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Thew
2010: Washington
Em 2010, o enviado dos EUA para o Oriente Médio, George Mitchell, convenceu o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, a implementar uma moratória de 10 meses para assentamentos em territórios disputados. Mais tarde, Netanyahu e Abbas concordaram em relançar as negociações diretas para resolver todas as questões. Iniciadas em setembro de 2010, as negociações chegaram a um impasse dentro de semanas.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Milner
Ciclo de violência e cessar-fogo
Uma nova rodada de violência estourou dentro e ao redor de Gaza no final de 2012. Um cessar-fogo foi alcançado entre Israel e os que dominavam a Faixa de Gaza, mas quebrado em junho de 2014, quando o sequestro e assassinato de três adolescentes em mais violência. O conflito terminou com um novo cessar-fogo em 26 de agosto de 2014.
Foto: picture-alliance/dpa
2017: Conferência de Paris
A fim de discutir o conflito entre israelenses e palestinos, enviados de mais de 70 países se reuniram em Paris. Netanyahu, porém, viu as negociações como uma armadilha contra seu país. Tampouco representantes israelenses ou palestinos compareceram à cúpula. "Uma solução de dois Estados é a única possível", disse o ministro francês das Relações Exteriores Jean-Marc Ayrault, na abertura do evento.
Foto: Reuters/T. Samson
2017: Deterioração das relações
Apesar de começar otimista, o ano de 2017 trouxe ainda mais estagnação no processo de paz. No verão do hemisfério norte, um ataque contra a polícia israelense no Monte do Templo, um local sagrado para judeus e muçulmanos, gerou confrontos mortais. Em seguida, o plano do então presidente dos EUA, Donald Trump, de transferir a embaixada americana para Jerusalém minou ainda mais os esforços de paz.
Foto: Reuters/A. Awad
2020: Tiro de Trump sai pela culatra
Trump apresentou um plano de paz que paralisava a construção de assentamentos israelenses, mas mantinha o controle de Israel sobre a maioria do que já havia construído ilegalmente. O plano dobrava o território controlado pelos palestinos, mas exigia a aceitação dos assentamentos construídos anteriormente na Cisjordânia como território israelense. Os palestinos rejeitaram a proposta.
Foto: Reuters/M. Salem
2021: Conflito eclode novamente
Planos de despejar quatro famílias palestinas e dar suas casas em Jerusalém Oriental a colonos judeus levaram a uma escalada da violência em maio de 2021. O Hamas disparou foguetes contra Israel, enquanto ataques aéreos militares israelenses destruíram prédios na Faixa de Gaza. A comunidade internacional pediu o fim da violência e que ambos os lados voltem à mesa de negociações.
Foto: Mahmud Hams/AFP
2023: Terrorismo do Hamas e retaliações de Israel
No início da manhã de 7 de outubro, terroristas do grupo radical islâmico Hamas romperam barreiras em alguns pontos da Faixa de Gaza, na fronteira com Israel, e, em território israelense, feriram e mataram centenas de pessoas, além de sequestrarem mais de uma centena. Devido a isso, Israel declarou "estado de guerra" e iniciou uma série de bombardeios, deixando partes da Cidade de Gaza em ruínas.