Polícia Federal indicia empresário e ex-governador do Rio por suspeita de lavagem de dinheiro, corrupção e organização criminosa em desdobramento da Lava Jato. Ambos estariam envolvidos em esquema milionário de propinas.
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A Polícia Federal (PF) indiciou nesta quarta-feira (08/02) o empresário Eike Batista, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral e outras dez pessoas como parte da Operação Eficiência, desdobramento da Lava Jato no estado.
A PF afirmou em nota que os indiciamentos foram feitos por suspeita de "lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, além de organização criminosa". O relatório de conclusão do inquérito foi enviado à Justiça Federal.
Também foram indiciados Maurício Cabral, irmão do ex-governador, e Susana Neves, ex-mulher do político. Os dois são os únicos dos 12 indiciados que não estão presos.
Na Operação Eficiência, a Polícia Federal investiga crimes de lavagem de dinheiro consistentes na ocultação no exterior de aproximadamente 100 milhões de dólares. Boa parte dos valores já foi repatriada.
Troca de favores
Suspeito de lavagem de dinheiro, Eike foi preso preventivamenteno último dia 30 de janeiro, ao desembarcar no Rio num voo proveniente de Nova York. Ele havia entrado na lista de procurados pela Interpol após agentes da PF fazerem uma busca em sua casa e não o encontrarem.
De acordo com dois doleiros que fizeram acordos de delação, Eike teria pagado 16,5 milhões de dólares a Cabral em troca de benefícios em obras e negócios do grupo EBX, do qual é proprietário.
O empresário foi levado nesta quarta-feira da penitenciária Bandeira Stampa (Bangu 9) à sede da Polícia Federal para prestar depoimento. Assim como no primeiro depoimento prestado, Eike foi orientado por seu advogado a permanecer em silêncio.
Cabral, suspeito de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa, foi preso em novembro do ano passado na Operação Calicute, outro desdobramento da Lava Jato no Rio. O peemedebista é suspeito de envolvimento no desvio de recursos públicos federais em obras realizadas pelo governo estadual. O prejuízo é estimado em mais de 220 milhões de reais.
Em dezembro passado, o ex-governador e a esposa se tornaram réus no âmbito da Lava Jato por envolvimento no pagamento de propinas a partir do contrato celebrado entre a Petrobras e consórcio formado pelas empresas Andrade Gutierres, Queiroz Galvão e Odebrecht. Cabral é acusado de chefiar a quadrilha que cobrava propinas para garantir vantagens aos empresários.
O ex-governador já teve três pedidos de prisão preventiva contra ele cumpridos. Ele está preso no Complexo de Gericinó, juntamente com outros detidos nas operações Calicute e Eficiência.
Entre as pessoas detidas nas duas operações estão o ex-secretário de obras Hudson Braga, o empresário e ex-vice-presidente do Flamengo Flávio Godinho e o publicitário Francisco de Assis Neto – detido na semana passada.
LPF/abr/ots
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
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As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
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Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.