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Eleições 2022: anormais, mas não instáveis

Retrato de Magna Inácio, cientista política e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Magna Inácio
28 de outubro de 2022

Para líderes incidentais, forjar um ambiente eleitoral instável é a rota possível para se manter no poder. Até agora, parecem fadadas ao fracasso as tentativas de Bolsonaro. Mas isso não faz de 2022 uma eleição normal.

"Presidentes incidentais antecipam os riscos que as urnas representam para sua sobrevivência política. Sabem que chegaram ao poder graças a circunstâncias excepcionais, com reduzidas chances de repetir tal feito sob o que pode ser considerado um pleito normal"Foto: Mateus Bonomi/AA/picture alliance

Como o presidente Jair Bolsonaro reagirá diante de riscos reais de derrota eleitoral? Essa dúvida cresceu quando se tornou claro que seu mandato não seria encurtado pelos inúmeros pedidos de impeachment e que a sua saída ou permanência dependeria de votos.

Presidentes incidentais antecipam, racionalmente, os riscos que as urnas representam para sua sobrevivência política. Sabem, como ensina Sérgio Abranches, que chegaram ao poder graças a circunstâncias excepcionais, com reduzidas chances de repetir tal feito sob o que pode ser considerado, em cada contexto, eleições normais. Logo, forjar um ambiente eleitoral instável se torna a fórmula de sucesso ou, pelo menos, a rota possível para se manter no poder.

A retórica presidencial, ecoada por seus apoiadores, sobre possíveis fraudes eleitorais e manipulação de votos remonta à própria vitória de Bolsonaro em 2018. A alegada vitória no primeiro turno, a insegurança das urnas eletrônicas e a campanha pelo voto impresso foram marcadores importantes da radicalização dessa retórica voltada para desacreditar e deslegitimar o sistema eleitoral brasileiro e, por tabela, seus resultados.

Também na reta final da campanha

E na reta final da campanha não foi diferente. A última semana antes do segundo turno da eleição presidencial teve início com uma violenta reação de um aliado do presidente contra decisão judicial em inquérito que investiga a sua participação na incitação de crimes contra instituições democráticas. A hipótese de um ato isolado de um extremista caiu por terra com a decisão presidencial de intrometer o Poder Executivo no imbróglio ao mobilizar um ministro de Estado para cumprimento de uma ordem do Poder Judiciário.

Dois dias depois é a vez de assessores presidenciais denunciarem supostas fraudes nas inserções de propaganda gratuita nas rádios em prejuízo de Bolsonaro, candidato à reeleição. O Tribunal Superior Eleitoral, por meio de seu presidente, o ministro Alexandre de Morais, rejeitou o pedido de investigação alegando a fragilidade das denúncias, mas foi além. Aventou possível crime eleitoral da campanha do presidente com intuito de tumultuar o segundo turno do pleito. A reação midiática do presidente, que convocou emergencialmente seu gabinete e tentou mobilizar os chefes militares para uma resposta ao Judiciário, não sobreviveu ao voo de Minas para Brasília.

Entre atos e desfechos, o que esses movimentos sinalizam? Os limites das tentativas de tornar a retórica radical contra as urnas em um ataque institucional. Enquanto estratégia de mobilização política, essa retórica encheu praças, rendeu fotos e aumentou o potencial de chantagem do presidente frente aos demais Poderes. Alimentou uma polarização tóxica que impulsionou desde o assédio eleitoral – voto de cabresto repaginado –  até assassinatos politicamente motivados.

A confiança do brasileiro nas eleições

Entretanto, apesar dos arranhões na democracia, a retórica das fraudes eleitorais esbarra na resistência dos eleitores, e em partes das elites, a mexer no que ainda se mantém como o pilar mais sólido da democracia brasileira: as eleições.

No relatório "Pulse of Democracy" de 2021, o instituto de pesquisa LAPOP mostrou que, no contexto regional de baixa confiança na democracia e no sistema eleitoral, 33% dos brasileiros disseram confiar nas eleições. Entretanto, uma nova bateria de questões apontou uma relativa blindagem contra os ataques ao processo eleitoral. Para 42%, os votos são sempre contados corretamente e, atrás apenas do Chile e Uruguai, 33% acreditam que o segredo do voto é garantido sempre, sendo os políticos incapazes de descobrir como o eleitor votou.

Essa blindagem, ainda que possa parecer frágil, impediu a volta do voto impresso, freou a reforma eleitoral de 2021 e tem empurrado para o isolamento político os que insistem nas fraudes eleitorais.

Parecem fadadas ao fracasso, até o momento, as tentativas de gerar instabilidades para que 2018 se repita. Mas isso não faz de 2022 uma eleição normal. Faltando dois dias para o pleito presidencial, restam incertezas sobre se a retórica de instabilidade eleitoral se converterá na de desestabilização do governo eleito. Algo que dependerá não apenas do que Bolsonaro e aliados farão na oposição, se derrotados, mas também como Lula, se eleito, irá adensar essa blindagem democrática.

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Planaltices é uma coluna semanal sobre política brasileira. Os textos são escritos por colaboradores do grupo de pesquisa PEX (Executives, presidents and cabinet politics), vinculado ao Centro de Estudos Legislativos (CEL) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordenada pela cientista política e professora da UFMG Magna Inácio, a coluna é publicada simultaneamente pela DW Brasil e repercutida no blog do PEX

O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.

Magna Inácio Cientista política e professora da UFMG e coordenadora da coluna Planaltices.
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Esta coluna é uma parceria da DW Brasil com o PEX, núcleo de estudos sobre presidencialismo institucional da UFMG e capitaneado por Magna Inácio.