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Áustria: de volta ao governo conservador-populista?

28 de setembro de 2019

Depois do escândalo que acabou forçando a dissolução da coalizão ÖVP-FPÖ, liderada por Sebastian Kurz, pesquisas mostram eleitorado austríaco disposto a perdoar os pecados dos antigos governantes e apostar no conhecido.

Político conservador austríaco Sebastian Kurz
Sebastian Kurz (c.): disposto a voltar a ser chefe de governoFoto: Reuters/L. Foeger

Poucos dias antes das eleições antecipadas para o Conselho Nacional da Áustria, neste domingo (29/09), o órgão declarou estado de emergência – não política, mas sim climática. Com essa ação simbólica, todas as siglas – exceto o populista de direita Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ) – pretendiam dar um realce a um pleito antes desinteressante.

A luta contra o aquecimento do planeta está na moda: também Sebastian Kurz, o candidato a chanceler federal do conservador Partido Popular Austríaco (ÖVP), se apoderou do tema. Afinal de contas, o ex-premiê de 33 anos – derrubado em maio por um voto de desconfiança – não pode ficar só falando em como sustar a imigração na república alpina.

Os populistas de direita são os únicos que classificam a limitação das emissões de CO2 uma histeria. Assim como seu modelo, o presidente americano Donald Trump, ou os colegas da Alternativa para a Alemanha (AfD), Norbert Hofer, a nova cara da direita austríaca, considera a mudança climática um trote inflacionado.

Imagens do esquálido vídeo de Ibiza correram mundo. Á dir., então líder do FPÖ, Heinz-Christian StracheFoto: picture-alliance/dpa/Spiegel/Süddeutsche Zeitung

O caso Ibiza

O escândalo que causou a queda do ex-presidente do FPÖ Heinz-Christian Strache só desempenhou um papel secundário nesta campanha eleitoral. Num vídeo rodado secretamente na ilha de Ibiza, ele aparecia oferecendo, a uma suposta fila de oligarca russo, favores políticos em troca de doações ilegais para seu partido.

A revelação pública forçou a dissolução da coalizão de governo conservadora-populista encabeçada por Kurz. Devido à prevaricação descarada de seu vice-chanceler federal Strache, Kurz encerrou a colaboração em maio, demitindo, de quebra, o ministro do Interior Herbert Kickl, do FPÖ.

O partido de extrema direita vingou-se, catapultando o premiê de seu cargo através de um voto de desconfiança, o que tornou necessário novas eleições. Kurz, que se apresenta como vítima, alega nada ter sabido das falcatruas de Strache. O FPÖ, por sua vez se vê como vítima de uma "quadrilha criminosa" que teria divulgado o vídeo ilicitamente. Diversas teorias de conspiração circulam a respeito.

Quase ilesos

Contrariando as expectativas de muitos, contudo, o inglório fim da coalizão pouco prejudicou os parceiros ÖVP e FPÖ. Nas mais recentes pesquisas de intenção de voto, Sebastian Kurz está à frente, com 33% a 35% da preferência, podendo até angariar ainda mais votos do que no último pleito, e consagrando seu Partido Popular, de longe, como a principal força política do país.

Por sua vez, o populista Partido da Liberdade, que ainda não conseguiu se decidir se expulsa ou não a ovelha negra Strache, vai possivelmente se safar com poucas perdas, a julgar pelas enquetes. Apresentando entre 21% e 23% das intenções de voto, ele perde de 5% a 7% de seu eleitorado, mas continua competindo pelo segundo lugar com o Partido Social-Democrata (SPÖ), que circula entre 23% e 25%.

Entre os partidos menores, Os Verdes provavelmente terão motivo para se alegrar, conseguindo desta vez ultrapassar a barreira dos 4%, porcentagem mínima dos votos para voltar ocupar um assento no Conselho Nacional em Viena – como faziam até 2017. Tudo graças à mudança climática global, comentou o líder verde Werner Kogler.

Kurz, antes e depois

Kurz, Kickl, Jörg Haider: "Alguém que fala a nossa língua". A mesma frase nas propagandas do FPÖ e do ÖVP. Coincidência?Foto: picture-alliance/dpa

Os debates televisivos durante a campanha transcorreram relativamente pacíficos. Sebastian Kurz apresentou-se em sua nova imagem de rapaz do interior, lembrando como gostava de acariciar as cabras na casa dos avós, na região rural de Waldviertel, no estado da Baixa Áustria – antes, ele enfatizava ter crescido num bairro operário de Viena.

Ainda assim, o slogan de campanha do ÖVP é "Queremos nosso premiê de volta!": a Áustria quer o conhecido, nada de experimentos.

No cara a cara com Kurz, a candidata dos social-democratas, Pamela Rendi-Wagner, zombou da mudança de imagem de seu oponente. Kurz rebateu que é possível crescer em dois lugares. Em sua campanha, Rendi-Wagner aposta no otimismo, mesmo sabendo que é impossível ela ultrapassar o ex-premiê nas urnas. Seu slogan: "Yes, we Pam!"

O FPÖ mostra em sua propaganda o ideólogo-chefe radical Herbert Kickl, com a afirmativa: "Nós impedimos que Kurz caia para a esquerda". Trata-se de uma oferta aberta para que se repita a coalizão conservadora-ultradireitista. E a oferta é levada ao grotesco num spot de TV.

No clip, vê-se o líder do FPÖ, Norbert Hofer, e um ator representando Sebastian Kurz numa sessão de aconselhamento conjugal. "Vocês querem mesmo jogar tudo para o alto por causa de Ibiza?", pergunta a terapeuta. Conclusão do spot de campanha: os populistas de direita e o ÖVP nasceram um para o outro.

De volta à vida real, enquanto Hofer propõe passar a borracha por cima dos pecadilhos do FPÖ, Kurz se mostra arredio quanto à retomada da cooperação. Segundo fontes próximas, ele está pessoalmente decepcionado e se sente traído.

Em termos de políticas concretas, Kurz não teria grandes problemas em voltar a governar com os ultradireitistas. Sobre a imigração, ambas as legendas estão de acordo: cerceá-la é uma questão de amor à pátria, de identidade austríaca. Ambas chegam a usar exatamente a mesma frase em seus cartazes eleitorais, com Kurz e Kickl, respectivamente: "Alguém que fala a nossa língua".

No entanto, Kurz vê uma proximidade excessiva entre partes do FPÖ e grupos extremistas de direita como o Movimento Identitário – ligações que a liderança populista nega ou minimiza. Outra pedra no sapato do conservador é o radical ministro do Interior demitido por ele. "O senhor se coligaria com o FPÖ, se não houvesse o Herbert Kickl?", perguntou a apresentadora do programa de TV Puls. A resposta foi privada de sentido. Com um amplo sorriso, o político de 33 anos replicou: "Primeiro se vota, depois vamos ver."

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Bernd Riegert Correspondente em Bruxelas, com foco em questões sociais, história e política na União Europeia.
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