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Em 150 anos, SPD evoluiu de movimento operário a partido do Estado social

Richard Fuchs (md)23 de maio de 2013

Uma das agremiações democráticas mais antigas do mundo, o Partido Social-Democrata da Alemanha nasceu das lutas dos trabalhadores no século 19 para se tornar uma das forças dominantes da política do país.

Foto: AdsD der Friedrich-Ebert-Stiftung

Todo partido tem seu mito de fundação. E para aquele que é tido como um dos mais antigos partidos democráticos do mundo, parece justo que este mito tenha origem num passado bem remoto. O nascimento do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) ocorreu numa época em que os trabalhadores, sem direitos garantidos, começaram a se rebelar contra o patriarcado dos empresários.

Ferdinand Lassalle, principal fundador do SPDFoto: AdsD der Friedrich-Ebert-Stiftung

Ferdinand Lassalle foi um personagem fundamental desse movimento. No dia 23 de maio de 1863, Lassalle, filho de um rico comerciante, foi a força motriz na fundação da Allgemeiner Deutscher Arbeiterverein (Associação Geral dos Trabalhadores Alemães), em Leipzig, no estado alemão da Saxônia (leste).

Passados 150 anos, Lassalle é considerado um dos fundadores do movimento social-democrata, que continuou a se desenvolver nos anos seguintes, até a criação, no fim do século 19, do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD). "A mensagem do fundador era que se vocês, trabalhadores, quiserem mudar sua situação, devem obrigar o Estado a torná-los cidadãos com direitos iguais e economicamente amparados", recorda Erhard Eppler, político da velha guarda da legenda e uma das figuras de liderança do partido.

Através das associações de trabalhadores e da jovem social-democracia, diaristas pouco favorecidos obtiveram, pela primeira vez, a oportunidade de se formarem profissional e politicamente. Mais da metade dos cidadãos do país era analfabeta naquela época, em que também não existia sufrágio livre e secreto.

Ex-presidente do partido Franz Müntefering: em defesa da mobilidade social pela educaçãoFoto: picture-alliance/dpa

O ex-secretário-geral do SPD Franz Müntefering se lembra com carinho da história dos dez homens que trabalhavam numa fábrica, como enroladores de cigarros. "Nove faziam o trabalho e um lia um livro que eles tinham comprado juntos. Dessa forma, tinham um pouco de educação política e social."

A promessa de Lassalle de que a mobilidade social é possível através da educação é considerada, ainda hoje, uma reivindicação central do SPD.

Perseguição, radicalização e resistência social-democrata

"Mesmo que esta associação chegue a ter apenas 100 mil trabalhadores alemães, ela já será uma força poderosa que todos terão de levar em consideração a partir desse número", escreveu Lassalle no primeiro programa partidádio da jovem social-democracia.

A adesão maciça à causa social-democrata viria a dar razão a Lassalle. No tempo do Império Alemão – o primeiro Estado nacional alemão, de 1871 a 1918 –, a agremiação se tornou um partido de massas, com até um milhão de membros. Durante eleições, chegava a ganhar um terço dos votos.

Os social-democratas eram politicamente tão bem sucedidos que foram proibidos pelo então chanceler do Império, Otto von Bismarck, com diversas leis "antissocialistas". Durante doze anos, os social-democratas, próximos dos sindicatos, foram condenados ao ostracismo, humilhados e forçados a emigrar. "No final, as leis antissocialistas até ajudaram a social-democracia", ressalta Eppler. "O SPD, conseguiu, assim, ter seus mártires. E logo ficou claro que não podíamos ser oprimidos, porque o número de trabalhadores aumentava muito rapidamente."

Cena de uma batida policial durante as leis antissocialistas de BismarckFoto: AdsD der Friedrich-Ebert-Stiftung

Porém, a perseguição levou à radicalização de parte do partido – cada vez mais socialistas simpatizavam com a ideia do marxismo revolucionário, que previa a derrubada da ordem existente e a criação de um novo sistema político, sem distinções de classes e sem propriedade privada.

No fim da Primeira Guerra Mundial, em novembro de 1918, uma divisão do movimento sindical acabou sendo inevitável: de um lado ficaram as forças reformistas; do outro, os revolucionários.

Quando o último imperador alemão, Guilherme 2°, abdicou, as duas facções social-democratas proclamaram a república concomitantemente, em 9 de novembro de 1918. O membro do SPD Philipp Scheidemann proclamou no Reichstag (Parlamento) uma república democrática moderada, enquanto Karl Liebknecht defendia uma variante socialista-comunista.

Mas, pouco mais tarde, nas décadas de 20 e 30, a social-democracia ficou associada ao fracasso da primeira grande fase da democracia em solo alemão. A República de Weimar (1918-1933), fundada e apoiada pela maioria moderada social-democrata, era politicamente instável e ficou marcada por uma situação econômica calamitosa, dominada por hiperinflação e pelo desemprego em massa. Essa estrutura democrática fragilizada não conseguiu deter a ascensão dos nazistas de Adolf Hitler.

Otto Wels: "Podem nos tirar a vida, não a honra"Foto: AdsD der Friedrich-Ebert-Stiftung

Por outro lado, no dia 23 de março de 1933, todos os 94 deputados do SPD presentes no Reichstag votaram contra a Lei de Concessão de Plenos Poderes, com a qual Hitler aboliu a democracia e instalou uma ditadura. "Eles podem nos tirar a liberdade e a vida. Não a honra", afirmou na ocasião o deputado social-democrata Otto Wels.

Para o ex-presidente nacional do SPD, Hans-Jochen Vogel, esta última e mal sucedida revolta contra o regime nazista ainda continua sendo um dos grandes momentos de glória da democracia alemã, "porque todos os outros partidos votaram a favor [da lei de plenos poderes]".

De partido operário a grande partido

Após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, o SPD se tornou um partido popular de esquerda repleto de crises internas. Enquanto os partidos conservadores governavam a Alemanha, promovendo a recuperação econômica a partir de regras capitalistas, o SPD tentava corrigir a atitude anticapitalista que servia de base para a legenda.

No Programa de Godesberg, de 1959, o partido renegava os ideais marxistas e abraçava a economia de mercado, embora incluindo fortes sistemas de seguridade social. Franz Müntefering, antigo chefe do SPD, vê o documento como uma segunda fundação do seu partido. "Foi a primeira vez que todos os que estavam comprometidos com as ideias da social-democracia foram convidados a participar."

Com o início da grande coalizão de 1966, formada pelo SPD e pelos cristãos-democratas da CDU (partido da hoje chanceler federal Angela Merkel), finalmente começava a década sob influência social-democrata na política alemã do pós-Guerra.

Egon Bahr foi o arquiteto da política de Brandt para o Leste Europeu, que melhorou as relações entre as AlemanhasFoto: picture-alliance/dpa

Enquanto os políticos do SPD das gerações anteriores haviam lutado para conseguir o sufrágio universal, o direito ao voto das mulheres, a jornada de trabalho de oito horas e a legalização dos sindicatos, o chanceler federal social-democrata Willy Brandt, que assumiu o poder em 1969, escolheu como prioridade a política de reconciliação com os países socialistas da Europa Oriental.

Brandt recebeu o Prêmio Nobel da Paz de 1971 por se ajoelhar diante do Memorial aos Heróis do Gueto de Varsóvia, na capital polonesa, um gesto com que ele, simbolicamente, pedia desculpas, como chanceler federal alemão, pelos crimes da ditadura nazista em relação ao povo polonês.

Egon Bahr, arquiteto da política para o Leste Europeu de Brandt, considera aquele, até hoje, um momento emocionante. "Foi o instinto de um momento que o levou a praticar um gesto como aquele, realizado por alguém pessoalmente sem culpa, mas que pedia perdão pela culpa de seu povo."

Willy Brandt cai de joelhos em Varsóvia: gesto histórico, premiado com um Nobel da PazFoto: ddp images/AP Photo

Crise existencial e recomeço

O SPD não influenciou muito os anos antes e depois da reunificação da Alemanha, após a queda do Muro de Berlim, em 1989. O democrata-cristão Helmut Kohl se tornou o "chanceler da unificação", fazendo com que partidos conservadores permanecessem no governo por muitos anos.

Os social-democratas, enquanto isso, permaneceram nos bancos da oposição do Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão) até 1998. A coragem para renovação veio com a mudança de governo, sob o chanceler social-democrata Gerhard Schröder. Ele fez o SPD se tornar o partido do "novo centro", passível de ganhar votos tanto de funcionários públicos e profissionais liberais tanto de pessoas da classe operária.

A elevada taxa de desemprego e a recessão econômica fizeram com que os social-democratas implementassem uma reestruturação radical do mercado de trabalho e uma reforma do sistema de bem-estar social, através do projeto Agenda 2010.

Com isso, eleitores tradicionais do partido, como trabalhadores da indústria e assalariados de baixa renda, se afastaram do SPD que, por isso, caiu numa crise de identidade de anos, especialmente após o fim da gestão de Schröder, em 2005.

Veterano social-democrata Erhard Eppler: mercados financeiros devem se submeter à democraciaFoto: picture-alliance/dpa

Para o veterano Erhard Eppler, entretanto, a missão do SPD continua mais atual do que nunca, em tempos em que, segundo ele, é importante impedir que a democracia seja dominada pelas regras do mercado. "Não teremos mais democracia se os mercados começarem a decidir os acontecimentos."

A missão dos social-democratas é, de acordo com Eppler, fazer com que os mercados se adaptem à democracia também no século 21. "Esta é uma tarefa que não é menor do que aquela que estava para ser realizada no início da social-democracia."

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