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Em ano de Copa, o Brasil vende de tudo

Fernando Scheller29 de março de 2006

Cores da bandeira do Brasil e estereótipos presentes nas campanhas publicitárias na Alemanha são usados para aumentar as vendas.

Cartaz da Deutsche Bahn mostra torcedores brasileiros na estação de trem de Colônia

Samba, futebol e carnaval – a tríade da imagem brasileira no exterior – ganha mais evidência em 2006. Na Alemanha, empresas de diversos setores usam o verde e o amarelo para reproduzir estereótipos sobre o Brasil – e, claro, ganhar dinheiro com isso.

Grande exportador agrícola, referência mundial em biocombustíveis, membro ativo nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) – essas são notícias freqüentes sobre a economia e a política externa brasileiras. Mas o Brasil que o europeu quer ver é bem outro: é aquele da alegria, do samba, do futebol e das mulheres seminuas. Pelo menos é o que fica evidente nas peças de publicidade veiculadas na Alemanha e na Europa às vésperas da Copa do Mundo.

São fãs simpáticos, vestidos em berrantes tons de verde e amarelo, que fazem festa em campanhas publicitárias e ajudam a reproduzir a imagem do Brasil no exterior. Atualmente, há outdoors, anúncios de revista e comerciais de tevê que usam o favoritismo do Brasil na Copa do Mundo para vender uma série de produtos, como passagens de trem, serviços bancários e espuma de barbear – tudo na esteira do mundial de futebol, que começa em junho.

Ferramenta de venda

As mais tradicionais empresas da Alemanha estão usando o Brasil e suas características – ou estereótipos – como ferramenta de venda. A Deutsche Bahn, empresa de logística que praticamente detém o monopólio do transporte de passageiros no país, colocou um grupo de atores brasileiros – a maioria mulheres vestindo pouca roupa – para festejar a Copa do Mundo na estação de trem de Colônia. O anúncio tem sido usado para incentivar clientes de todas as nações a aproveitarem os descontos da Deutsche Bahn para o período da Copa do Mundo.

Segundo a Deutsche Bahn, a escolha do Brasil para a propaganda foi natural: "Os brasileiros são identificados por sua simpatia e também por serem uma grande nação de futebol". A Deutsche Bahn divulgou que 1,5 mil brasileiros reservaram passagens com os trens da empresa durante o mundial. "Os brasileiros foram os primeiros a se preparar para a Copa, apesar de não termos feito nenhuma promoção especial com as agências de viagem do país", ressaltou a empresa.

Outras companhias brincam com o franco favoritismo da seleção canarinho no mundial. O PostBank, instituição financeira que é ligada ao Deutsche Post, o serviço de correios do país, encena provocações entre torcedores alemães e brasileiros num bar em que todos bebem cerveja. Já a gigante Gillette usa o favoritismo do Brasil para vender espuma de barbear. No comercial que atualmente está no ar na Alemanha, um ator aparece com uma parte da barba reproduzindo uma bandeira brasileira, pintada em verde e amarelo. Tomara que não vire moda.

Copa do mundo reforça estereótiposFoto: picture-alliance / ZB

E há outros exemplos, como a de um site de apostas que mostra uma torcedora brasileira com expressão irritada, sob a frase "Alemanha é campeã mundial". Ou seja: se normalmente praia, samba e mulheres bonitas já são usadas pela publicidade de produtos relacionados ao Brasil, durante a Copa do Mundo esses elementos podem ser usados para vender quase tudo.

De uma hora para outra?

Aos brasileiros restam então duas escolhas – abraçar as características ou tentar transformá-las. A segunda opção, ainda mais em ano de Copa do Mundo, é a escolha mais complicada. O professor Jörg Dürschmidt, especialista em aspectos culturais da globalização da Universidade de Kassel, disse que, especialmente em épocas de grandes eventos, a mídia está muito mais interessada no que "vende bem".

"Globalização não significa necessariamente uma visão mais complexa do mundo e das culturas. E o Brasil, para o bem ou para o mal, é identificado por seu bom futebol, carnaval, belas mulheres e praias paradisíacas. A Copa do Mundo vem para reforçar esses esterótipos, especialmente se o Brasil ganhar o mundial. Ninguém está interessado em como as pessoas 'realmente' vivem no Brasil", explica Dürschmidt.

Segundo o professor, a reprodução de certos estereótipos sobre países em desenvolvimento – mesmo aqueles com economias de escala, como Brasil, Índia e China – é uma forma que os europeus encontram de se defender da própria decadência. "A Europa está no meio de uma crise econômica e cultural e neste momento tenta encontrar sua posição na cultura e na economia mundial, sobre as quais o continente não tem mais domínio", ressaltou.

Dürschmidt afirma que as próprias categorias impostas pelo processo de globalização – países em desenvolvimento e países desenvolvidos, por exemplo – são uma forma de simplificar problemas culturais e econômicos enfrentados tanto pelo Brasil quanto pela Europa, ainda que em diferentes escalas. "Nós todos sabemos que Londres tem o seu terceiro mundo assim como o Rio de Janeiro tem o seu primeiro mundo."

"Nós fazemos diferente"

O governo brasileiro está aproveitando a Copa do Mundo para lançar uma grande campanha institucional sobre produtos fabricados no Brasil – com presença constante em feiras setoriais e na mídia, por meio de outdoors que serão espalhados nas cidades-sede da competição a partir de maio. A idéia é reverter a grande exposição do país durante o mundial em negócios, usando o verde e o amarelo para mostrar que a criatividade nacional não está limitada ao futebol e ao carnaval.

Nova campanha brasileira: nós fazemos diferenteFoto: Nürnberg Messe

A campanha, apelidada de "We Do It Different" ("Nós Fazemos Diferente"), está sendo realizada pela Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), em parceria com empresários de diversos setores, e receberá investimentos de US$ 10 milhões. O objetivo é mostrar ao mundo a variedade da produção industrial brasileira, da cachaça artesanal a softwares, de sapatos a autopeças.

Serão realizados 30 eventos setoriais até junho; a Apex espera realizar negócios de cerca de US$ 400 milhões até o fim do ano com a iniciativa – o que pode ajudar a reduzir a vantagem alemã na relação comercial com o Brasil. Segundo a agência, no ano passado, entre janeiro e novembro, o país exportou US$ 4,2 bilhões para a Alemanha, tendo importado US$ 5,2 bilhões no mesmo período.

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