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Em meio a sigilo e protestos, Bradley Manning começa a ser julgado nos EUA

Monika Dittrich (md)3 de junho de 2013

Há três anos detido, soldado acusado de repassar centenas de milhares de arquivos secretos ao Wikileaks enfrenta 22 acusações, que podem lhe render prisão perpétua. Processo em tribunal militar deve durar três meses.

Foto: Getty Images

Desde que foi preso, em maio de 2010, Bradley Manning é uma figura polarizadora entre os americanos. Responsável pelo maior vazamento de documentos secretos da História dos Estados Unidos, a principal fonte dos WikiLeaks é para alguns um herói – e para outros um traidor. Nesta segunda-feira (03/06), ele começa a ser julgado, num processo militar cercado de polêmica, sigilo e protestos.

Manning enfrenta 22 acusações, entre elas a de "ajudar o inimigo", que pode levá-lo à prisão perpétua. Ele pretende se declarar culpado de dez, o suficiente para lhe custar até 20 anos atrás das grades. Entre o material que divulgou estão vídeos de ataques aéreos com vítimas civis, correspondências diplomáticas com conteúdo sigiloso e reportes militares das guerras do Iraque e do Afeganistão;

"Ele é um herói", diz Heather Linebaugh, de 24 anos, uma das centenas de manifestantes que foram na tarde de sábado para a frente do quartel de Fort Meade, ao norte de Washington, para mostrar apoio a Manning. "Se ele não tivesse publicado os documentos, as pessoas não teriam visto o que realmente acontece na guerra."

Logo após sua detenção, no Iraque, Manning foi levado para a prisão militar de Quantico, Virginia, onde permaneceu na maior parte do tempo sendo monitorado pelos guardas a cada cinco minutos. Pelo temor de que se matasse, foi forçado a dormir com o rosto voltado para uma lâmpada de forte luminosidade e foi impedido de se apoiar na parede durante o dia. Teve ainda suas roupas e óculos confiscados, ao se irritar com os carcereiros.

Manifestantes frente aos portões de Fort MeadeFoto: Reuters

Após críticas internacionais às condições da detenção, Manning foi transferido em 2011 para a prisão militar de Fort Leavenworth, no Texas. Em março de 2012, após uma investigação de 14 meses, o relator especial da ONU sobre tortura, Juan Mendez, acusou formalmente o governo dos EUA pelo tratamento "cruel, desumano e degradante" dado a Manning. Quase um milhão de pessoas assinaram uma petição para acabar com o isolamento do soldado.

Heather Linebaugh tinha o mesmo trabalho que Bradley Manning. Ela conta que, entre 2009 e 2012, avaliava, como analista de informações, os vídeos e outros registros de aviões militares não tripulados. Ela deixou seu cargo na Força Aérea em março de 2012 e agora estuda ciência política.

"Qualquer pessoa que tenha feito esse trabalho com os drones, viu assassinatos de ambos os lados", conta. "Viu comboios explodirem, viu como perdemos nossa própria gente."

Entre herói e vilão

Heather Linebaugh afirma que, através da divulgação do vídeo publicado por Manning, ficou claro como é a realidade da guerra no Iraque, com vítimas inocentes e civis.

"Ele arriscou muito por nós", diz por sua vez Nathan Fuller, porta-voz da rede de apoio a Bradley Manning, que organizou a manifestação em Fort Meade. "Ele arriscou sua vida e sua liberdade para nos informar sobre o que o governo está fazendo em segredo. Por isso, merece nosso apoio e precisamos defendê-lo."

Há três anos, Bradley Manning aguarda o início de seu julgamento. Se for condenado, terá descontados, por isso, 112 dias – muito pouco, na opinião dos manifestantes em Washington.

Para Daniel Ellsberg, de 82 anos, o duro tratamento dado a Manning pelos militares já é motivo suficiente para encerrar o processo. No começo dos anos 70, ele divulgou os chamados "Papéis do Pentágono", documentos secretos do governo dos EUA que provavam que as autoridades já sabiam desde o início que a Guerra do Vietnã não poderia ser vencida e causaria muito mais vítimas do que admitiam publicamente.

Ellsberg também foi indiciado, mas, na condição de civil, não estava sujeito à jurisdição militar. O julgamento foi encerrado depois que o consultório de seu médico foi arrombado a mando do governo.

"Eu me identifico muito com Bradley Manning", diz, durante a manifestação. "Não é um crime se mostrar a realidade. Não há prova alguma de que as tropas americanas ou qualquer outra pessoa tenham sido prejudicadas através da publicação. Isso só causou um embaraço muito grande para o governo."

O assistente social Peter Swords, integrante do Syracuse Peace Council, que também veio de ônibus ao Fort Meade, junto com os outros ativistas, concorda com Ellsberg.

Faixa pede liberdade para Manning: ativistas reclamam que mídia noticia pouco sobre casoFoto: DW/C. Bergmann

"Comparado com os crimes de guerra e o desrespeito às leis internacionais por parte do governo Bush, os quais continuam até agora impunes, Bradley nos fez um grande favor", diz Swords, que, como outros manifestantes, protestou durante anos contra as guerras no Iraque e no Afeganistão.

Secretismo

Os manifestantes se perguntam o quanto conseguirão saber a respeito do processo, já que a cobertura é difícil. O tribunal não permite gravações de áudio ou vídeo, telefones celulares são proibidos.

Nathan Fuller, de 24 anos, comparece, por isso, há um ano, uma vez por mês a Fort Meade, para participar das audiências, tomar notas e publicá-las.

"Os militares não fornecem anotações, decisões ou propostas ao público e à imprensa. Por isso, temos de fazer nossas próprias anotações", relata. Muitos manifestantes também reclamam que a mídia americana noticia muito pouco sobre Bradley Manning.

Para Fuller, o apoio a Manning é um trabalho de tempo integral, que ainda o manterá ocupado por um tempo, porque o processo está programado para durar 12 semanas. Nesta segunda-feira, eles fazem uma vigília.

"Esperamos que o interesse continue por todo o verão [Hemisfério Norte], a vigília e o apoio, já que o processo está previsto para durar até meados de agosto." Por isso, mais manifestações estão previstas para junho e julho.

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