Em meio a violência, militares convocam eleições no Sudão
4 de junho de 2019
Após violenta repressão a protestos, que deixou dezenas de mortos e gerou condenações internacionais, junta militar cancela acordo de transição e antecipa votação, mas oposição rejeita a medida.
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Um dia após uma violenta repressão a um protesto que resultou na morte de ao menos 35 pessoas, o Conselho Militar do Sudão convocou nesta terça-feira (04/06) eleições gerais no país, que deverão ocorrer dentro de um período de nove meses.
A medida anunciada pelo Conselho Militar Transitório, que assumiu o poder no país após a deposição do ex-ditador Omar al-Bashir em abril, havia feito um acordo com os manifestantes que estabelecia um período de transição de três anos, após o qual o poder seria entregue a um governo civil.
Mas, após os atos de violência desta segunda-feira, o líder do Exército, Abdel Fattah al-Burhan, comunicou em pronunciamento transmitido pelas emissoras locais o cancelamento do acordo e disse que as eleições deverão ocorrer em breve, sob "supervisão regional e internacional".
"O Conselho Militar decidiu pelo seguinte: cancelar o que havia sido acordado, encerrar as negociações com a Aliança por Liberdade e Mudança [grupo que organiza os protestos] e convocar eleições para dentro de um período não superior a nove meses", disse o general.
A oposição sudanesa rejeitou a medida. O líder Madani Abbas Madani, uma das principais figuras da aliança opositora, disse que a campanha de desobediência civil continuará até que o Conselho Militar Transitório seja removido do poder.
"O que ocorreu, a matança de manifestantes, os ferimentos e as humilhações, foi uma forma sistemática e planejada de impor a repressão ao povo sudanês", afirmou.
O clima permanece tenso em Cartum. Membros do grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido – ao qual muitos atribuem o massacre desta segunda-feira – são vistos em grande número e nas ruas da capital sudanesa. Veículos com homens armados foram posicionados na entrada das pontes sobre o rio Nilo, e comboios militares circulam pela cidade.
Muitas ruas estavam desertas, com mercados e lojas fechadas, e poucos veículos circulavam duramente a manhã. Moradores reclamam que não conseguem acesso à rede de internet desde o dia anterior. Com o fechamento do aeroporto de Cartum, muitos voos foram cancelados.
Os líderes dos protestos afirmam que a praça em frente à sede do Exército, onde muitos manifestantes estavam acampados desde o dia 6 de abril, foi esvaziada.
"As Forças de Apoio Rápido, o Exército, a polícia e batalhões de milicianos dispersaram o protesto pacífico", afirmou a Aliança por Liberdade e Mudança. "Não há ninguém lá, além dos corpos dos mártires, que não pudemos remover do local", diz o grupo.
O Comitê Central dos Médicos Sudaneses afirma que o número de mortes é superior a 35, com centenas de feridos, e que os militares perseguiram manifestantes e abriram fogo dentro de um hospital.
Segundo relatos, milhares de manifestantes ainda desafiam as forças militares, com algumas barricadas erguidas nos subúrbios da capital. Nazim Sirraj, da Associação dos Profissionais Sudaneses, um dos grupos que lidera os protestos, disse que milhares de pessoas comemoraram nesta terça-feira o Eid al-Fitr, que marca o fim do Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos.
Os militares haviam declarado que o Eid al-Fitr seria observado somente nesta quarta-feira, o que, segundo a Associação, seria uma tentativa de manter as pessoas em casa após o massacre. Nas comemorações do Eid, tradicionalmente, um grande número de pessoas sai às ruas para as preces matinais.
A violenta repressão aos protestos gerou condenações em todo o mundo. Os Estados Unidos disseram se tratar de um ato de violência brutal contra os manifestantes, e pediram que os generais entreguem o poder aos civis.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, condenou o uso excessivo da força e pediu uma investigação independente sobre o ocorrido. A pedido da Alemanha e do Reino Unido, o Conselho de Segurança da ONU se reunirá a portas fechadas nesta terça-feira para discutir a situação no país.
Países africanos e ocidentais expressaram apoio aos manifestantes, mas alguns governos árabes, liderados pela Arábia Saudita, apoiaram o Conselho Militar Transitório, sob a liderança de Burhan.
RC/afp/ap/rtr
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Foto: Reuters/V. Jones
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Foto: picture-alliance/dpa/K. Nietfeld
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