Réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, deputado obtém vitória importante na Câmara, enquanto presidente lança últimas cartadas para reunir votos e tentar salvar seu mandato.
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Adversários, a presidente Dilma Rousseff e o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) chegam à reta final do processo de impeachment na Câmara em situações bem diferentes nas suas batalhas para preservar os mandatos.
Enquanto a petista, sob a acusação de crime de responsabilidade, enfrenta dificuldades em obter apoio e barrar o impeachment, o presidente da Casa assegurou ao longo da semana uma vitória no Conselho de Ética que pode enterrar o seu processo de cassação, que caminha a passos lentos desde outubro do ano passado.
Na última quarta-feira (13/04), o deputado Fausto Pinato (PP-SP), que serviu como o primeiro relator do processo contra Cunha, deixou a comissão após trocar de partido. Pinato, que contou em dezembro ter recebido ameaças de morte, era um dos 11 membros do conselho que votou no início de março pela cassação de Cunha.
Outros dez deputados votaram pela extinção do processo que apura a acusação de que o peemedebista mentiu sobre o fato de possuir contas secretas na Suíça Para o lugar de Pinato, o PRB indicou a deputada baiana Tia Eron, que logo ao assumir a nova posição declarou que Cunha tem sua “admiração” e “respeito".
O passo a passo do impeachment
03:07
O temor dos adversários de Cunha é que, com a entrada de Eron, o placar da comissão seja revertido. Isso porque um dos votos contra o deputado carioca é do presidente da comissão, José Carlos Araújo (PR-BA), que só pode votar em caso de empate. No caso, Araújo votou pela continuação do processo quando o placar estava dez a dez. De qualquer forma, o resultado deve demorar. Um novo parecer final só deve ser apresentando em meados de maio e votado no mês seguinte – isso se novas manobras não atrasarem ainda mais o processo.
Novas acusações
A mais nova vitória de Cunha também ocorreu na mesma semana em que foram reveladas novas acusações contra ele. Na sexta-feira (15/4), o empresário Ricardo Pernambuco Júnior, da Carioca Engenharia, entregou aos investigadores da operação Lava Jato uma espécie de “carnê da propina”, que aponta uma série de pagamentos para o deputado entre 2011 e 2014, que chegariam a 4,6 milhões de dólares.
Segundo o delator, os valores estão relacionados às obras do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro. No total, de acordo com Pernambuco Jr., Cunha exigiu 52 milhões de reais em propinas de diferentes empresas que atuam na obra.
Anteriormente, Cunha já havia sido acusado de receber 5 milhões de reais em propina envolvendo contratos da Petrobras. No momento, o deputado enfrenta três inquéritos, duas denúncias e um pedido de afastamento no Supremo Tribunal Federal (STF).
Também nesta semana, uma pesquisa do Datafolha mostrou que 77% dos brasileiros querem a saída de Cunha – em contraste com outra sondagem do instituto, que aponta que 61% dos brasileiros são favoráveis ao impeachment de Dilma. Em pesquisas realizadas entre manifestantes nos protestos pró e contra a presidente, o percentual passou de 90%.
Manobras políticas
No último ano, não foi raro a imprensa e a classe política do país especularem se Cunha conseguiria chegar ao estágio final do impeachment na Câmara ou se cairia antes da presidente. No final, mesmo com novas acusações, o presidente da Casa não só vai conduzir o dia da votação, como determinou a ordem em que os parlamentares vão votar.
Segundo o cientista político Rodrigo Prando, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Cunha tem se mantido até agora no cargo por mistura de manobras regimentais, vagarosidade da Justiça (um pedido de afastamento no STF foi entregue em dezembro e até hoje não foi analisado) e tolerância da oposição – que precisa do deputado para dar continuidade ao processo contra Dilma.
“Cunha soube fazer tudo o que Dilma não foi capaz de fazer para se salvar. Ele conhece bem o regimento e as regras do jogo, tem muitos aliados e é muito astuto para usar essas coisas a seu favor”, afirma.
Prando, no entanto, aponta que se o processo contra Dilma passar na Câmara e for remetido ao Senado, esse triunfo pessoal para Cunha também deve ser uma espécie de canto do cisne em sua trajetória como presidente da Câmara.
“Se Dilma for derrotada, o foco vai se voltar contra Cunha. Ele já é réu. A posição dele como chefe da Câmara deve ficar insustentável. Ele vai perder a importância para os oposicionistas se o processo for ao Senado. Seus próprios aliados sabem disso. A manutenção dele no cargo pode criar dificuldades para um eventual governo Michel Temer”, afirma Prando.
O professor, no entanto, afirma que com relação ao mandato de deputado de Cunha a situação é uma incógnita. “Ele está muito bem encastelado para preservar seu mandato no Conselho de Ética. Analisando com os dados de hoje na Câmara, é possível sugerir que ele vai pelo menos salvar seu mandato. O problema é que existem fatores externos, como a operação Lava Jato, que pode embaralhar toda essa costura. De qualquer forma, ele demonstrou ter mais força que Dilma nessa reta final”, conclui.
A cronologia do processo de impeachment
Em dezembro de 2015, Eduardo Cunha dava início ao processo de impeachment da então presidente da República. De "carta-desabafo" à cassação de Dilma Rousseff, relembre os episódios que marcaram o julgamento.
Foto: Reuters/J. Marcelino
O aval
Em 2 de dezembro de 2015, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. A decisão foi tomada no mesmo dia em que a bancada do PT anunciou que votaria pela continuidade do processo de cassação de Cunha no Conselho de Ética, acirrando uma crise política já inflamada no Brasil.
Foto: Getty Images/AFP/Evaristo Sa
Motivo: "pedaladas fiscais"
No mesmo dia, em pronunciamento público, Dilma disse ter recebido "com indignação" a notícia. O pedido de impeachment – apresentado em outubro pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal – acusa a presidente de cometer crime de responsabilidade fiscal, com base na reprovação das contas de 2014 pelo Tribunal de Contas da União, incluindo as chamadas "pedaladas fiscais".
Foto: picture-alliance/dpa
O dia seguinte
Dilma foi notificada oficialmente da abertura do processo em 03/12, logo após Cunha (foto) ler a decisão em plenário. O presidente determinou ainda a criação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados para analisar o pedido de impeachment. Na mesma data, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou duas ações – uma do PT e outra do PCdoB – que tentavam barrar o processo de afastamento de Dilma.
Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
A carta de Temer
Em 07/12, o vice-presidente Michel Temer enviou uma "carta-desabafo" a Dilma, em que expressa mágoas por ter sido, desde o primeiro mandato, um mero "vice decorativo". Ele diz ainda ter "ciência da absoluta desconfiança" da presidente. Especialistas interpretaram o texto como um rompimento de Temer com Dilma – lembrando que é ele quem assume a presidência caso ela sofra o impeachment.
Foto: AFP/Getty Images/E. Sa
Próximo passo: a comissão
O trâmite do processo exige a formação de uma comissão especial, com 65 deputados titulares e igual número de suplentes, indicados por líderes partidários, em quantidade proporcional ao tamanho de cada bancada – é obrigatória a participação de todas as legendas da Casa. Essa comissão dará um parecer pela abertura ou não do processo, que depois irá a plenário.
Foto: Luis Macedo /ABr
Tumulto na Casa
Em 08/12, a Câmara dos Deputados se reuniu pela primeira vez para definir a comissão especial, em votação secreta marcada por tumulto e quebra-quebra. Concorriam duas chapas: uma formada por deputados simpáticos ao governo, e outra oposicionista, favorável à saída da presidente. Venceu a chapa da oposição, com 39 membros, e uma votação suplementar seria realizada para escolher os nomes restantes.
Foto: Antonio Augusto /ABr
Processo suspenso
Essa votação, porém, nunca foi realizada. Ainda na noite de 08/12, o STF suspendeu a tramitação do processo, impedindo temporariamente a instalação da comissão especial. O plenário da Corte decidiu julgar um pedido liminar do PCdoB sobre a constitucionalidade da lei que regulamenta as normas de julgamento de impeachment. O partido criticou, por exemplo, o voto secreto na escolha da comissão.
Foto: EVARISTO SA/AFP/Getty Images
Novo rito de impeachment
Quase dez dias depois, em 17/12, o plenário do STF determinou algumas mudanças no rito de impeachment, que em sua maioria favoreceram a presidente. Os ministros decidiram conceder maior poder ao Senado na análise do afastamento; determinaram que não cabe voto secreto, nem formação de uma chapa alternativa para compor a comissão; mas negaram o pedido do PCdoB de afastar Cunha do processo.
Foto: Roberto Stuckert Filho
Recesso parlamentar
Para angústia do governo – que chegou a sugerir o cancelamento da pausa parlamentar de janeiro –, a análise do processo de impeachment entrou em hiato no fim de dezembro e assim permaneceu até 2 de fevereiro, quando os parlamentares voltaram do recesso. Segundo Cunha, a expectativa era de votar a comissão especial e concluir o processo na Câmara até março, para seguir para julgamento no Senado.
Foto: picture-alliance/Lou Avers
STF analisa embargos
O teor do acórdão em que o STF considera inconstitucionais alguns aspectos do processo de eleição da comissão especial da Câmara foi publicado em 08/03. No mesmo dia, a Câmara reapresentou os questionamentos e pediu a revisão do rito de impeachment pelos ministros do Supremo. Em votação realizada em 16/03, porém, a Corte rejeitou os recursos de Cunha e decidiu manter o rito definido em dezembro.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Comissão está formada
A comissão especial, responsável por analisar o pedido de impeachment na Câmara, foi finalmente formada em 17/03, com deputados indicados pelos próprios líderes partidários. O relator da comissão é Jovair Arantes, líder do PTB na Casa e um dos principais aliados de Eduardo Cunha; e o presidente é Rogério Rosso, líder do PSD na Câmara.
Foto: G.Lima/Câmara dos Deputados
Trabalhos da comissão
Em 30/3, os membros da comissão ouviram dois autores do pedido de impeachment: os juristas Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal. No dia seguinte, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, foi ouvido como testemunha de defesa. No dia 4/4, o ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União, entregou a defesa escrita da presidente e fez a sustentação oral.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Comissão instaura processo
Parlamentares da comissão especial do impeachment votaram no dia 11/04 pela abertura do processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, em sessão marcada por troca de insultos. O placar sobre o parecer do relator Jovair Arantes (PTB-GO) foi de 38 votos a favor e 27 contra.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
A votação na Câmara
Com o parecer admitido pela comissão especial, o processo seguiu para votação no plenário da Câmara dos Deputados. No dia 17/04, em sessão tumultuada e acalorada, os parlamentares decidiram pela continuidade do processo de impeachment, com 367 votos a favor e 137 contra – eram necessários 342 votos favoráveis para a aprovação. A questão segue agora para análise no Senado.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Comissão especial de senadores
Dois dias após a apresentação do parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG, foto), favorável ao afastamento de Dilma, a comissão especial do Senado aprovou, em 06/05, a continuidade do processo de impeachment. Dos 21 senadores, 15 votaram pela aprovação, e apenas cinco votaram contra – três do PT, um do PCdoB e outro do PDT. O presidente da comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB), não votou.
Foto: Agência Brasil/F. Rodrigues Pozzebom
Anulação da votação
Em 09/05, o presidente interino da Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA) – que assumiu o comando da Casa após o afastamento de Eduardo Cunha –, anulou a votação do processo de impeachment realizada na Câmara semanas antes. Horas depois, no mesmo dia, Maranhão voltou atrás na decisão, provocando euforia entre os parlamentares governistas. Votação no Senado aconteceria em apenas dois dias.
Foto: Imago/Zumapress
Senado aprova afastamento da presidente
Em 12/05, após uma sessão de mais de 20 horas, o Senado aprovou por clara maioria a continuidade do processo de impeachment de Dilma. Foram 55 votos a favor do impedimento e 22 contrários. Após o aval dos senadores, a presidente fica afastada por 180 dias, enquanto é julgada, e o vice Michel Temer assume a presidência interinamente.
Foto: Getty Images/M.Tama
Relator defende julgamento final
Em seu relatório final sobre o processo de impeachment, apresentado em 02/08, o relator e senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) defendeu que Dilma vá a julgamento final pelo crime de responsabilidade fiscal. Anastasia argumentou que a presidente afastada abriu créditos suplementares sem autorização do Congresso Nacional e praticou as chamadas pedaladas fiscais.
Foto: Reuters/U.Marcelino
Comissão aprova relatório
Em 04/08, a Comissão Especial do Impeachment no Senado aprovou o relatório do senador Anastasia, favorável ao prosseguimento do processo de impeachment contra Dilma. Dos 21 senadores que compõem a comissão, 15 votaram a favor da continuação do processo, e cinco, contra. Com isso, a comissão encerrou os trabalhos. O relatório seguiu para votação por todos os 81 senadores.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Senado decide levar Dilma a julgamento
Em 10/08, os senadores decidiram, por 59 votos contra 21, levar Dilma a julgamento. A maioria dos senadores seguiu o parecer do relator Anastasia, cujo relatório havia sido aprovado pela comissão especial do impeachment. O resultado indica que Dilma terá dificuldade para reverter seu afastamento definitivo na votação final. Para a condenação são necessários 54 votos.
Foto: Reuters/A. Machado
Iniciada fase final do processo
O Senado deu início à fase final do processo de impeachment no dia 25/08, quase nove meses após sua abertura. O primeiro dia de audiência teve mais de 15 horas de duração e foi marcado por bate-boca entre petistas e senadores favoráveis à saída definitiva de Dilma. O julgamento, que começou com os depoimentos de testemunhas, é comandado pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Discurso de defesa de Dilma
Em 29 de agosto, a presidente afastada Dilma Rousseff apresentou sua defesa da acusação de crime de responsabilidade no Senado. Em sua fala, a petista garantiu que sempre seguiu a Constituição, lembrou os tempos da ditadura militar, usou repetidas vezes o termo golpe e reiterou sua luta pela democracia. "Jamais haverá justiça na minha condenação", afirmou.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Dilma é cassada pelo Senado
Na votação final do processo de impeachment, o Senado decidiu, em 31/08, afastar em definitivo Dilma da Presidência da República. Foram 61 votos favoráveis ao impeachment e 20 contrários – eram necessários 54 para a cassação. Todos os 81 senadores participaram da sessão. Em segunda votação, porém, os parlamentares decidiram por manter o direito de Dilma de exercer cargos públicos.