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EsporteGlobal

Entenda a polêmica do possível boicote aos Jogos de Paris

Jörg Strohschein
13 de fevereiro de 2023

Diversos países pedem a exclusão de russos e belarussos das Olimpíadas de 2024, mas o Comitê Olímpico Internacional considera permitir a participação desses atletas sob uma bandeira neutra.

A bandeira do Comitê Olímpico Internacional com as cinco argolas coloridas tremula ao lado da bandeira da Rússia.
Sem bandeira da Rússia: atletas do país só poderiam competir em Paris, no ano que vem, sob cores neutrasFoto: sampics/picture alliance

Políticos e atletas da Ucrânia e de outros países vêm defendendo que russos e belarussos não participem dos Jogos Olímpicos de Paris de 2024, como punição pela guerra de agressão russa na Ucrânia. Mas, neste domingo (12/02), o presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), Thomas Bach, jogou um balde d'água fria nessa pretensão. Ele disse que, apesar de compartilhar "da dor e do sofrimento" dos ucranianos, governos não devem decidir quem participa ou não de eventos esportivos internacionais.

O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, tem repudiado a eventual atuação de atletas russos nas Olimpíadas, mesmo sob bandeira neutra. Em dezembro passado, ele afirmou: "Não se pode tentar ser neutro quando os fundamentos da vida pacífica estão sendo destruídos e os valores humanos universais estão sendo ignorados", e disse que a única resposta possível a Moscou seria "o completo isolamento do Estado terrorista do cenário internacional e isso se aplica, em particular, a eventos esportivos".

Desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, atletas russos e belarussos foram banidos da maioria dos torneios esportivos – com algumas exceções, a exemplo do tênis –, mas o COI tem se mostrado aberto a readmiti-los, argumentando que ninguém deveria ser discriminado com base em sua nacionalidade.

No último final de semana, durante o Campeonato Mundial de Esqui, em Courchevel, na França, Bach afirmou que caso os governos pudessem decidir quem pode participar das competições esportivas, "seria o fim das competições internacionais como os Jogos Olímpicos tal qual conhecemos hoje".

"Um relator do Conselho de Direitos Humanos da ONU nos disse que a exclusão de atletas com base em seu passaporte é uma violação de direitos", disse Bach.

Mais de 200 atletas e treinadores mortos

Na última sexta-feira, um grupo composto por 40 países – entre eles, Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, França e Alemanha – reuniu seus ministros do Esporte e, nos próximos dias, deve emitir um comunicado conjunto a respeito da participação de atletas da Rússia e de Belarus nos Jogos de Paris.

Na ocasião, Zelenski defendeu que o banimento a atletas russos e belarussos não deve ser revogado enquanto a invasão perpetrada por Vladimir Putin continuar.

"Isso não pode ser encoberto por meio de uma suposta neutralidade ou uma bandeira branca. A Rússia é, no momento, um país que mancha tudo de sangue, até mesmo a bandeira branca", afirmou.

Kiev também informou que pelo menos 228 atletas e treinadores ucranianos já morreram desde o início da guerra, e argumentou que a Rússia buscará vantagens políticas ao participar das Olimpíadas.

O presidente do COI, Thomas Bach, reuniu-se com o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, em julho de 2022Foto: SvenSimon/ThePresidentialOfficeUkraine/picture alliance

COI vai estudar propostas

No domingo, Bach reforçou que a missão dos Jogos Olímpicos é "uma missão de paz", e que a história mostraria "quem está fazendo mais pela paz: aqueles que tentam manter as redes abertas e se comunicar, ou aqueles que querem isolar e dividir".

A possibilidade de boicote olímpico por parte da Ucrânia foi criticada pelo COI, defendendo que tal medida afetaria somente os atletas. Bach disse que vai considerar as preocupações de todos os países antes de tomar uma decisão: "Estamos tentando encontrar uma solução que seja justa para a missão do esporte."

O dirigente ainda lembrou que já conversou com diversos atletas ucranianos nos últimos meses, alegando que muitos deles sabem dos esforços para apoiá-los.

O eventual retorno de russos e belarussos dependeria de duas condições: competir sob uma bandeira neutra e não ter "apoiado ativamente a guerra na Ucrânia".

Chefe do COI foi criticado por manter laços com o presidente da Rússia, Vladimir PutinFoto: Tatyana Zenkovich/dpa/picture alliance

Políticos e atletas se manifestam

Um dos países que mais se opõe à participação russa e belarussa nos Jogos Olímpicos de Paris é a Letônia. O seu ministro do Exterior, Edgars Rinkevics, declarou que "autorizar que atletas da Rússia e de Belarus participem da próxima Olimpíada é imoral e errado".

Gunta Vaicule, corredora dos 400 metros rasos e presidente da Comissão de Atletas do Comitê Olímpico da Letônia, disse que "não é ético" cumprimentar atletas russos.

"Depois de 24 de fevereiro [de 2022], não nos sentimos mais tão seguros. Lembramos do que nos aconteceu na época da União Soviética. E tenho que fazer tudo que estiver ao meu alcance para que algo assim não aconteça novamente. Não posso parar a máquina de guerra, mas tenho que influenciá-la de alguma forma", afirmou Vaicule.

Em um comunicado, assinado também por Zorzs Tikmers, presidente do Comitê Olímpico da Letônia, o país não deixou dúvidas sobre sua postura: "A posição do Comitê Olímpico da Letônia permanece inalterada: enquanto houver guerra na Ucrânia, a participação de atletas russos e belarussos nos Jogos Olímpicos, independentemente da bandeira, não é aceitável" – essa opinião é compartilhada pelo ministro da Cultura da Dinamarca, Jakob Engel-Schmidt.

Esporte como propaganda

Atletas e políticos europeus alegam que o esporte também faz parte da máquina de propaganda russa. "Como todas as tiranias, a Rússia usa o esporte para fins políticos. O COI não deve ser cúmplice desses esforços", disse Rinkevics.

A primeira-ministra da Estônia, Kaja Kallas, ameaçou retirar o país dos Jogos de 2024: "A participação de atletas russos e belarussos é simplesmente errada. Portanto, um boicote seria um próximo passo", afirmou.

"Se pudéssemos identificar os atletas neutros, isso poderia ser uma solução. Se fosse possível me apontar um atleta russo que não recebeu dinheiro ou apoio do governo russo desde o início da guerra e condena seus crimes, poderíamos considerar competir com eles. Mas a verdade é que Rússia e Belarus usam seus atletas para construir sua máquina de propaganda que alimenta a guerra na Ucrânia. Eles são armas de seu governo", declarou Vaicule.

O Comitê Olímpico Nacional, o Comitê Paralímpico e as federações esportivas dos países nórdicos escreveram uma carta conjunta no fim de janeiro na qual reforçam ao COI que "a situação em relação à guerra na Ucrânia não mudou". Os líderes das federações de Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega, Suécia, assim como de Alanda, Groenlândia e Ilhas Faroé assinaram a carta.

A prefeita de Paris, Anne Hidalgo, também entrou no debate, declarando à mídia francesa no início do mês que os atletas russos e belarussos deveriam seguir banidos "enquanto a guerra continuar".

A Polônia, que tem fronteiras com Belarus e Ucrânia, também não considera competir com russos e belarussos em Paris.

"Queremos que os Jogos Olímpicos sejam realizados sem russos e belarussos, mas não sem poloneses, ucranianos ou letões. A equipe russa nunca foi e nunca será neutra. Se o COI pensa que desta vez será diferente, é ingênuo", disse Kamil Bortniczuk, ministro do Esporte da Polônia, à estação de rádio polonesa RMF FM, referindo-se a um possível boicote à Olimpíada de 2024.

gb/bl (dpa, AFP)