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Erdogan enfrenta sociedade dividida após referendo

Diego Cupolo lpf
17 de abril de 2017

Ao expandir seus poderes com uma vitória apertada e contestada em consulta popular, presidente turco consolidou seu governo, mas em meio a um país polarizado e que pode permanecer em estado de crise por muitos anos.

Apoiadores do "não" protestam em Istambul
Apoiadores do "não" protestam no dia seguinte ao referendo em IstambulFoto: picture alliance/AP Photo/E. Gurel

Para muitos turcos que votaram no referendo constitucional deste domingo(16/04), a escolha era entre o presidente Recep Tayyip Erdogan e o desconhecido. Após liderar o país por 15 anos, Erdogan se tornou uma peça central para o sucesso econômico da nação, ao mesmo tempo em que minimizou a oposição política.

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No entanto, neste domingo, os eleitores turcos decidiram consolidar os poderes do governo por uma pequena margem de 51,4% contra 48,6% dos votos, de acordo com a agência de notícias estatal Anadolu. Apoiadores de Erdogan celebraram noite adentro, enquanto opositores ficaram em casa diante da televisão, refletindo sobre o futuro de um país que parece estar se afastando de seus ideais seculares e democráticos do passado.

Após o pleito histórico, a questão que os turcos enfrentam agora é como remendar uma sociedade composta de duas metades tão diferentes. Até agora Erdogan fez poucos esforços para unir o país e agravou as divisões por meio de uma retórica de campanha que difamou opositores como simpatizantes do terrorismo.

"Vitória para todos"

Em seu discurso após o referendo, Erdogan disse que a vitória foi para todos os apoiadores do "sim" e do "não". Mas enquanto os resultados podem levar a mais estabilidade política no país, quase não há garantias de coesão social.

Com expurgos ainda em curso na sequência da tentativa de golpe militar fracassada em meados de 2016 e com o governo continuando a demonizar opositores políticos, a Turquia vai permanecer em estado de crise por muitos anos, afirma Soner Cagaptay, do Instituto Washington para Política de Oriente Próximo (Winep). Ele é autor do livro The New Sultan: Erdogan and the Crisis of Modern (O novo sultão: Erdogan e a crise do moderno, em tradução livre), a ser lançado em breve.

Apoiadores de Erdogan comemoram resultado de referendo

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"Ele se tornará presidente de apenas metade do país. A outra metade nunca se submeterá a seu governo, e essa é uma receita para um desastre de longo prazo", disse Cagaptay.

"É um país que está preso num constante estado de crise, então ele não vai estar em condições de crescer e ser um ator regional", prosseguiu. "O país será consumido por tensões políticas infindáveis", além dos conflitos regionais em curso contra o grupo extremista "Estado Islâmico" (EI) e o banido Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK).

Concentração de poderes

Apenas duas das 18 alterações na Constituição votadas entrarão em vigor logo após o referendo. O restante será introduzido após as eleições presidenciais de 2019. Mudanças cruciais na Constituição vão incluir a concentração dos poderes Legislativo, Judiciário e Executivo na presidência.

O cargo de primeiro-ministro será abolido, e o papel do Parlamento, diminuído, tendo o presidente autoridade para tomar decisões judiciais e ministeriais, sem a necessidade de uma aprovação secundária.

O presidente também poderá emitir decretos, como é o caso no atual estado de emergência, e os limites presidenciais serão estendidos para dois mandatos de cinco anos, a não ser que eleições antecipadas sejam convocadas durante o segundo mandato, o que permitiria um terceiro.

Nos próximos meses, Erdogan sinalizou a intenção de realizar um segundo referendo sobre o processo de adesão da Turquia à União Europeia (UE), no qual os eleitores turcos decidiriam se as longas negociações devem ser encerradas.

A relação entre a UE e a Turquia se deteriorou durante a campanha pré-referendo, após ministro do partido governista AKP serem impedidos de realizar comício em várias cidades europeias. Erdogan respondeu aos incidentes acusando autoridades alemãs e holandesas de usar "métodos nazistas".

Legisladores turcos também propuseram reintroduzir a pena de morte, o que elevou as preocupações internacionais, particularmente após as detenções em massa e alegações de tortura como parte da recente repressão pós-golpe. Reintroduzir a pena capital distanciaria ainda mais a Turquia da Europa e poderia acabar com as perspectivas da adesão à UE e abalar as relações comerciais com o bloco.

Alguns analistas também sugeriram a possibilidade de menos conflitos militares na Turquia e em seus arredores, o que, no entanto, permanece aberto à interpretação se considerado o tom do discurso pós-referendo do primeiro-ministro Binali Yildirim.

"Esta nação mais uma vez demonstrou que não vai se curvar a qualquer dominação [militar], intervenção externa ou ameaça", disse. "Nossa luta contra inimigos internos e externos será intensificada."

Esvaziamento do Exército

Apesar de todos os poderes acumulados por Erdogan, o referendo deste domingo revelou aparentes fraquezas no que deveria ser uma base eleitoral conservadora sólida. A liderança do Partido do Movimento Nacionalista (MHP) havia defendido o sistema presidencial de Erdogan, mas os apoiadores da legenda – que compõe cerca de 10% do eleitorado – não compartilharam dessa visão. Com o apoio dos eleitores do MHP, teoricamente o "sim" deveria ter angariado ao menos 60% dos votos.

Erdogan perdeu para o "não" em Istambul – cidade em que se destacou na política turca como prefeito. As outras duas grandes cidades do país, Ancara e Izmir, também votaram contra a reforma constitucional.

Para além das divisões políticas, Cagaptay afirma que o aspecto mais preocupante na Turquia pós-referendo é a força reduzida do Exército. Muitos militares foram expurgados ou presos depois da tentativa de golpe do ano passado, esvaziando o aparato de segurança do país num momento de elevada instabilidade.

"A Turquia sobreviveu a crises passadas porque tinha uma forte instituição de segurança nacional, o Exército, que impediu a implosão do país", disse o pesquisador. "O golpe efetivamente neutralizou, se não destruiu o Exército como uma instituição de segurança nacional que pode vir ao resgate. E é por isso que estou preocupado."

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