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Escândalo da carne se alastra

20 de março de 2017

China, Chile e Coreia do Sul suspendem importações, e federações europeias de agricultores aproveitam o caso para levantar velha bandeira e pedir banimento total da carne brasileira na UE.

Brasilien Fleischskandal
Carne em supermercado brasileiro: autoridades dos EUA dizem que também monitoram crise Foto: picture-alliance/Estadao Conteudo/N. Caardin

Enquanto o governo  tenta conter danos num setor-chave para a economia brasileira, as investigações da Polícia Federal que apuram fraudes, subornos e violações sanitárias no setor pecuário brasileiro ganharam contornos internacionais nesta segunda-feira (20/3).

A China anunciou que vai suspender temporariamente a importação de carnes do Brasil. A Coreia do Sul barrou a importação de produtos do frigorífico BRF e resolveu intensificar a fiscalização sobre a carne de frango importada. O Chile também anunciou uma suspensão temporária na importação de carnes. Autoridades dos EUA informaram que estão "monitorando a situação".

A Comissão Europeia, órgão executivo da UE, por sua vez, disse que vai barrar a compra de carnes de frigoríficos atingidos pela operação Carne Fraca. O caso também vem sendo aproveitado por federações de agricultores europeus que normalmente se mostram hostis às importações pela UE de carne brasileira ou sul-americana.

Duas federações de pecuaristas da Irlanda pediram medidas mais drásticas, como o banimento total da importação de carnes brasileiras. O presidente da Associação Irlandesa de Criadores de Gado e Ovinos (ICSA), Patrick Kent, acusou a UE de ser benevolente demais com o Brasil.

"A UE foi advertida várias e várias vezes sobre os riscos de importar carne da América do Sul. É ultrajante que a UE continue a dar uma segunda chance ao Brasil. O pior de tudo são as tentativas de sacrificar a produção da carne europeia com negociações bilaterais comerciais com países do Mercosul. O impacto disso será o de sabotar totalmente os pecuaristas irlandeses e europeus e inundar a UE com carne barata e inferior do Brasil", afirma.

Joe Healy, que chefia a Associação dos Fazendeiros Irlandeses, disse que seu grupo vem apontando há dez anos que o Brasil não consegue cumprir com eficiência as exigências de monitoramento que são aplicadas ao produtores europeus.

Tema desperta hostilidade de europeus

Pekka Pesonen, o secretário-geral da influente Copa-Gogeca, entidade que representa os agricultores e as cooperativas agrícolas da UE, foi mais comedido. Em entrevista à DW, disse que seu grupo deseja ver as provas de irregularidades antes de fazer qualquer recomendação. Sua organização pediu por enquanto que o Conselho Europeu exija esclarecimentos do governo brasileiro.

"Seria um suicídio para o Brasil se essa questão não for resolvida. Se persistir, podemos eventualmente recomendar uma suspensão", disse. Ainda segundo Pesonen, o caso brasileiro mostra que o Brasil e outros países sul-americanos ainda "não têm os mesmo padrões" da UE.

A medida anunciada pelo Conselho Europeu afeta quatro empresas que estavam autorizadas a exportar para os 28 países da UE, entre elas a JBS, a líder do setor no Brasil. Ao todo, 21 empresas foram alvos da operação da PF. Mais de 2 mil fazendas e 77 frigoríficos brasileiros têm autorização para exportar carne para o bloco europeu.

O tema é bastante sensível no bloco e costuma despertar a hostilidade de agricultores europeus, que temem a competição de carnes brasileiras mais baratas no segmento de cortes nobres, o mais lucrativo do setor. O Brasil e seus parceiros do Mercosul – Argentina, Uruguai e Paraguai – tentam expandir a lista de suas empresas autorizadas a exportar para a UE e alcançar um acordo amplo entre os dois blocos.

Obstáculo ao livre-comércio?

O timing da operação coincidiu com o início de uma nova fase de negociações entre os dois blocos. Nesta segunda-feira, negociadores da UE e do Mercosul se reúnem em Buenos Aires para discutir um acordo de livre-comércio, uma iniciativa que vem se arrastando há mais de 20 anos. Em 2016, após mais de uma década praticamente sem qualquer diálogo, os dois blocos retomaram as conversas.

Mas a retomada foi encarada com descontentamento por organizações como a Copa-Gogeca e outras federações europeias. Em dezembro, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) acusou a Copa-Cogepa de "tentar influenciar negativamente os consumidores europeus" ao "criar uma imagem falsa sobre as condições de produção no Brasil. Em 2016, o Brasil exportou cerca de 2,5 bilhões de dólares de carne, frango e derivados para a UE.

Oficialmente, representantes do bloco afirmam que a operação da PF não deve influenciar as negociações entre o Mercosul e a UE. O porta-voz para assuntos comerciais da Comissão Europeia, Daniel Rosario, disse esperar que não haverá impacto negativo no andamento das negociações.

Ele também afirmou que um eventual acordo vai eventualmente "reforçar as exigentes normas de seguranças alimentar", e "não debilitá-las". O embaixador da UE no Brasil, João Gomes Cravinho, também assegurou que as negociações e a questão das carnes são duas coisas diferentes.

O presidente da CNA, João Martins, disse que cobrou do governo uma punição enérgica aos agentes públicos e as empresas envolvidas no esquema criminoso. Ele também reforçou o discurso oficial de que as irregularidades representam casos isolados e que o fato de algumas unidades terem sido atingidas pela ação da PF não significa que todo o sistema seja frágil. "Temos que mostrar para a nossa população que nós produtores somos as grandes vítimas disso tudo", disse.

Em resposta à reação internacional, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, anunciou nesta segunda-feira que foi suspensa, de forma preventiva, a exportação de carnes produzidas por 21 frigoríficos investigados na operação. A venda no mercado interno permanece liberada, segundo o político.

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