1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Escoceses vão às urnas em referendo histórico sobre independência

Philip Verminnen18 de setembro de 2014

Se o "sim" ganhar, Escócia deve deixar o Reino Unido, pondo fim a uma união de mais de 300 anos. Pesquisas mostram leve vantagem do "não", mas diferença é apertada.

Foto: Getty Images

No começo do século 18, a Inglaterra entrou em guerra com a França. E, com receio de que a Escócia – então um país independente por mais de 800 anos – fosse ficar ao lado do inimigo continental, Londres ameaçou aplicar sanções econômicas caso os escoceses não concordassem em formar um país único. Foi assim que, em 1707, foi formalizada a união política entre o Reino da Escócia e o Reino da Inglaterra – nascia o Reino da Grã-Bretanha, que em 1801, com a união da Irlanda, passaria a se chamar Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda.

Apesar de, para fins de direito internacional, sempre ter sido um Estado com jurisdição própria e ter reconquistado alguns direitos e benefícios ao longo do tempo, a Escócia vai decidir nesta quinta-feira (18/09) se quer ou não reconquistar também a independência – 307 anos depois da assinatura do Tratado de União. Para isso, cerca de 4,3 milhões de eleitores entre os 5,3 milhões de habitantes da Escócia terão que responder a uma pergunta simples, escrita na cédula de votação: "Should Scotland be an independent country? – A Escócia deve ser um país independente?" Sim ou não?

Os locais de votação ficam abertos das 7h até as 22h, no horário local. Os desfechos nos 32 distritos de votação serão conhecidos aos poucos. Cidade maiores, como Glasgow, Edimburgo e Aberdeen, devem apresentar seus resultados apenas na madrugada, e o veredicto nacional deve ser anunciado apenas na manhã da sexta-feira.

Pesquisas apontam resultado apertado

Pesquisas recentes prometem um referendo muito disputado e de resultado imprevisível. Sondagens de intenção de voto feitas por três institutos – ICM, Opinium e Survation – mostraram uma leve vantagem de quatro pontos percentuais para os eleitores do "não", ou seja, aqueles que preferem a manutenção da união com o Reino Unido. Porém, essas pesquisas de opinião pública também revelaram que de 8% a 14% dos eleitores ainda estão indecisos – um dia antes do pleito.

Em Edimburgo, o premiê britânico, David Cameron, implorou pela manutenção da Escócia no Reino UnidoFoto: Reuters/James Glossop

Por isso, a campanha política por esses votos decisivos foi ferrenha e chegou a ser apelativa nas últimas semanas. O primeiro-ministro britânico, David Cameron, em campanha conjunta com os líderes do Partido Trabalhista, Ed Miliband, e o liberal-democrata Nick Clegg, implorou, com lágrimas nos olhos, para que os escoceses não "pedissem o divórcio". Até o astro e ex-jogador de futebol David Beckham foi convocado e, sob o slogan "Better Together – Melhor Juntos" reiterou a importância da manutenção do Reino Unido como ele é.

Entre os principais argumentos do movimento "Better Together" estão os benefícios sociais, econômicos e militares que a Escócia usufrui por fazer parte do Reino Unido. Os escoceses compartilham impostos, fundo de pensão, serviço de saúde e a defesa militar com os demais membros do Reino Unido.

Além disso, um em cada cinco escoceses trabalha para empresas com base em outros países, que terão suas relações afetadas com a provável perda da libra esterlina e a automática exclusão da União Europeia (UE) em caso de independência. Por fim, os favoráveis ao "não" reiteram que os campos petrolíferos no Mar do Norte, uma das principais fontes de renda de uma Escócia independente, não são uma fonte econômica eterna.

Mais autonomia para melhor a administração

Do outro lado está o primeiro-ministro escocês, Alex Salmond, do Partido Nacionalista Escocês (SNP). O cargo, por sinal, é uma das conquistas políticas recentes na Escócia. Em 1707, os parlamentos dos dois países foram unificados num Parlamento britânico. Porém, no final da década de 90, o então premiê britânico, Tony Blair, concedeu a descentralização de poderes e criou-se, assim, o Parlamento autônomo escocês.

Premiê Salmond acredita que o petróleo e a energia eólica vão alavancar a economia da EscóciaFoto: Getty Images/J.J Mitchell

A campanha "Yes Scotland", que além do SNP tem ainda o apoio do Partido Verde e do Partido Socialista, cita que, com a mudança de todos os poderes para o governo escocês, o país estará apto a administrar melhor setores que hoje estão sob controle britânico (energia, transporte e finanças, por exemplo), e a liberdade econômica vai possibilitar melhorias justamente nos campos da saúde, das pensões e também dos cuidados infantis.

Em relação aos postos de trabalho, Salmond e os favoráveis à independência têm uma visão diferente: a Escócia possui muitos recursos naturais e tem potencial para ser um dos maiores exportadores de energia para a Europa – governo escocês projeta a produção de 25% de toda a energia eólica e 10% de toda a energia de ondas consumida na Europa.

Além disso, o "yes" quer acabar com a exploração de energia nuclear e ter o direito da exploração plena das bacias petrolíferas do Mar do Norte – a Escócia independente obteria cerca de 90% dos dividendos da atual produção (cerca de 25 bilhões de libras), pois a maior parte das plataformas estão sob jurisdição escocesa.

O fim da "Union Jack"?

O referendo pode não apenas colocar na pauta temas como a quem pertence a produção no Mar do Norte, qual será a nova moeda e como serão recalculadas as dívidas escocesas no Reino Unido ou ainda quais serão os percalços políticos para as readmissões na Otan e na UE – também o futuro da bandeira do Reino Unido está em aberto.

Sem a Escócia, a tradicional "Union Jack" (centro) pode ter que ser redesenhadaFoto: Andy Buchanan/AFP/Getty Images

Desenhada há mais de 200 anos, a Union Jack combina as cores dos três santos padroeiros da Inglaterra, Irlanda e Escócia. Em caso de independência escocesa, seria necessário decidir um novo desenho, com a entrada, ou não, da cor verde e do dragão vermelho da bandeira do País de Gales. Porém, isso só será mesmo necessário se os nacionalistas escoceses não sustentarem a promessa em manter a rainha Elizabeth como chefe de Estado.

Independente do resultado, "sim" sai vencedor

Ganhando ou não a votação, os nacionalistas, liderados por Salmond, saem vitoriosos do pleito. Pois, mesmo sem a independência da Escócia, o governo local recebeu a promessa dos líderes dos três principais partidos britânicos – Cameron, Miliband e Clegg – de maior autonomia política e fiscal para Edimburgo.

A promessa é que a nova legislação passe a valer já em 25 janeiro de 2015, justamente no feriado nacional escocês, que celebra a data de nascimento de um dos maiores ícones do país: o poeta Robert Burns.

Ao ser questionado na rede britânica BBC, o premiê escocês afirmou que não vai propor um novo referendo caso o "não" vença o pleito. "A minha visão é que isso é uma oportunidade que se dá uma vez a cada geração, talvez uma vez na vida", disse Salmond.

Ele afirmou ainda que o primeiro assunto urgente após a votação é unir a Escócia e o povo escocês. "Na sexta-feira, um dia depois, deixará de haver uma campanha pelo 'sim' e uma campanha pelo 'não', haverá apenas 'uma equipe Escócia'", garantiu Salmond. Assim como fez o rei escocês Kenneth MacAlpin, em 843.

Pular a seção Mais sobre este assunto
Pular a seção Manchete

Manchete

Pular a seção Outros temas em destaque