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Cinema alemão atual

Soraia Vilela

Grupo de cineastas rotulado de "Berliner Schule" e diretores de origem estrangeira se destacam na produção de filmes de ficção a partir da última década do século 20.

Foto: Reuters

Entre os temas preferidos pelos diretores da "República de Berlim" ("inaugurada" em 2000, com a mudança de governo para a cidade) estavam, entre outros, as desventuras de uma geração pós-feminismo (Mulheres, 1993, de Katja von Garnier), muitas vezes emolduradas por dramas pessoais. Assuntos de ordem política perderam, na década de 1990, espaço no cinema do país.

As "comédias de costumes" se mostraram como uma das formas prediletas dos diretores, nitidamente tendentes a road movies centrados em protagonistas que relutam em se tornar adultos. O sucesso de público, nesse momento, passou a depender muito mais dos atores do que dos diretores, o que significou um adeus definitivo à "era do cinema de autor".

História passada a limpo

O passado histórico, entretanto, continuou sendo uma das temáticas presentes a partir dos anos 1990. O regime nazista foi retomado em alguns filmes, embora maquiado por efeitos especiais: a história embalada como entretenimento para o grande público. O ápice desta tendência veio em 2004 com A Queda, de Oliver Hirschbiegel, uma superprodução baseada nos últimos dias de vida de Hitler e voltada para o grande público.

Nejat Aksu (Baki Davrak) e Yeter Öztürk (Nursel Köse): 'Do outro lado'Foto: picture-alliance/dpa

Outra corrente passou a limpo o passado da República Democrática Alemã (RDA), de regime comunista, destacando-se aqui os populares Alameda do Sol (1999), de Leander Haussmann, e Adeus, Lênin! (2002), de Wolfgang Becker. Anos mais tarde, em 2006, A Vida dos Outros, de Florian Henckel von Donnersmarck, viria a tratar mais uma vez do assunto, tendo se transformado em sucesso absoluto de público dentro e fora do país, além de ter levado o Oscar na categoria de melhor filme estrangeiro.

Identidades

A construção de uma nova identidade coletiva e o conceito de nação são também alguns dos temas delineados pela cinematografia alemã nos anos 1990. Seja no delírio de um submundo urbano em Sombras da Noite (1998), de Andreas Dresen, através das gruas de Berlim – que simbolizaram a reconstrução do país em A Vida é Tudo que Temos (1996), de Wolfgang Becker – até o mosaico de citações pop em tom de videoclip do grande sucesso de público da década: Corra, Lola, Corra (1999), de Tom Tykwer.

Benjamin Heisenberg, cineasta alemãoFoto: zorro film

No festival de cinema de Berlim de 2004, o alemão de ascendência turca Fatih Akin recebeu, aos 30 anos, o Urso de Ouro por Contra a Parede, consolidando um segmento do cinema alemão nitidamente impulsionado por uma geração de filhos de imigrantes no país. A temática que nos anos 1980 havia sido tateada pelo cinema do país (ou talvez já a partir de 1974, como O Medo Devora a Alma, de Fassbinder) torna-se mais presente que nunca.

"Migrantenkino"

Os cineastas de ascendência estrangeira, em sua maioria já na terceira geração no país, dão início ao que passa a ser chamado de Migrantenkino, ou seja, cinema dos migrantes. Fascinados pela interseção entre culturas distintas, estes diretores não poupam críticas nem à Alemanha nem ao universo cultural dos países de origem de seus pais. Ao lado de Akin (que viria a produzir, entre outros, Do Outro Lado), destaca-se aqui o trabalho de Thomas Arslan (filho de pai turco e mãe alemã) em Dealer, de 1999, Irmãos (2000), O Belo Dia (2002) e Férias (2006).

Não apenas Akin e Arslan, mas todos os cineastas alemães de origem turca no país refletem em seus filmes aspectos ligados às suas próprias biografias. No lugar de um olhar que idealiza uma ou outra cultura, estes diretores optam por explicitar na tela a aspereza do contato com o Outro, que nem sempre se dá de maneira fluida.

Estes "filmes de migração" retratam com freqüência as dificuldades e os mal-entendidos em que imigrantes se envolvem, as desventuras no contato com departamentos públicos e autoridades, o próprio cruzamento de fronteiras e a vida nos guetos de estrangeiros das grande cidades.

Mantendo uma espécie de "olhar estrangeiro" voltado para os dois lados, eles escancaram as feridas do migrante que insiste em suas próprias tradições, mesmo longe de sua terra natal, e a falta de abertura daquele que recebe, ancorado em seus próprios preceitos e cerrado em relação ao Outro.

Nouvelle Vague alemã?

Foram críticos de cinema franceses que deram início, a partir de 2003, ao debate em torno de um grupo de cineastas rotulado, a princípio, de Nouvelle Vague alemã. O conceito foi transformado pela mídia alemã em Berliner Schule (Escola de Berlim), embora uma "escola" o grupo de cineastas mencionados jamais tenha formado.

Eles tampouco vêm de uma mesma instituição entre as muitas que ensinam cinema no país. O que os une neste contexto é o fato de que todos freqüentaram alguma escola de cinema, não importando qual. E não são "aprendizes da prática". Distantes do improviso, possuem um olhar educado, estetizado pelo cânon cinematográfico. E não necessariamente se inspiram na tradição do cinema alemão, mas na obra de diretores como Michelangelo Antonioni, Robert Bresson ou Luc Dardenne.

Afinidades estéticas

Alguns dos nomes que compõem a Escola de Berlim nem ao menos conhecem seus "colegas" pessoalmente: enquanto Christian Petzold e Angela Schanelec estudaram na Academia de Cinema e TV de Berlim (DFFB), Benjamin Heisenberg e Christoph Hochhäusler passaram por Munique. Já Valeska Grisebach estudou em Viena.

O que une esses cineastas de origens distintas é certa afinidade dramatúrgica e estética: a aversão à construção tradicional de personagens, o olhar voltado para uma realidade áspera, cenários frios e a coragem de optar pelo silêncio, a fim de deixar claro o estado de abandono e solidão dos protagonistas, em sua maioria situados no espaço anônimo da grande cidade.

Destinos incertos

O olhar da Escola de Berlim mantém-se distanciado. Mesmo quando os filmes giram em torno de personagens à margem da sociedade, o fotógrafo (e por conseqüência o espectador) não se envolve diretamente, permanecendo na condição de observador.

Em tom sóbrio, estes cineastas tendem a não encontrar soluções para os conflitos que imprimem a seus personagens. Como no caso de Fantasmas ou Yella, de Christian Petzold, e Adormecido, de Benjamin Heisenberg, não há mais finais felizes, nem sombrios, mas simplesmente abertos. Incertos, como os destinos reais.

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