Considerado um dos autores brasileiros mais influentes do século 20, Rubem Fonseca sofreu um infarto no Rio de Janeiro. Em décadas de carreira, escreveu clássicos da literatura, acumulou prêmios e inspirou gerações.
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O escritor Rubem Fonseca, um dos principais expoentes da literatura brasileira, morreu nesta quarta-feira (15/04) aos 94 anos, após sofrer um infarto no Rio de Janeiro, onde morava. Segundo relatos de familiares à imprensa, ele chegou a ser levado ao Hospital Samaritano, mas não resistiu.
Nascido em Juiz de Fora, Minas Gerais, em 11 de maio de 1925, ele é considerado um dos autores latino-americanos mais influentes do século 20 e renovou a literatura brasileira com sua linguagem direta, que acabaria influenciando várias gerações de escritores.
Entre os vários prêmios recebidos ao longo da carreira, estão o Prêmio Camões, em 2003, concedido a autores que escrevem em língua portuguesa; o antigo Prêmio Juan Rulfo, que recebera no mesmo ano das mãos do colombiano Gabriel García Márquez; e o Prêmio Machado de Assis, em 2015, um dos principais prêmios literários brasileiros.
Ele estreou na literatura em 1963, com o livro de contos Os prisioneiros. Seu extenso trabalho ainda inclui obras como Lúcia McCartney (1967) e Feliz ano novo (1975), também de contos, e os romances O caso Morel (1973), A grande arte (1983) e Agosto (1990). Alguns deles foram adaptados para a televisão ou para o cinema.
O escritor é apontado pela crítica como "o maior contista brasileiro da segunda metade do século 20". Carne crua, seu mais recente livro de contos inéditos, foi editado em 2018.
Marcado por seu estilo ácido, violento, seco e direto, com uma dose de erotismo, o trabalho de Rubem Fonseca atravessou gerações e foi alvo de várias controvérsias ao longo das décadas.
A mais recente foi há poucos meses, quando o governo de Rondônia ordenou a remoção de dezenas de livros clássicos da literatura nacional das escolas públicas por seu conteúdo "inadequado", recuando mais tarde após uma onda de críticas. A lista incluía vários livros de Rubem Fonseca e de outros autores consagrados, como Mário de Andrade, Machado de Assis e Euclides da Cunha.
Nesse sentido, o escritor mineiro sempre admitiu o uso da linguagem "obscena" em suas publicações e defendeu que os escritores não podem "discriminar as palavras".
"Escrevi 30 livros. Todos cheios de palavras obscenas. Nós, escritores, não podemos discriminar as palavras. Não tem sentido um escritor dizer: 'Eu não posso usar isso.' A não ser que você escreva um livro infantil, toda palavra tem que ser usada", afirmou ele ao receber o Prêmio Machado de Assis, entregue pela Academia Brasileira de Letras (ABL).
Conhecido por sua reclusão, a cerimônia em 2015 foi um dos poucos eventos públicos a que ele compareceu.
Rubem Fonseca também marcou por sua recusa a dar entrevistas. Ele estava na Alemanha em novembro de 1989, durante a queda do Muro de Berlim, quando um repórter de TV brasileiro, no meio da confusão, aproximou-se dele e, ao ver que falava português, pediu uma declaração. Foi sua única declaração para a TV brasileira até então, comemorando a queda do Muro.
O repórter não percebeu que falava com o escritor brasileiro mais famoso – e avesso à imprensa – da época. Rubem Fonseca foi creditado como um transeunte comum.
Escritores e personalidades de várias áreas lamentaram nesta quarta-feira a morte do escritor. O autor português Valter Hugo Mãe compartilhou uma foto ao lado do brasileiro, afirmando estar "desolado" com a morte do amigo.
"Desolado com a notícia da morte de Rubem Fonseca, essa maravilha das letras do mundo. Querido amigo, querido magnífico escritor que tanto me honrou, tanto me inspirou. Adeus, mestre. Obrigado por tudo", escreveu o português.
Por sua vez, o jornalista Zuenir Ventura, amigo de Rubem Fonseca, afirmou que "o Brasil perde um de seus melhores escritores, romancistas, contistas". "E eu perdi um amigo de há mais de 50 anos", lamentou ele, citado pelo jornal Folha de S. Paulo.
Com influência multicultural, autores abordam de temas político-sociais a intimistas e autobiográficos. Nomes como Clarice Lispector, comparada a Kafka, e Paulo Coelho com sua busca espiritual, exemplificam diversidade.
Foto: Getty Images
Mestre do realismo
Vindo de família simples, Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro, em 1839. Começou a carreira literária colaborando com jornais e revistas. Sua obra inclui os clássicos "Memórias Póstumas de Brás Cubas" e "Dom Casmurro", romances marcados pelo realismo. Machado de Assis foi o primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL) e é considerado o maior escritor brasileiro.
Foto: Marc Ferrez/Instituto Moreira Salles
Representante do Nordeste
Nascido na Bahia em 1912, Jorge Amado foi traduzido para 49 idiomas e publicado em mais de 50 países. Entre seus romances mais conhecidos, estão "Capitães de Areia" e "Gabriela, Cravo e Canela", que retratam a realidade social baiana, marca da obra do autor. Foi membro da ABL, recebeu o Prêmio Camões pelo conjunto de sua obra e o título de doutor honoris causa pela Universidade de Sorbonne.
Foto: Getty Images
Kafka brasileira
A ucraniana Clarice Lispector chegou ao Brasil com um ano de idade, em 1926. Após o primeiro romance, "Perto do Coração Selvagem", vieram clássicos como "A Hora da Estrela e "A Paixão Segundo G.H.", marcados pela temática existencial e psicológica. Traduzida para diversos idiomas, foi descrita como o Kafka da ficção latino-americana no "New York Times" e biografada pelo americano Benjamin Moser.
Foto: Divulgação
Uma pedra no meio do caminho
Carlos Drummond de Andrade, nascido em 1902, foi cronista, contista e tradutor, mas foi como poeta que ganhou fama. Sua poesia divide-se em fases: irônica ou gauche; social; filosófica; nominal; e das memórias. Um de seus versos mais célebres é "Tinha uma pedra no meio do caminho", do polêmico poema "No meio do caminho". O influente poeta brasileiro foi traduzido para mais de dez idiomas.
Foto: Editora Record
Repórter de guerra
O escritor, professor, sociólogo, engenheiro e repórter Euclides da Cunha nasceu em 1866. Como correspondente do jornal "O Estado de S. Paulo", cobriu a Guerra de Canudos, travada entre o Exército e sertanejos no interior da Bahia. A partir daí nasceu sua obra-prima: "Os Sertões". O livro de cunho sociológico foi traduzido para vários idiomas, entre eles alemão e inglês.
Foto: gemeinfrei
Conhecedor do sertão
Guimarães Rosa, nascido em 1908, ingressou na faculdade de Medicina com apenas 16 anos. Foi como médico que conheceu a realidade dos sertanejos, retratada em seus contos, novelas e no romance “Grande Sertão: Veredas”. Sua coletânea de contos “Sagarana” é considerada um dos volumes mais importantes da ficção brasileira do século 20. Pelo conjunto de sua obra, Rosa recebeu o Prêmio Machado de Assis.
Foto: Ed. Nova Fronteira
Ventos do sul
Nascido em 1905, Erico Verissimo desenvolveu já na infância o interesse pelos clássicos da literatura. Nos anos 1940, lecionou literatura brasileira nos EUA e começou a escrever a obra-prima "O Tempo e o Vento". A trilogia, que tem como pano de fundo a história de seu estado natal, Rio Grande do Sul, levou 15 anos para ficar pronta, virou série de televisão e foi traduzida para vários idiomas.
Foto: Companhia das Letras/Leonid Streliaev
Um brasileiro em Berlim
João Ubaldo Ribeiro nasceu na Bahia em 1941. Do nordeste brasileiro, o escritor preocupado com a identidade nacional partiria para o mundo. A carreira literária o levou aos EUA, a Portugal, à Alemanha. Dos 15 meses como bolsista do DAAD, saíram as crônicas reunidas no bem-humorado livro “Um brasileiro em Berlim“. Vários de seus livros foram publicados em alemão, incluindo “Viva o povo brasileiro“.
Foto: Bruno Veiga
Primeira presidente dos imortais
A carioca Nélida Piñon, nascida em 1937, foi a primeira mulher a presidir a Academia Brasileira de Letras. Formada em jornalismo, teve seu contos, ensaios e romances traduzidos em vários países, inclusive Alemanha, e ocupou cátedras em diversas universidades estrangeiras. Entre os prêmios recebidos, está o Jabuti, pelo livro "Vozes do Deserto", que tematiza a mulher no mundo árabe.
Foto: Divulgação/Editora Record
Versos sujos e melódicos
Ferreira Gullar nasceu no Maranhão em 1930 e vive no Rio de Janeiro. Publicou o primeiro livro de poesia aos 19 anos. Membro do Partido Comunista, foi preso na ditadura e, durante o exílio, escreveu seu livro mais conhecido: “Poema Sujo“. Marcado pelas lembranças da infância, o cotidiano da cidade e a riqueza rítmica e melódica, o livro é considerado um dos mais importantes da poesia brasileira.
Foto: José Olympio Editora/Cristina Lacerda
Entre o mundo árabe e o amazônico
Filho de libaneses, Milton Hatoum nasceu em Manaus em 1952. Formado em Arquitetura, morou em Madri, Barcelona e Paris. De volta à Amazônia, publicou o primeiro romance: "Relato de um Certo Oriente". Já doutor em teoria literária, escreveu "Dois irmãos", trama sobre uma família libanesa que vive em Manaus. Estes e os livros seguintes receberam diversos prêmios e foram publicados em 14 países.
Foto: DW
Sucesso com a busca espiritual
Paulo Coelho, nascido em 1947, iniciou a carreira literária nos anos 1980. Da peregrinação pelo Caminho de Santiago, resultou o primeiro romance de destaque: "O Diário de um Mago". A busca espiritual continuou em "O Alquimista", livro brasileiro mais vendido de todos os tempos e mais traduzido no mundo (69 idiomas). Sua literatura, alvo de polêmica, lhe rendeu dezenas de prêmios e condecorações.