"Estado Islâmico" usa civis em armadilhas, diz ONU
28 de março de 2017
Nações Unidas acusam grupo jihadista de usar civis como escudo humano e de prendê-los em edifícios minados com explosivos. Desde 17 de fevereiro, mais de 300 pessoas morreram no oeste de Mossul.
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As Nações Unidas condenaram a "perda maciça de vidas civis no oeste de Mossul", em comunicado divulgado nesta terça-feira (28/03), e acusaram o grupo jihadista "Estado Islâmico" (EI) de tentar maximizar os danos causados à população.
O alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid bin Ra'ad al-Hussein, acusou os extremistas do EI de manter civis em edifícios minados com explosivos, de usá-los como escudos humanos e de atirar contra aqueles que tentam fugir.
Hussein comunicou que, desde 17 de fevereiro, ao menos 307 pessoas foram mortas e 273 ficaram feridas no oeste de Mossul, no Iraque, como consequência de ataques aéreos da coalizão internacional liderada pelos EUA e execuções do EI.
Segundo testemunhos de pessoas que conseguiram escapar da zona de combate, os jihadistas do EI obrigaram civis a permanecerem em suas casas, "em muitos casos inclusive os prendendo dentro do imóvel", enquanto se posicionavam com armamento nos tetos das casas.
Após detectá-los, as forças da coalizão bombardeavam os edifícios matando os jihadistas, mas também os civis, que se não atingidos pelo bombardeio, morriam com a explosão dos artefatos improvisados colocados pelos extremistas.
"Este é um inimigo que explora impiedosamente os civis para seus próprios fins, e claramente não têm escrúpulo algum ao colocá-los em perigo", disse Hussein, acrescentando que a coalizão internacional tem que ter mais cuidado ao planejar seus ataques. "É vital que as forças de segurança iraquianas e seus parceiros da coalizão evitem essas armadilhas."
O governo do Iraque e as forças da coalizão se comprometeram a realizar investigações dos incidentes mais graves. "Estas investigações devem ser minuciosas, profundas e transparentes, devem estabelecer quantas mortes civis houve e torná-las públicas", defendeu o comissário.
As testemunhas também acusaram os milicianos do EI de deslocamentos forçados dentro da cidade e de usar os civis como escudos humanos ao se locomover pela cidade com eles ao lado.
"Os milicianos dizem aos civis que o melhor que pode acontecer é morrer pelo califado", disse Rupert Colville, porta-voz do alto comissário.
Ataque aéreo ou armadilha do EI?
Em 17 de março, uma explosão no distrito de al-Jadida matou mais de 200 pessoas. Investigadores estiveram em Mossul, nesta terça-feira, para determinar qual foi a causa da explosão: um ataque aéreo ou explosivos do EI.
O comando militar do Iraque responsabilizou os extremistas de equipar o edifício com explosivos para causar baixas civis, mas algumas testemunhas relataram que um bombardeio aéreo atingiu o prédio, soterrando muitas famílias sob os escombros.
"É muito possível que o EI tenha detonado aquele prédio para culpar a coalizão, a fim de causar um atraso na ofensiva em Mossul e retardar as ofensivas aéreas da coalizão", disse o chefe de Estado-Maior do Exército dos EUA, Mark Milley. "É possível também que tenha sido um ataque aéreo da coalizão, mas ainda não sabemos. Investigadores estão no local."
O Observatório do Iraque para os Direitos Humanos comunicou que desde que começou a campanha militar visando o oeste de Mossul, houve relatos não confirmados de cerca de 700 civis mortos por ataques aéreos da coalizão ou ações do "Estado islâmico".
PV/efe/rtr/dpa/ap
"Estado Islâmico": de militância sunita a califado
Origens do grupo jihadista remontam à invasão do Iraque, em 2003. Nascido como oposição ao domínio xiita e inicialmente um braço da Al Qaeda, EI passou por mudanças e virou uma ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com a derrubada do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo sunita surgiu a partir da união de diversas organizações extremistas, leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra a ascensão dos xiitas ao governo iraquiano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al Qaeda
A insurreição se tornou cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi, fundador da Al Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se voltaram contra eles e se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
Foto: AP
Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea e ele foi sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Omar al-Bagdadi. A AQI mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). No ano seguinte, Washington intensificou sua presença militar no país. Masri e Bagdadi foram mortos em 2010.
Foto: AP
Volta dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a se reagrupar, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o EIIL atravessou a fronteira para participar da luta contra o presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram se fundir com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EIIL e a central da Al Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do racha com a Al Qaeda, o EIIL fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando sua segunda maior cidade, Mossul, em 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já havia sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
Foto: picture alliance / AP Photo
Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Ela é uma importante rota de exportação de petróleo e ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Mas a conquista da cidade é vista como apenas uma etapa para os extremistas, que pretenderiam avançar a partir dela.
Foto: Getty Images
Atual abrangência do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho, a organização declarou um "Estado Islâmico" que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e tem Abu Bakr al-Bagdadi como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da charia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado" após serem colocados diante da opção: converter-se ao islã sunita, pagar um imposto ou serem executados. Os xiitas também eram alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o patrimônio histórico
O EI destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. Eles diziam que esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do Islã. Especialistas afirmam, porém, que o grupo faturou alto no mercado internacional com a venda ilegal de estátuas menores, enquanto as maiores eram destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Durante suas ofensivas armadas, o "Estado Islâmico" saqueou centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupou diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Seus militantes também se apossaram do armamento militar de fabricação americana das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional.