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Estados Unidos se preparam para apertar os cintos

2 de março de 2013

Sem consenso na busca de medidas para reduzir a dívida pública, Obama autoriza dura política de austeridade. Republicanos e democratas trocam acusações mútuas pelo fracasso nas negociações.

Foto: Reuters

A partir deste sábado (02/03) os Estados Unidos terão que enfrentar um significativo corte nos gastos públicos, já que o presidente Barack Obama e os parlamentares republicanos não conseguiram chegar a um consenso sobre o orçamento. Na noite da véspera, Obama assinou a autorização para dar início a um duro plano de austeridade.

Mesmo com a série de cortes automáticos de despesas, democratas e republicanos mostraram-se intransigentes e não chegaram a um acordo na última rodada de negociações do drama fiscal vivido pelos EUA, que durou 18 meses. As últimas conversas entre Obama e os líderes congressistas não avançaram. Após a tentativa frustrada, o presidente norte-americano descreveu como "estúpidos" e "arbitrários" os cortes que passam a valer a partir de agora, e alertou para o impacto negativo sobre a economia e os postos de trabalho.

O assim chamado confisco (sequestration) – 85 bilhões de dólares em cortes gerais para o ano fiscal de 2013 – vai afetar tanto a área de defesa quanto a social. Outro 1,2 trilhão será cortado na próxima década. Criado originalmente como uma estratégia para coibir o extremismo partidário dos membros do Congresso e obter um consenso sobre taxas e despesas, não se acreditava que o rígido plano de austeridade se tornaria realidade.

Agora, porém, ambos os lados trocam acusações. "Infelizmente parece que os republicanos optaram por essa situação em vez de buscarem um meio-termo, em vez de cobrar mais dos norte-americanos mais abastados. Eles preferiram deixar que os cortes recaíssem diretamente sobre a classe média", declarou Obama em seu programa de rádio deste sábado.

Cálculo pouco racional

Apesar de, em janeiro passado, terem concordado com o adiamento da drástica medida por pelo menos dois meses, e com a elevação dos tributos pagos por famílias que ganham acima de 450 mil dólares por ano, muitos republicanos não se mostraram afeitos a atender a demanda do presidente desta vez.

Negociações entre presidente e parlamentares não avançaramFoto: picture-alliance/dpa

"Muitos norte-americanos estão ouvindo pela primeira vez sobre essa criação de Washington, o confisco", disse o republicano John Boehner, presidente da Câmara dos Representantes, em editorial publicado pelo jornal Wall Street Journal em 20 de fevereiro. "O que eles podem não entender com as declarações do senhor Obama é que isso é um produto da liderança fracassada do próprio presidente."

De acordo com Ron Haskins, especialista em questões orçamentárias do Instituto Brookings, em Washington, os partidos se mostraram indispostos a forjar um acordo bipartidário de austeridade, porque seriam apontados por seu eleitorado como politicamente responsáveis pelo sofrimento advindo das medidas. Assim, revelaram-se mais propensos a permitir que o confisco aconteça e, posteriormente, jogar a culpa em seus adversários.

"Não acredito que eles realmente tenham feito um cálculo racional", afirmou Haskins à Deutsche Welle. "Provavelmente o principal elemento no raciocínio deles é de poder culpar o outro grupo – isso é o que pretendem fazer."

Dívida nacional norte-americana continua crescendo, com pouca perspectiva de freioFoto: picture-alliance/dpa

Premissas equivocadas

O atual drama fiscal norte-americano começou em julho de 2011, quando o Congresso precisou aumentar o teto de endividamento, o limite permitido aos Estados Unidos para tomada de empréstimo. Antes, esse era apenas um procedimento de rotina que permitia o governo federal pagar dívidas já contraídas.

Mas os republicanos, empolgados com a decisiva vitória eleitoral em 2010, buscaram forçar a redução do déficit após uma década de descontrole de gastos no governo de George W. Bush e, posteriormente, no de Barack Obama.

A subsequente batalha partidária sobre o teto de dívidas levou as agências de classificação a rebaixarem a nota norte-americana pela primeira vez na história. Na tentativa de resolver o impasse, Obama propôs um plano de austeridade inspirado num acordo de redução de déficit selado durante a administração Reagan: se o Congresso não concordasse voluntariamente com os cortes sensatos, cortes automáticos de gastos de cerca de 1,2 trilhão de dólares seriam aplicados ao longo de uma década.

O corte, no entanto, baseou-se em suposições políticas equivocadas. Como os cortes automáticos atingiriam igualmente as áreas de defesa e social, tanto o Congresso quanto a Casa Branca acreditaram que republicanos e democratas seriam forçados a buscar um consenso e a negociar um acordo mais amplo e mais objetivo.

"Essas suposições subestimaram o fato de que no Partido Republicano há gente suficiente que pensa: 'Estamos tão preocupados com a dívida e somos tão contra aos gastos do governo, que se o preço para cortar esses gastos for menos recursos para a defesa, então vamos engolir em seco e aceitar'", afirmou à DW Bruce Stokes, diretor do departamento Global Economic Attitudes no Centro de Pesquisa Pew, em Washington.

Impactos do confisco

A administração Obama fez uma ofensiva midiática, jogando a culpa do corte à suposta intransigência da Câmara de Representantes. A Casa Branca publicou relatórios específicos para cada um dos 50 estados norte-americanos, de duas páginas cada, mostrando como os 85 bilhões de dólares reduzidos este ano poderiam impactar a população norte-americana em nível local.

O secretário de Defesa, Leon Panetta, alertou que os cerca de 800 mil empregados do Pentágono poderiam ter que se licenciar, enquanto a secretária de Educação, Arne Duncan, disse que poucas das 70 mil famílias de baixa renda passariam a ter acesso ao programa Head Start da pré-escola. Já o secretário de Transportes, Ray LaHood afirmou que passageiros poderiam ter que enfrentar até 90 minutos de atrasos nas partidas dos aeroportos, devido à redução do número de controladores de voos.

Ameaça: 800 mil civis que trabalham no Pentágono poderão ter que tirar licençaFoto: picture-alliance/dpa

Ainda que a redução de gastos atinja fortemente certa fatia do eleitorado, é bastante improvável que ela jogue os Estados Unidos numa recessão. O economista-chefe do Bank of America, Ethan Harris, prevê que o crescimento econômico caia a 1% no segundo trimestre deste ano. E, ainda que a política de austeridade seja "feia", ela levará Washington à meta de consolidação fiscal.

"Com a implementação do corte, o Congresso e o presidente terão reduzido o déficit em 3,6 trilhões de dólares em 10 anos", afirmou Haskins, referindo-se também às duas rodadas anteriores de suspensão de gastos. "Nunca antes se conseguiu chegar a um resultado como este."

Até o momento, os mercados financeiros não puniram os EUA por seus erros fiscais e seu impasse político. "Os mercados perdoarão muita coisa de Washington", afirmou Stormy-Annika Mildner, analista do Instituto alemão para Relações Internacionais e de Segurança, em entrevista à DW. "E isso também pode ser um dos problemas. Pois a punição pelos mercados é tão pouca, que talvez não haja suficiente pressão para os políticos buscarem um consenso."

Autor: Spenser Kimball (msb)
Revisão: Augusto Valente

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