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HIV/Aids

1 de dezembro de 2010

Passados 27 anos da descoberta do vírus HIV, a pesquisadora francesa Françoise Barré-Sinoussi fala sobre o estágio atual das pesquisas, as perspectivas para o desenvolvimento de uma vacina e o futuro do combate à aids.

Pesquisadora busca vacina contra vírus HIVFoto: picture-alliance/APA/HERBERT P. OCZERET

Deutsche Welle: A senhora descobriu o vírus HIV em 1983. Como se encontram as pesquisas do HIV/Aids hoje, passados 27 anos?

Françoise Barré-Sinoussi: Ainda há muito a ser feito. Quando se trata de prevenção, todos pensam no desenvolvimento de uma vacina. Quando o assunto é tratamento, todo pesquisador sonha com a erradicação completa do vírus do organismo.

Eu pessoalmente não acredito – ainda que eu gostaria muito de estar errada – que conseguiremos eliminar completamente o vírus do corpo humano. Mas seria maravilhoso se pudéssemos encontrar uma estratégia para reduzir de forma permanente a presença do vírus no organismo. Dessa forma, chegaríamos mais perto do objetivo de evitar que os pacientes precisem de tratamento durante toda a vida.

Mas uma coisa é clara: a busca por um novo tratamento e meios de prevenção para o futuro não pode ser alcançada se não pesquisarmos mais fortemente em busca de informações básicas. Precisamos compreender melhor a interação entre o vírus e o hospedeiro e, acima de tudo, precisamos saber o que acontece logo nos primeiros dias após a infecção.

A senhora buscou por uma vacina contra o HIV durante anos e não teve sucesso. Como lida com esse resultado infrutífero?

Durante quase dez anos, até 1991, pesquisei em busca de uma vacina. Mas depois decidi abandonar essa ideia e passei a tentar entender melhor a interação entre o vírus e o hospedeiro. Isso porque cheguei à conclusão de que nenhuma vacina será descoberta enquanto não entendermos melhor as alterações que o vírus pode causar no organismo.

Isso não me deixou especialmente decepcionada. Se você considerar outras doenças infecciosas, existem muitas cuja descoberta de uma vacina durou 50 ou até mesmo 100 anos. É uma questão de tempo, é uma questão da evolução do nosso conhecimento cientifico.

É também uma questão de tecnologia. Nos últimos anos temos feito um grande progresso tecnológico, por exemplo no campo da genética – que pode ser muito útil para o desenvolvimento de uma vacina.

A senhora lidera a unidade de infecções retrovirais do Instituto Pasteur. O que está pesquisando atualmente?

Meu laboratório tenta descobrir que mecanismos uma vacina precisa provocar no corpo para produzir reações de defesa naturais contra o HIV ou a aids. Para isso usamos quatro modelos diferentes. Um grupo de pesquisadores examina os chamados "controladores de HIV", os poucos indivíduos HIV positivos que são naturalmente capazes de controlar a infecção, em busca da resposta para a pergunta "por que eles conseguem fazer isso?".

Um segundo grupo se ocupa com macacos africanos. Macacos na África portam vírus que são muito parecidos com o HIV, mas nunca desenvolvem a doença. Nós sabemos que o sistema imunológico deles é ativado muito mais fortemente do que em infecções do HIV, ele tem muito mais controle. Quais mecanismos estão relacionados com isso?

Apenas 20% das mães transmitem o vírus para os filhosFoto: dpa Bilderdienste

O terceiro grupo trabalha com a "interface materno-fetal", isso significa que eles se ocupam com a transmissão do HIV-1 da mãe para o feto. Muito raramente as gestantes transmitem o HIV-1 para seus filhos: a probabilidade é de apenas 20%. E nesses 20% a maioria das transmissões acontece após o nascimento e não durante a gravidez. O que faz com que o feto fique protegido no útero contra o vírus?

Nossa quarta equipe está ligada intimamente com a pesquisa de uma vacina: se estabelece um modelo in vitro para estudar a interação entre as células dentríticas [as células do sistema imunológico] e células exterminadoras naturais.

Procuramos entender em que medida e de que maneira células exterminadoras naturais reagem quando são expostas a células dentríticas infectadas com o vírus HIV ou quando são expostas a células dentríticas que foram protegidas com possíveis vacinas contra o HIV. Esse time pesquisa, portanto, as defesas naturais.

Erradicar a doença é uma das metas do milênio da ONUFoto: dpa

Uma das Metas do Milênio da Organização das Nações Unidas é a luta mundial contra a proliferação do HIV. Um objetivo intermediário era assegurar tratamento universal contra o HIV até 2010. Esse objetivo não foi alcançado. Quão otimista a senhora está em relação ao objetivo principal?

Devo dizer que estou preocupada. Eu me preocupo com o futuro. Como você disse, um dos objetivos já fracassou. Estamos em 2010 e não o alcançamos. Ouço os governos falarem cada vez menos dessa meta. Vejo que o dinheiro que os países ricos prometeram para o Fundo Global de Luta contra HIV/Aids, Malária e Tuberculose não foi o bastante para dar acesso a todos os pacientes aos tratamentos antirretrovirais ou para continuar esse tratamento.

Isso significa para mim que precisamos urgentemente encontrar outras soluções para financiar o acesso ao tratamento antirretroviral. Se isso não acontecer, caminharemos para uma catástrofe.

Porque, quando um paciente tem seu tratamento interrompido, nós aumentamos a resistência aos medicamentos antirretrovirais. E isso não apenas em países em desenvolvimento. O vírus viaja com as pessoas. Corremos o risco de uma nova epidemia de HIV/Aids no mundo. Essa responsabilidade é dos políticos.

A senhora dedica sua vida à pesquisa do HIV, o que exige uma paixão especial. De onde vem sua motivação?

Meu impulso sempre foram os outros. Tentar fazer algo bom para o outro sempre foi o que me motivou. Daí vem também, acredito, minha paixão. E, quando se trabalha com HIV/Aids, esse ímpeto cresce mais e mais. Desde cedo tive contato com pessoas infectadas e vi suas vidas. Ver como elas vivem com essa doença me convenceu de que precisamos fazer mais. Fazer mais e tentar dar o melhor de nós para elas.

Entrevista: Anna Corves (mda)
Revisão: Alexandre Schossler

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