Com apoio de Reino Unido e França, forças americanas disparam mais de cem mísseis, em ataque pontual contra instalações do regime de Assad ligadas a armas químicas. Damasco e aliados reagem com indignação.
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Estados Unidos, França e Reino Unido lançaram na madrugada deste sábado (14/04) bombardeios na Síria, numa retaliação pelo ataque químico na cidade de Duma, que matou mais de 40 pessoas e é atribuído pelo Ocidente ao regime de Bashar al-Assad.
O ataque, segundo o Pentágono, foi pontual: durou apenas uma noite e teve como alvo instalações ligadas a armas químicas, como centros de pesquisa e armazenamento. Ao todo, mais de 100 mísseis foram disparados a partir de aviões e destroiers americanos, com apoio das forças francesa e britânica.
“Eu ordenei às Forças Armadas dos EUA que lançassem ataques precisos em alvos associados ao poderio de armas químicas do ditador sírio Bashar al-Assad”, discursou Trump, enquanto os primeiros mísseis caíam em território sírio.
Foram três os alvos atingidos durante a noite de sábado: um centro de pesquisa científica na grande Damasco e duas instalações de armas químicas a oeste de Homs – uma delas, segundo os EUA, usada na produção do agente nervoso sarin, e outra parte de um posto de comando militar.
Embora Trump tenha dito que os EUA estão preparados "para manter essa resposta até o regime sírio parar de usar agentes químicos proibidos", o Pentágono se apressou para deixar claro que não há novos bombardeios programados.
O secretário de Defesa Jim Mattis, que já havia alertado para os riscos de uma intervenção maior no conflito sírio, afirmou que só haverá novos ataques se o regime de Assad voltar a usar armas químicas: "Fomos precisos e proporcionais, mas, ao mesmo tempo, foi um ataque pesado".
Como comparação, segundo Mattis, o bombardeio deste sábado foi duas vezes maior e atingiu dois alvos a mais do que o ataque de abril do ano passado, que mirou uma base aérea síria com mais de 50 mísseis. A ação, na ocasião, também foi uma retaliação ao uso de armas químicas por Assad.
Em conjunto com Reino Unido e França, o ataque americano é uma demonstração de unidade do Ocidente, após o que os líderes dos três países condenarem como uma consistente violação das leis internacionais.
Apesar da cautela demonstrada pelo Pentágono, o ataque envolve os EUA ainda mais no complexo conflito sírio e abre a possibilidade de confrontação com Rússia e Irã, dois dos pilares de sustentação do regime de Assad.
“Ao Irã e à Rússia, eu pergunto, que tipo de países querem estar associados ao assassinato em massa de homens, mulheres e crianças inocentes?”, disse Trump, que ao longo da semana havia feito uma série de ameaças a Assade seus aliados.
Foram necessários apenas 90 minutos para que o embaixador russo nos EUA alertasse para "consequências" após os ataques aliados. Segundo Moscou, 71 dos 103 mísseis disparados foram interceptados pelo regime sírio. A informação não pôde ser confirmada.
Durante o discurso, que durou oito minutos, Trump deixou claro que é cauteloso quanto a um envolvimento mais profundo na Síria, onde cerca de dois mil soldados americanos foram mobilizados para combater o "Estado Islâmico".
“Os EUA não procuram uma presença indefinida na Síria”, disse.
Ocidente mostra unidade
Logo após o anúncio de Trump, a primeira-ministra britânica, Theresa May, divulgou um comunicado dizendo que ao Reino Unido "não resta alternativa" a não ser o uso da força na Síria. "Nós não podemos permitir a normalização do uso de armas químicas – seja dentro da Síria, seja nas ruas do Reino Unido ou em qualquer outro lugar do mundo", informa o comunicado.
May disse que os bombardeios visavam especificamente a destruir a capacidade de Assad de usar armas químicas, e que a coalizão dos três países não tem a intenção de interferir na guerra civil da Síria ou forçar uma mudança de regime.
O presidente francês Emmanuel Macron disse que a operação conjunta mirou o "arsenal químico clandestino" do governo sírio.
O ataque em Duma na última semana "cruzou a linha vermelha para a França", afirmou Macron. "Nós não podemos tolerar a trivialização do uso de armas químicas que apresentam um perigo imediato para o povo sírio e para nossa segurança coletiva."
Os três aliados ocidentais disseram esta semana ter encontrado evidências de que o governo do presidente Bashar al-Assad foi o responsável pelo ataque do último sábado e que o regime teria que pagar o preço por utilizar armas químicas.
A chanceler federal alemã, Angela Merkel, classificou o ataque como "apropriado e necessário", embora a Alemanha não tenha tido participação no bombardeio. O presidente da Comissão Europeia, Donald Tusk, afirmou que a "UE está com seus aliados".
"Trump, Macron e May são criminosos"
O embaixador da Rússia nos Estados Unidos disse que "tais ações não ficarão sem consequências." O ministério russo do Exterior afirmou que o ataque "veio justamente no momento em que o país tinha uma chance de paz."
"Boas almas não serão humilhadas", tuitou a presidência da Síria logo após o início dos bombardeios. A mídia estatal condenou os ataques como "flagrante violação da lei internacional" e "fadados ao fracasso".
O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, disse que o ataque americano foi um crime sem propósitos. "Os EUA e seus aliados não vão conseguir nada com seus crimes na Síria. Atacar a Síria é um crime. O presidente americano, a premiê britânica e o presidente francês são criminosos".
RPR/FF/ap/rtrt/afp/dpa
Cronologia da guerra na Síria
O que se iniciou com protestos pacíficos em 2011 virou uma guerra civil brutal que já matou centenas de milhares de pessoas e fez milhões de refugiados. Reveja os principais acontecimentos.
Foto: Reuters/Stringer
2011: O início
Em 15 de março de 2011, protestos pacíficos contra a detenção de jovens acusados de fazer pichações antigoverno em sua escola, na cidade de Daraa, são reprimidos por forças de segurança, que abrem fogo contra manifestantes desarmados, matando quatro. Os protestos continuam por vários dias, fazendo 60 mortos e se espalham por todo o país. Segue-se um período de repressão violenta.
Foto: Anwar Amro/AFP/Getty Images
2011/2012: Isolamento internacional
O ex-presidente Barack Obama insta o presidente Bashar al-Assad a renunciar, e os EUA anunciam sanções a Assad em maio e congelam bens do governo sírio nos EUA em agosto de 2011. A União Europeia também anuncia sanções, em setembro. Em novembro, a Liga Árabe suspende a Síria e impõe sanções ao regime. Também a Turquia anuncia uma série de medidas, incluindo sanções, em dezembro.
Foto: AP
2012: Observadores internacionais desistem
Em dezembro de 2011, a Síria permite a entrada de observadores da Liga Árabe para monitorar a retirada de tropas e armas de áreas civis. A missão é suspensa em janeiro de 2012. Em fevereiro, os EUA fecham sua embaixada em Damasco. Em abril de 2012, chegam observadores da ONU, que partem dois meses depois por falta de segurança.
Foto: REUTERS
2013: Ataque com gás
Em março, um ataque com gás mata 26 pessoas, ao menos a metade deles soldados do governo, na cidade de Khan al-Assal. Investigação da ONU conclui que foi usado gás sarin. Em agosto, outro ataque com gás mata centenas em Ghouta Oriental, um subúrbio de Damasco controlado pelos rebeldes. A ONU afirma que mísseis com gás sarin foram lançados em áreas civis. Os EUA e outros países culpam regime sírio.
Foto: picture-alliance/AP Photo
2013: Destruição de armas químicas
Em agosto, investigadores da ONU chegam à Síria para averiguar o uso de armas químicas, em meio a denúncias de médicos e ativistas. EUA afirmam que 1.429 pessoas morreram num ataque, e Obama pede ao Congresso autorização para ação militar. Em setembro, o Conselho de Segurança da ONU ameaça usar a força e, em outubro, Damasco inicia a destruição de seu arsenal declarado de armas químicas.
Foto: AFP/Getty Images
2014: EUA atacam "Estado Islâmico"
Em setembro, os EUA iniciam ataques aéreos a alvos do "Estado Islâmico" na Síria. Em outubro, o mediador da ONU, Staffan de Mistura, começa a negociar uma trégua ao redor de Aleppo, mas o plano fracassa meses depois.
Foto: picture-alliance/AP Photo/V. Ghirda
2015: Rússia entra no conflito
Em setembro, a Rússia, que desde o início fornecera ajuda militar ao governo sírio nos bastidores, entra ativamente no conflito, bombardeando opositores do regime. A ajuda se mostra decisiva, e a guerra civil passa a pender para o lado de Assad, que nos meses seguintes recupera território perdido para os rebeldes.
Foto: Reuters/Rurtr
2016: Governo controla Aleppo
A ONU e a Opac afirmam que tanto militares sírios quanto o "Estado Islâmico" usaram gás em ataques a opositores. O ano é marcado por várias tentativas de tréguas. Em setembro, a cidade de Aleppo é alvo de 200 ataques aéreos por forças pró-Assad num fim de semana. Em dezembro, as forças governamentais assumem controle de Aleppo, encerrando quatro anos de domínio dos rebeldes.
Foto: Getty Images/AFP/G. Ourfalian
2017: Ataque em Idlib
Em fevereiro, Rússia e China vetam resolução do Conselho de Segurança da ONU pedindo sanções ao governo sírio pelo uso de armas químicas. Em abril, ao menos 58 pessoas morrem na província de Idlib, dominada pelos rebeldes, no que aparenta ser um ataque com gás. Testemunhas afirmam que o ataque foi executado por jatos sírios e russos, mas tanto Moscou quanto Damasco negam bombardeio.
Foto: Getty Images/AFP/O. H. Kadour
2017: Resposta dos EUA
Em abril, os EUA lançam dezenas de mísseis sobre a base militar de onde se acredita ter saído o ataque em Idlib. Em maio, o presidente Donald Trump aprova planos para armar combatentes das milícias curdas YPG na luta contra o "Estado Islâmico". A medida enfurece a Turquia, que vê as YPG como um grupo terrorista. Em outubro, o "Estado Islâmico" perde o controle de Raqqa, sua autoproclamada capital.
Em janeiro, aviões turcos bombardeiam a região curda de Afrin, dando início à operação contra as YPG intitulada "Ramo de Oliveira". A Turquia anuncia a morte de centenas de "terroristas", mas entre os mortos estão dezenas de civis, dizem ativistas. Em fevereiro, as milícias YPG chegam a acordo com o regime sírio para o envio de tropas pró-governo para auxiliar no combate aos turcos em Afrin.
Foto: picture alliance/AA/E. Sansar
2018: Ofensiva em Ghouta Oriental
Em 21 de fevereiro, tropas pró-regime executam ofensiva em larga escala contra enclave rebelde localizado ao leste de Damasco. Em torno de 400 mil civis ficam sitiados, com acesso limitado a alimentos e cuidados médicos. Os ataques matam centenas de pessoas. No dia 24 de fevereiro, o Conselho de Segurança da ONU aprova trégua humanitária de 30 dias vigente em todo o território sírio. Ela fracassa.
Foto: Reuters/B. Khabieh
2018: O bombardeio ocidental
Após dias de ameaça, em 14 de abril Trump anuncia o lançamento de mais de cem mísseis, em conjunto com França e Reino Unido, na Síria. O ataque é uma retaliação ao ataque químico na cidade de Duma, que matou dezenas de civis e que o Ocidente atribui ao regime de Bashar al-Assad.
Foto: picture-alliance/AP Photo/L. Matthews
2019: Estados Unidos começam a se retirar da Síria
Em janeiro de 2019, os Estados Unidos começaram a se retirar da Síria. O presidente americano afirmou que o Estado Islâmico havia sido derrotado e, por isso, a presença dos EUA não seria mais necessária. A decisão foi contestada dentro do próprio governo e também pelas milícias curdas na Síria, aliadas dos EUA, que temiam enfraquecer-se.
Foto: Getty Images/AFP/D. Souleiman
2019: fim do autoproclamado califado do EI
Em março de 2019, as Forças Democráticas Sírias (FDS), aliança liderada por curdos, anunciaram que o autoproclamado califado do Estado Islâmico foi totalmente eliminado, após combates em Baghouz, considerado o último reduto jihadista na Síria. Militantes curdos e árabes das FDS, apoiados pela coalizão internacional liderada pelos EUA, combatiam há várias semanas os jihadistas.