EUA já retiraram mais de 80 mil pessoas do Afeganistão
25 de agosto de 2021
Governo americano afirma que prioridade será retirada das tropas nos últimos dias de agosto. Rússia muda abordagem e anuncia ponte aérea para resgatar cidadãos.
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Os Estados Unidos anunciaram nesta quarta-feira (25/08) que mais 19 mil pessoas deixaram o Afeganistão no dia anterior. Com isso, aumentou para 82.300 o número total de pessoas que Washington ajudou a retirar do país desde 15 de agosto, e para 87.900 o número de pessoas retiradas de solo afegão desde julho, entre cidadãos americanos e civis afegãos sob risco.
A imprensa americana está classificando a operação como a maior "ponte aérea" da história militar dos EUA. Os números ultrapassam a quantidade de pessoas retiradas de Saigon, no antigo Vietnã do Sul, nos últimos dias da guerra no sudoeste asiático em 1975.
Porém, ficam atrás da maior operação aérea de civis ja registrada, que foi executada pela Índia em 1990, quando mais de 170 mil cidadãos indianos foram retirados do Kuwait ao longo de dois meses durante a Guerra do Golfo.
Segundo o jornal New York Times, o governo do presidente Joe Biden tem procurado destacar a escala da operação numa tentativa de mudar o foco das críticas sobre a rápida retomada de Cabul pelos terroristas do Talibã, após 20 anos de presença americana.
No último domingo, como parte dessa tentativa de destacar algo positivo do fiasco militar, Biden chegou a mencionar a Ponte Aérea de Berlim, um sucesso militar americano (e britânico) da Guerra Fria, quando mais de 200 mil voos abasteceram o setor oeste da cidade alemã durante um bloqueio soviético que se estendeu por quase um ano.
Os talibãs se comprometeram a permitir que cidadãos americanos e afegãos em risco deixem o Afeganistão após 31 de agosto, anunciou nesta quarta-feira (25) o secretário de Estado americano, Antony Blinken.
Ainda nesta quarta, o chefe da diplomacia do governo Biden, Antony Blinken, afirmou que "os talibãs assumiram compromissos públicos e privados para proporcionar e permitir uma passagem segura aos americanos, aos cidadãos de países terceiros e aos afegãos em risco a partir de 31 de agosto", ou seja, depois do prazo final de retirada dos EUA.
Blinken declarou aos jornalistas que pelo menos 4.500 cidadãos americanos dos 6.000 que queriam deixar o país já foram retirados.
Assim, segundo estimativas, restariam cerca de 1.500 americanos a ser evacuados do Afeganistão. Com 500 deles existe um "contato direto" próximo, afirmou.
"Estamos em contato ativo com eles várias vezes por dia através de múltiplos canais de comunicação (...) para determinar se ainda querem partir", disse Blinken aos jornalistas.
Também nesta quarta-feira, os EUA afirmaram que darão prioridade à saída das suas tropas do Afeganistão nos "últimos dias" antes de 31 de agosto, mas asseguraram que continuarão a retirar os seus cidadãos e colaboradores afegãos até o fim, se necessário.
"Começaremos a priorizar a partida de equipamento e recursos militares, o que não significa que se houver pessoas necessitadas de sair do país não tentemos levá-las, mas reservaremos uma parte dessa capacidade nos últimos dias para dar prioridade à saída da presença militar", disse o porta-voz do Pentágono, John Kirby.
Ele destacou que as vidas serão sempre mais importantes que qualquer tipo de equipamento militar na retirada do Afeganistão.
Os EUA já haviam anunciado que começaram a reduzir a sua presença militar, que havia sido reforçada neste mês diante do rápido avanço da ofensiva talibã no país.
O Pentágono confirmou na terça-feira à noite que "várias centenas" de soldados americanos já tinham deixado o Afeganistão, após cumprirem a sua missão no aeroporto de Cabul.
Kirby afirmou nesta quarta-feira que, em vez dos 5.800 dos últimos dias, os EUA têm, neste momento, 5.400 militares destacados no Afeganistão, com a missão concreta de proteger o aeroporto da capital.
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Operação russa
Paralelamente, a Rússia lançou nesta quarta-feira uma ponte aérea para retirar do Afeganistão cerca de 500 cidadãos russos e de outros países vizinhos, informou o Ministério da Defesa russo em um comunicado.
As retiradas ocorreram com o apoio de quatro aviões militares, que transportaram russos e cidadãos de países membros da aliança militar Tratado de Segurança Coletiva, como Belarus, Quirguistão, Tadjiquistão e Uzbequistão.
São as primeiras evacuações do Afeganistão organizadas pela Rússia, cujo governo destacou que oferecerá voos de repatriamento a todos os cidadãos russos que desejarem sair do país.
A retirada sinaliza uma mudança de abordagem. Quando os talibãs retomaram Cabul, há dez dias, a Rússia optou inicialmente por uma atitude mais paciente, avaliando que o grupo estavam enviando sinais positivos para o mundo sobre o respeito das liberdades.
No entanto, em poucos dias, o Talibã, que ficou conhecido nos anos 1990 pela sua extrema brutalidade, logo passou a ser acusado de usar seus antigos métodos. Um porta-voz do Kremlin admitiu que a situação de segurança na capital afegã tem se deteriorado.
jps/ek (Lusa, AP, AFP)
A intervenção dos EUA no Afeganistão
Há 20 anos, após o 11 de Setembro, os EUA enviavam seus primeiros soldados ao país. Reveja os principais acontecimentos desde então: da operação Liberdade Duradoura à retomada do país pelos fundamentalistas do Talibã.
Foto: Evan Vucci/AP Photo/picture alliance
Operação Liberdade Duradoura
Em outubro de 2001, menos de um mês após aos ataques de 11 de Setembro, o presidente George W. Bush lança no Afeganistão a operação Liberdade Duradoura, depois que o regime Talibã se recusa a entregar Osama bin Laden. Em semanas, os americanos derrubam o Talibã, que ocupava o poder desde 1996. Cerca de mil soldados são enviados ao país em novembro, aumentando para 10 mil um ano depois.
Foto: picture-alliance/DoD/Newscom/US Army Photo
Talibã se reagrupa
A invasão do Iraque em 2003 se torna a maior preocupação dos EUA e desvia a atenção do Afeganistão. O Talibã e outros grupos islamistas se reagrupam em seus redutos no sul e leste do Afeganistão. Em 2008, Bush concorda em enviar soldados adicionais ao país em meio a pedidos por uma estratégia efetiva contra o Talibã. Em meados de 2008, há 48.500 soldados americanos no país.
Foto: picture alliance/Photoshot
Obama é eleito
Em sua campanha, Barack Obama promete encerrar as guerras no Iraque e no Afeganistão. Mas nos primeiros meses de sua presidência, em 2009, há um aumento no número de soldados no Afeganistão para cerca de 68 mil. Em dezembro, o número cresce ainda mais, para 100 mil, com o objetivo de conter o Talibã e fortalecer instituições afegãs.
Foto: AP
Morte de Bin Laden
Osama bin Laden, líder da Al Qaeda que esteve por trás dos ataques de 11 de Setembro, é morto em maio de 2011 em seu esconderijo, durante uma operação de forças especiais americanas no Paquistão.
Foto: picture-alliance/dpa
Acordo com Afeganistão
O Afeganistão assina em setembro de 2014 um acordo bilateral de segurança com os EUA e texto similar com a Otan: 12.500 soldados estrangeiros, dos quais 9.800 norte-americanos, permaneceriam no país em 2015. Mas a situação de segurança piora. Em meio à ressurgência do Talibã, Obama diminui a velocidade de retirada em 2016, afirmando que 8.400 soldados permaneceriam no Afeganistão.
Foto: Reuters
Bombardeio de hospital em Kunduz
Em outubro de 2015, no auge do combate entre insurgentes islâmicos e o Exército afegão, apoiado por forças da Otan, um ataque aéreo dos EUA atinge um hospital dirigido pela organização Médicos Sem Fronteiras na província de Kunduz. O ataque deixa 42 mortos, inclusive 24 pacientes e 14 membros da ONG.
Foto: Getty Images/AFP
"Mãe de todas as bombas"
Em abril de 2017, forças americanas atingem posições do "Estado Islâmico" (EI) no Afeganistão com a maior bomba não nuclear já usada pelo país em combate, matando 96 jihadistas. Em julho, é morto o novo líder do EI no país.
Foto: Reuters/U.S. Department of Defense
"Estamos diante de um impasse"
Em fevereiro de 2017, um relatório do governo dos EUA mostra que as perdas entre as forças de segurança afegãs subiram 35% em 2016 em relação ao ano anterior. Pouco depois, o general americano à frente das forças da Otan, John Nicholson (esq., ao lado do secretário da Defesa John Mattis), alerta que precisa de mais milhares de soldados: “Acredito que estamos diante de um impasse."
Foto: Reuters/J. Ernst
Trump anuncia nova estratégia
Em 21 de agosto de 2017, o presidente Donald Trump anuncia nova estratégia para o Afeganistão, fazendo da caça a terroristas a principal prioridade. Trump não especifica um aumento do número de soldados como esperado, mas diz que os objetivos incluem "obliterar" o Estado Islâmico, "esmagar" a Al Qaeda e impedir o Talibã de dominar o Afeganistão.
Foto: picture-alliance/Pool via CNP/MediaPunch/M. Wilson
EUA negociam com rebeldes
Em julho de 2018, sob o governo do presidente Donald Trump, os EUA entram em negociação com o Talibã, sem envolver o governo afegão eleito ou os parceiros da Otan.
Foto: picture-alliance/dpa/AP Photo/Qatar Ministry of Foreign Affairs
Trump cancela encontro com Talibã
Em setembro de 2019, o presidente Trump cancela na última hora uma reunião marcada em sigilo com líderes do Talibã e do Afeganistão, após o grupo islamista assumir a autoria de um ataque em Cabul que matou um soldado americano e outras 11 pessoas.
Foto: Getty Images/M. Wilson
EUA e Talibã assinam acordo de paz
Em fevereiro de 2020, sob o regime Trump, os governos dos EUA e do Afeganistão anunciam a retirada completa das tropas americanas e de outros países da Otan. O pacto assinado pelo negociador especial dos EUA para a paz, Zalmay Khalilzad, e pelo líder político talibã mulá Abdul Ghani Baradar, prevê que o número de militares estrangeiros seria reduzido gradualmente, ao longo de 14 meses.
Foto: AFP/G. Cacace
Biden anuncia retirada total das tropas
Em 14 de abril de 2021, o presidente Joe Biden comunica à população americana que a guerra mais longa do país terá fim, com as tropas dos EUA e da Otan se retirando inteiramente do Afeganistão até 11 de setembro, 20º aniversário dos ataques terroristas em Nova York.
Foto: Andrew Harnik/AFP/Getty Images
EUA e Otan iniciam retirada
EUA e Otan iniciam formalmente, em 1º de maio de 2021, a retirada de todas as suas tropas do Afeganistão. A previsão era retirar até 11 de setembro entre 2.500 e 3.500 soldados americanos e cerca de outros 7 mil soldados da Otan. Estima-se que os EUA tenham gasto mais de 2 trilhões de dólares no país, em 20 anos, de acordo com o projeto Costs of War da Universidade Brown.
Foto: Michael Kappeler/dpa/picture alliance
Americanos entregam base ao governo afegão
Em 2 de julho de 2021, tropas dos EUA partem da base aérea de Bagram, ponto focal da guerra, e entregam o local ao governo afegão. Permanecem no país asiático alguns poucos soldados, numa pequena base na capital Cabul.
Foto: Rahmat Gul/AP/picture alliance
Talibã toma capitais regionais
Aproveitando o vácuo deixado pela retirada das tropas de paz internacionais do Afeganistão, guerrilheiros do Talibã tomam, no inicio de agosto de 2021, capitais regionais como Sheberghan, Kunduz e Zaranj, num duro golpe para o governo afegão, que lutava para defender as cidades mais importantes da ofensiva do grupo extremista.
Foto: Abdullah Sahil/AP Photo/picture alliance
EUA retiram seus cidadãos do Afeganistão
Em meados de agosto, Estados Unidos e outros países começam a retirar seus cidadãos do Afeganistão, enquanto forças militares americanas se esforçam para proteger e manter funcionando o aeroporto de Cabul. Com todos os voos comerciais cancelados, milhares de afegãos invadem a pista do aeroporto desesperados, tentando embarcar em qualquer aeronave que fosse decolar.
Foto: Wakil Kohsar/AFP
Talibã ocupa palácio presidencial
O Talibã toma a capital Cabul, em 15 de agosto de 2021, dissolvendo o governo e estendendo seu controle sobre todo o Afeganistão. A capital era um dos últimos redutos ainda sob a autoridade do presidente Ashraf Ghani. Assim como ocorreu com dezenas de outras cidades, ele é tomada sem resistência efetiva das tropas governamentais. Ghani foge do país.
Foto: Zabi Karim/AP/picture alliance
Biden defende retirada das tropas
Um dia depois da tomada de Cabul, o presidente dos EUA, Joe Biden, defende a decisão de pôr fim à presença americana no Afeganistão e condena líderes e políticos afegãos que abandonaram o país, abrindo caminho para a tomada de poder pelo Talibã. Biden culpa ainda o ex-presidente Donald Trump, por ter fortalecido o grupo rebeldes e deixado os talibãs em sua melhor situação militar desde 2001.