1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

EUA relutam em invocar "responsabilidade de proteger" na luta contra o EI

Michael Knigge (fc) 17 de setembro de 2014

Mesmo que os crimes de guerra cometidos pelo "Estado Islâmico" justifiquem o uso da chamada "responsabilidade de proteger" para ações no Iraque, os EUA relutam.

Foto: picture alliance/abaca

A lista de atrocidades cometidas pelo "Estado Islâmico" (EI) no Iraque é longa e bem documentada. São execuções sumárias, perseguições de grupos religiosos que não estão de acordo com as regras estabelecidas pelo grupo jihadista, escravidão e violência sexual. Não é à toa que a Comissão de Direitos Humanos da ONU afirmou que os atos podem ser considerados crimes de guerra e contra a humanidade.

É claro também que o que está acontecendo no Iraque se enquadra dentro da chamada "responsabilidade de proteger" da ONU (R2P, em inglês). Esta se baseia em três pilares. O primeiro diz que os governos devem proteger os seus cidadãos. O segundo, que a comunidade internacional tem a responsabilidade de apoiar um governo que pediu ajuda para proteger seus cidadãos. O terceiro é o de proporcionar proteção aos cidadãos se um governo falha em fazê-lo, mesmo quando não houver pedido de ajuda.

Caso claro

"Estamos claramente no segundo pilar, no qual o governo do Iraque está solicitando ajuda de forças externas para combater o EI", avalia Michael Doyle, ex-secretário-geral adjunto da ONU e professor de política externa e direito na Universidade de Columbia. "É um caso muito simples."

O argumento para adotar a R2P no Iraque é certamente muito mais fácil se comparado ao conflito na Líbia, em 2011. Na época, a intervenção liderada pela Otan se apoiou numa resolução da ONU que se referia explicitamente à R2P: a proteção de civis dos ataques do regime do ditador Muammar Kadafi, que rejeitou qualquer interferência externa.

Em 2011, Obama defendeu a aprovação da ONU para a intervenção militar na LíbiaFoto: dapd

Diante desse respaldo legal pelo direito internacional e considerando que o governo do presidente Barack Obama – especialmente a sua embaixadora na ONU, Samantha Power, e a conselheira de Segurança Nacional, Susan Rice – sempre foi um forte defensor da R2P, é curioso vê-lo não se pronunciar a respeito desta vez.

Sem necessidade de resolução da ONU

Se o Iraque exerce sua responsabilidade de proteger seus cidadãos ao convidar os Estados Unidos e outros países para ajudá-lo no combate ao EI, "não é necessário uma resolução do Conselho de Segurança da ONU", afirma David Scheffer, o primeiro embaixador extraordinário americano para Assuntos de Crimes de Guerra e atualmente diretor do Centro Internacional de Direitos Humanos na Universidade Northwestern, em Chicago.

Não sendo necessário o voto da ONU, deveria ser ainda mais fácil para o governo de Obama invocar o conceito da R2P com base do direito internacional para a sua operação contra o EI no Iraque. Especialmente porque as atividades dos Estados Unidos e da coalizão em formação claramente se encaixam na definição da R2P, argumenta Doyle.

Ainda assim, apenas invocar a R2P sem a necessidade de votação poderia causar um mal-estar no Conselho de Segurança, em particular com a Rússia, que foi a principal opositora da intervenção na Líbia, alegando um uso excessivo da R2P.

"Eu não ficaria surpreso se ainda houvesse uma espécie de 'ressaca residual' da intervenção na Líbia, o que poderia impedir os esforços atuais para tentar usar a R2P como justificativa para a intervenção no Iraque", afirma o cientista político Christopher Chivvis, do think thank Rand Corporation.

Sem clima para ações no Iraque

"Eu acho que a razão de os governos não colocarem o rótulo específico [da R2P] sobre isso é que isso pode desencadear um debate legal sobre se [a situação] se encaixa rigorosamente nos quatro princípios dessa definição", afirma Scheffer.

Segundo especialistas, não é necessário um mandato da ONU para ajudar o Iraque contra o EIFoto: Reuters

O escopo da "responsabilidade de proteger" foi expressamente limitado a quatro casos pelo documento final da Assembleia Geral da ONU de setembro de 2005: a proteção de uma população contra genocídio, crimes de guerra, limpeza étnica e crimes contra a Humanidade.

O atual clima político nos EUA não é propício para um novo engajamento no Iraque, especialmente por razões humanitárias, como especificadas na R2P. Doyle lembra que acabar com a guerra no Iraque é parte fundamental da política externa de Obama. Portanto, para os democratas, "o engajamento no Iraque é politicamente problemático".

De acordo com Chivvis, é mais fácil usar o argumento da segurança nacional para a intervenção no Iraque do que foi no caso da Líbia. Para ele, no caso do EI há um elemento humanitário inquestionável, mas há também um elemento de segurança nacional muito claro. "Então eu acho que há uma tendência de tentar construir um argumento usando o elemento de segurança nacional e colocando o elemento humanitário numa espécie de posição secundária", avalia o especialista.

Apoio à R2P

Os especialistas elogiam Obama por finalmente ter encarado de frente a ameaça do EI e construído uma coalizão internacional para combater o grupo jihadista, mas Scheffer e Doyle dizem que gostariam de ver Obama defendendo o conceito de R2P – mesmo sem a necessidade legal de invocá-lo.

"Acho que isso ajudaria a construir o apoio necessário para derrotar o EI", afirma Scheffer. Já Doyle, que defende o uso da R2P, afirma que gostaria de ver o governo Obama fundamentando suas ações no Iraque com o princípio da R2P.

Pular a seção Mais sobre este assunto

Mais sobre este assunto

Mostrar mais conteúdo