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EUA x China: disputa comercial se acirra

23 de agosto de 2018

Entram em vigor as novas tarifas de importação impostas por Washington, já com a resposta imediata de Pequim. Os chineses, porém, se dividem sobre os possíveis efeitos dessas medidas, e muitos se preparam para o pior.

Carne americana à venda em supermercado na cidade chinesa de Guangzhou
Carne americana à venda em supermercado na cidade chinesa de GuangzhouFoto: picture-alliance/dpa/Li Zhihao

Os Estados Unidos impuseram nesta quinta-feira (23/08) tarifas de 25% sobre o equivalente a 16 bilhões de dólares em importações chinesas, acirrando a disputa comercial entre os dois países. A segunda rodada de medidas punitivas por parte de Washington fez com que Pequim respondesse novamente na mesma moeda.

Enquanto as medidas punitivas forem mantidas no nível atual, as duas maiores economias do globo serão capazes de absorver o impacto dos custos extras. Mas o que deverá acontecer se as tensões comerciais se agravarem ainda mais? Será que Pequim tem força suficiente para entrar numa guerra comercial aberta com seu maior parceiro no comércio internacional?

O Departamento de Comércio chinês anunciou que o país vai sobretaxar importações americanas de itens que vão desde o petróleo bruto a produtos de aço e tecnologia médica, medidas que entraram em vigor simultaneamente às dos EUA.

Em junho, porém, a reação imediata à primeira rodada do aumento das tarifas americanas – que atingiram 34 bilhões de dólares em produtos chineses – não chegou a ser consenso em Pequim.

"A resposta chinesa veio de modo bastante rápido. Eles pensaram 'faremos o mesmo, vamos manter a paridade', por assim dizer. Mas agora, parece que muitos estão pensando se esta foi de fato uma medida inteligente", afirma o cientista político da Universidade de Colônia Thomas Jäger à DW.

A população chinesa se preocupa com a maneira com que essa disputa comercial deverá se desenrolar. "Acho que os EUA ganharão a guerra comercial porque são mais avançados do que a China. Apesar da enorme população chinesa, a vantagem está do lado deles quando a luta começar", diz a treinadora esportiva Lin Zaishi, de 25 anos, em Fuzhou, no litoral sudeste do país.

O gerente financeiro Chen Jun, de 40 anos, analisa as perspectivas de ambos os lados. "Não acho que nenhuma das partes tem culpa, porque estão defendendo seus interesses nacionais. O governo [do presidente americano Donald] Trump leva em conta seus próprios interesses."

Um terceiro entrevistado em Fuzhou chegou a criticar a postura chinesa. "O mundo não pode viver sem os EUA. Eles fizeram muito pela paz mundial, sacrificaram muitos de seus soldados e financiaram a ONU com muito dinheiro."

"Mesmo que China tivesse os mesmos recursos que os EUA, nosso país não vai assumir a mesma responsabilidade, porque os chineses são egoístas. Sou chinês, mas digo a verdade", afirmou o homem, que preferiu não se identificar.

Durante meses, o conflito comercial vem sendo um tema dominante na China. Logo após o início da guerra de palavras com Trump, a imprensa chinesa destacava os efeitos negativos de suas tarifas para a economia americana. A mídia controlada pelo Estado afirmava que os negócios, consumidores e trabalhadores americanos sairiam perdendo. "Levante uma pedra apenas para derrubá-la em seu próprio pé", diz um provérbio chinês.

Os líderes chineses alertaram que se a disputa comercial se agravar, a economia americana será a maior prejudicada. Há poucos dias, o tabloide pró-governo Global Times chegou a afirmar que "o conflito comercial atingirá de modo mais forte as famílias de classe média e os mais pobres [dos EUA]."

De qualquer modo, ao mesmo tempo em que especulam sobre os possíveis efeitos, os chineses parecem se preparar para o pior. Apesar das regulamentações rígidas, muitos chineses tentam converter seus bens em yuan em dólares americanos, euros ou ouro.

Alguns casos como o de um gestor de fundos que tentou deixar a China continental com vários quilos de barras de ouro alimentam a paranoia nas redes sociais chinesas.

Os tomadores de decisões em Pequim já acionaram os freios de emergência e instruíram os bancos a permitir saques em moeda estrangeira em valores de até 5 mil dólares sem a necessidade de verificações. Em outros casos, os clientes precisam justificar o motivo pelo qual necessitam urgentemente de tantos dólares. Alguns relatos sugerem que essas medidas foram adotadas de modo sigiloso.

"A guerra comercial certamente gerou medo na população", afirma Huang Weiping da Universidade de Renmin, em Pequim, que considera as tarifas americanas essencialmente como uma forma de guerra psicológica. "Os efeitos psicológicos se sobrepõem aos efeitos reais. O medo da população é real, mas o impacto verdadeiro na economia é mínimo", afirma a professora de economia.

Segundo Huang, o volume das tarifas impostas por Trump é, até o momento, menor do que o volume anual de negócios imobiliários em uma cidade de médio porte da China. "Não é uma questão financeira. O medo entre a população é o maior problema para a economia chinesa", afirma.

Ren Zeping, um dos mais conhecidos analistas de negócios da China e economista-chefe do instituto de pesquisas do grupo imobiliário Evergrande, acredita, assim como muitos chineses, que agora não é a hora para um conflito comercial de maiores proporções com os americanos.

"Antes da guerra comercial, havia uma tendência na China para uma autoestima exagerada e uma autoconfiança inflada. O conflito atual nada fez além de trazer um retorno á razão", diz Ren, acrescentando que o país deve reconhecer que ainda tem muito que se atualizar em temos de inovação, construção de instalações de alto nível, serviços financeiros, educação, tecnologias essenciais e no setor militar.

Os líderes da China devem se dar conta de que o agravamento do conflito comercial, assim com a crescente resistência da Europa em deixar que os chineses tomem o controle de suas empresas, são sinais de alerta de que o país está sendo ambicioso demais, alerta Jäger, da Universidade de Colônia.

Os comentários do cientista político tinham como alvo a estratégia "Made in China 2025", através da qual Pequim busca desafiar o domínio dos EUA e da Europa na vanguarda da indústria de ponta.

"É claro que tudo isso terá mudado, no máximo, até o centenário da República Popular da China, em outubro de 2049, quando o país não apenas estará em pé de igualdade com os EUA, mas também dominará as tecnologias essenciais da economia global", disse Jäger.

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