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Europa em chamas: quatro motivos por quê

Stuart Braun
8 de agosto de 2021

Com quase metade do verão europeu transcorrido, a área queimada por incêndios florestais que devastam os Bálcãs, Itália e sudeste do Mediterrâneo já supera as médias anuais. Cientistas culpam a mudança climática.

Fazendeiros na Turquia tentam desesperadamente conduzir suas ovelhas para segurança no distrito de Marmaris
Fazendeiros tentam conduzir suas ovelhas para segurança no distrito de Marmaris, TurquiaFoto: YASIN AKGUL/AFP

Focos de incêndios florestais – provocados naturalmente por raios ou por incendiários – eclodiram em todo o sul da Europa em julho, espalhando-se em grande escala, devido à seca e ao calor extremo na região do Mediterrâneo.

Cientistas não têm dúvidas de que a mudança climática é o principal propulsor de mais uma temporada extrema de incêndios. Eles também entendem que a adaptação ao clima em países vulneráveis é inadequada para lidar com incêndios florestais, cuja tendência é piorar em frequência e intensidade.

A DW analisa por que os países mediterrâneos e dos Bálcãs são tão sujeitos a incêndios florestais e investiga as consequências das mudanças climáticas.

Por que a região do Mediterrâneo está em chamas?

Os incêndios florestais de verão são muitas vezes parte natural e necessária da vida das florestas mediterrâneas. Na década anterior a 2016, cerca de 40 mil incêndios florestais queimaram anualmente 457 mil hectares, nos cinco países do sul da Europa em que são mais prevalentes: Espanha, França, Portugal, Itália e Grécia.

Segundo cientistas, o fogo também pode gerar renovação e fomentar a biodiversidade nessas regiões. De fato, as comunidades locais aprenderam a lidar melhor com a média anual de incêndios em regiões quentes e áridas do sul europeu, com estratégias mais sofisticadas de prevenção de incêndios, que levaram a um declínio geral no número e no tamanho dos focos desde 1980.

Mas, com frequência exagerada nos últimos anos, os incêndios têm se disseminado muito além do tamanho e intensidade habituais. Fogos devastadores ceifaram em 2017 e 2018 centenas de vidas, numa área que se estende da Turquia à Espanha, enquanto países no centro e no norte da Europa – incluindo a Suécia – também registraram incêndios.

Esses eventos sem precedentes estão inevitavelmente ligados a secas e ondas de calor extremas. 

Estátua da deusa Atena, no subúrbio de Varibobi, na capital grega, testemunha as chamas Foto: Giorgos Moutafis/REUTERS

O que está provocando os incêndios?

Julho de 2021 foi o segundo mês mais quente já registrado na Europa, e o terceiro em escala global. O sul do continente tem sido o foco deste calor extremo – na primeira semana de agosto, por exemplo, as temperaturas na Grécia atingiram o pico de 47 ºC.

A Grécia e a vizinha Turquia estão em meio a uma onda de calor que pode ser a mais extrema em 30 anos, e invoca a terrível temporada de incêndios de 1987, que matou mais de 1.500, somente em território grego.

Na Turquia, quase 200 incêndios distintos assolaram o país em pouco mais de uma semana. As chamas forçaram a retirada de alguns residentes e turistas na costa do Mar Egeu, por segurança.

Embora a ação de incendiários ou causas naturais, como raios, sejam igualmente responsáveis pela eclosão de incêndios, o calor extremo impulsionou a intensidade dos focos e é o verdadeiro culpado pela destruição causada nas regiões atingidas. Este é o motivo por que, até 5 de agosto, pelo menos 55% mais área foi queimada em toda a Europa do que a média dos 12 anos anteriores.

    

Esse fato é agravado pela gestão florestal desatualizada e, às vezes, até mesmo pela superproteção das reservas naturais.

Um incêndio atingiu em 1º de agosto a Pineta Dannunziana, uma floresta urbana de pinheiros na cidade italiana de Pescara, e obrigou a retirada de 800 residentes. Mas, como área declarada reserva natural protegida, ela não está sujeita a cuidados florestais, como limpeza regular de vegetação rasteira ou queimadas controladas. "A vegetação rasteira queimou muito rapidamente", comentou o prefeito de Pescara, Carlo Masci, na época.

Enquanto isso, as políticas existentes de supressão de incêndios não levam em consideração o impacto das mudanças climáticas na inflamabilidade de áreas onde terras selvagens (que por vezes crescem sobre áreas agrícolas abandonadas) se encontram com centros urbanos em expansão. Isso ficou evidenciado nos subúrbios de Atenas em chamas, neste início de agosto.

"Na maioria das regiões do Mediterrâneo, as políticas atuais de gestão de incêndios florestais costumam centrar-se muito na supressão e não são mais adequadas à mudança global em curso", escreveram os autores do estudo Compreendendo as mudanças climáticas nos incêndios no sul da Europa, publicado em 2021. 

Chamas dos incêndios florestais na Turquia chegaram até a costa do Mediterrâneo e do EgeuFoto: Emre Tazegul/AP/dpa/picture alliance

O que o clima tem a ver com isso?

A área queimada na região do Mediterrâneo diminuiu ligeiramente nos últimos 40 anos, mas isso se deve principalmente a esforços mais eficazes de controle de incêndios, de acordo com a Agência Europeia do Ambiente (AEA).

A mudança climática aumenta a frequência e a gravidade das queimadas atreladas às condições climáticas, conforme testemunhado durante os incêndios florestais sem precedentes dos últimos anos, na Austrália e na Califórnia. E, inevitavelmente, as mudanças climáticas aumentaram o risco de incêndios florestais em toda a Europa, incluindo as regiões central e norte, que não são tipicamente propensas a esse tipo de desastre.     

Os atuais recordes de secas e ondas de calor na região do Mediterrâneo ecoam os eventos de 2018, quando foi registrado o maior número de países afetados por incêndios em um ano, segundo dados da AEA.

Na Grécia, mais de 100 morreram nos chamados incêndios de Ática de 2018 – o segundo mais mortal do século, atrás somente dos do "Sábado Negro", de 2009, na Austrália. "Projeta-se uma expansão das áreas propensas e temporadas mais longas de incêndios na maioria das regiões europeias", prevê a AEA.

Apesar de pactos ambientais como o Acordo Verde Europeu e o Acordo Climático de Paris, as emissões de dióxido de carbono não estão diminuindo com rapidez suficiente para limitar as consequências da mudança climática.

"Eles elaboram planos, definem metas, mas não agem de verdade", critica Mojib Latif, em entrevista à DW, cientista climático do Centro para Pesquisa Oceânica do Instituto Helmholtz. "Desde 1990, as emissões globais de CO2 aumentaram 60%." Segundo o pesquisador, as emissões aumentarão novamente em 2021, após a desaceleração ditada pela pandemia no ano anterior.

Bombeiros em Varibobi, subúrbio ao norte de AtenasFoto: Eurokinissi/ZUMA Wire/imago images

Quais as repercussões da mudança climática global?

Globalmente, os incêndios florestais são responsáveis por emissões significativas de gases de efeito estufa e também por 5% a 8% das 3,3 milhões de mortes prematuras anuais causadas por má qualidade do ar, segundo dados da organização climática Carbon Brief.

Mas as emissões carbônicas dos incêndios florestais diminuíram nas últimas décadas, o que, novamente, se deve à melhor prevenção de incêndios. O problema remanescente é a gravidade ou a intensidade do fogo, que possui um efeito de maior alcance na captura do carbono, uma vez que as florestas são incineradas ao ponto de não voltar a crescer.

Em 2017, as emissões de CO2 de incêndios florestais extremos em todo o sudoeste da Europa – precisamente, na Península Ibérica, Sul de França e Itália – foram as mais elevadas desde pelo menos 2003, com aproximadamente 37 teragramas de CO2.

Contextualizando: os incêndios florestais excepcionalmente abrangentes na Península Ibérica e na costa do Mediterrâneo em 2003 foram responsáveis pelo mesmo nível de emissões antropogênicas emitidas em toda a Europa Ocidental no mesmo ano.

E se a intensidade dos incêndios florestais exterminar uma cobertura florestal significativa em 2021, a perda resultante de vegetação captadora de carbono poderia ser ainda mais devastadora para o clima.

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