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PolíticaFrança

Eventual vitória eleitoral de Le Pen resultaria em "Frexit"?

20 de abril de 2022

Programa econômico de Macron para um 2º mandato é digno de críticas. Mas os planos da candidata ultradireitista Marine Le Pen, além de impraticáveis, prenunciam um quadro crítico para a França, advertem economistas.

Candidata presidencial francesa Marine Le Pen
Marine Le Pen promete medidas protecionistas que podem resultar na expulsão da França da União EuropeiaFoto: Julien De Rosa/AFP

No pleito presidencial da França de 2017, o programa econômico acabou sendo um dos pontos mais fracos da candidata ultradireitista Marine Le Pen. Como acontece novamente agora, no segundo turno ela enfrentou o centrista Emmanuel Macron, atual presidente.

Durante um debate televisivo cinco anos atrás, poucos dias antes do segundo turno, Macron classificou os planos de Le Pen de tirar a França da zona do Euro e renegociar os tratados da União Europeia como "letais para o poder aquisitivo e a competitividade". Le Pen teve dificuldade para rebater essas críticas e por diversas vezes se perdeu nos numerosos dossiês que empilhara diante de si, citando várias informações erradas.

Desta vez, a candidata populista de direita renunciou oficialmente às intenções de abandonar a moeda comum europeia. No entanto, economistas afirmam que implementar o manifesto dela acabaria dando nesse mesmo resultado, e desencadeando uma crise financeira internacional.

Também desta vez, Le Pen se apresenta como "a candidata do poder aquisitivo", e promete reduzir de 20% para 5,5% o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) sobre produtos de energia como combustível e eliminar o imposto para certos artigos básicos.

Perda de poder aquisitivo entre principais preocupações do eleitorado francêsFoto: Lafargue Raphael/abacca/picture alliance

Estagflação e desemprego em massa

Philippe Crevel, diretor do think tank parisiense Cercle de l'Épargne, dedicado à poupança, aposentadoria e previdência, considera tais medidas contraproducentes e temerárias: "Os preços cairiam de início, mas isso impulsionaria a demanda pelo consumidor e, no fim das contas, faria subir os preços, pois o mercado não disporia, de repente, de mais produtos."

O macroeconomista explica que só um aumento da produtividade – ou seja, mais produtos gerados por cada insumo, como a mão de obra – seria capaz de incrementar o poder aquisitivo da população, com o dinheiro extra sendo gasto em mais bens que se tornariam disponíveis.

A candidata ultradireitista promete, ainda, estimular salários mais altos, liberando os empregadores das taxas sobre os aumentos. "Mas também isso causaria inflação: para equilibrar os aumentos salariais, as companhias – especialmente diante do custo crescente dos recursos, também devido à guerra na Ucrânia – aumentariam os preços dos produtos", explica Crevel.

No total, o economista acredita que as medidas propostas resultariam em estagflação, uma combinação de crescimento estagnado e inflação alta: "Seria semelhante ao que aconteceu após o choque do petróleo da década de 1970: veríamos desemprego em massa, atingindo primeiro os operários."

Programa "absurdo" e "profundamente imoral"

Seu colega Henri Sterdyniak, do Observatoire Français des Conjonctures Économiques, de tendência esquerdista, concorda ser improvável que o "absurdo" programa de Le Pen vá ajudar os menos afortunados.

"Ela planeja desmontar as turbinas eólicas da França, entregando aos franceses toda a verba de subvenção. E os cidadãos abaixo dos 30 anos seriam isentos de impostos. Mas por que jovens que ganham bem deixariam de contribuir? Nada disso faz sentido."

"Além disso, as medidas dela são profundamente imorais: os estrangeiros teriam que pagar mais, enquanto os franceses teriam prioridade em relação a empregos, moradia e benefícios sociais", afirma Sterdyniak.

Contudo, ele também critica o programa do presidente em exercício por motivos semelhantes, que promete triplicar o assim chamado "prêmio Macron", um bônus de fim de ano de mil euros, instituído em 2018, isento de impostos e de encargos para o empregador. "É um jogo perigoso, e praticamente incompatível com a promessa de aumentar em mais de 100 euros a aposentadoria mínima, para 1.100 euros", adverte o economista.

Emmanuel Macron procura mostrar-se mais atento às demandas da populaçãoFoto: Ludovic Marin/AFP

Macron promete flexibilizar – sempre de olho no mercado

No geral, o programa de Macron contém menos medidas concretas e é bem menos detalhado que o de sua adversária. Ele basicamente se compromete a continuar fazendo o que tem feito: reformas favoráveis ao mercado. Além de liberalizar ainda mais o mercado de trabalho, reduzir os impostos para empresas, pretende aumentar a idade de aposentadoria de 62 para 65 anos.

Para o economista Crevel, uma reforma da aposentadoria faz todo sentido, diante do aumento da dívida pública, "no entanto, deverá ser cada vez mais difícil levar esses planos adiante, já que muitos franceses se opõem". O primeiro mandato de Macron foi perturbado por numerosas manifestações, como as dos "coletes amarelos", que bloquearam o país por meses, exigindo mais justiça social.

Na atual campanha eleitoral, ele já começou a diluir seus planos, sobretudo para convencer o 22% do eleitorado que votou no candidato populista de esquerda Jean-Luc Mélenchon, terceiro colocado no primeiro turno. Assim, Macron anunciou que poderá baixar a idade de aposentadoria para 64 anos e submeter as propostas a um referendo, além de incluir mais medidas ecológicas em seu programa.

Entre os que saúdam tais mudanças está Stanislas Hannoun, diretor da campanha por justiça fiscal e contra a desigualdade da confederação de organizações de caridade Oxfam France.

O grupo estudou os manifestos de ambos os candidatos à busca de conteúdo referente a justiça social, ecológica e de gênero, e "Macron teve mau desempenho, embora Le Pen esteja pior ainda": "O presidente diz que é progressista. Ele devia transformar as palavras em ação, por exemplo isentando de impostos as pensões alimentícias", sugere Hannoun.

"Frexit" à vista com Le Pen?

Por sua vez, o Institut Montaigne, um think tank parisiense ligado à classe patronal, também examinou os programas dos candidatos presidenciais, mas do ponto de vista da sustentabilidade fiscal.

"Ambos aumentariam a carga sobre o orçamento público, mas os planos de Le Pen resultariam, no fim das contas, num gasto extra de aproximadamente 101 bilhões de euros, contra os 44 bilhões de custo total do programa de Macron", explicou à DW a funcionária do instituto Lisa Thomas-Darbois.

"Mais ainda: muitas das propostas de Le Pen infringem a lei francesa e os compromissos internacionais do país, o que minaria a confiança dos investidores." Le Pen promete criar um novo fundo para nacionalizar setores estratégicos como as autoestradas; nas concorrências públicas, as empresas nacionais teriam prioridade; e produtos franceses se beneficiariam de um princípio de "preferência nacional".

"Todas essas medidas protecionistas infringiriam a legislação da União Europeia. A 'preferência nacional', por exemplo, implicaria o governo impor taxas de importação", explica Philippe Crevel, acrescentando que tais planos redundariam na saída da França da comunidade europeia: o "Frexit".

"Le Pen parece estar contando que a UE acabará chutando a França para fora, uma vez que o país estaria violando demasiadas normas europeias e criando instabilidade demais", opina o macroeconomista.

E um "Frexit" teria repercussões internacionais: "Diversos bancos da França são sistêmicos à zona do Euro, e sua saída do sistema do Euro causaria ondas de repercussão em âmbito mundial, desencadeando uma crise financeira internacional."

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