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Evo Morales diz que polícia tem ordem para prendê-lo

11 de novembro de 2019

Após renunciar, ex-presidente afirma que "grupos violentos" assaltaram sua casa e diz ser alvo de mandado de prisão, o que a polícia nega. Lula e esquerda latino-americana acusam golpe. Bolsonaro defende voto impresso.

Ex-presidente boliviano Evo Morales
"Os golpistas destroem o Estado de direito", afirmou o ex-presidente boliviano Evo Morales Foto: picture-alliance/dpa/J. Karita

Após anunciar sua renúncia à presidência da Bolívia neste domingo (10/11), pressionado por militares e policiais, Evo Morales denunciou haver um "mandado de prisão ilegal" contra ele e que "grupos violentos" assaltaram sua casa, em meio ao que chamou de "golpe" ao Estado de direito.

"Denuncio ao mundo e ao povo boliviano que um policial anunciou publicamente que foi instruído a executar um mandado de prisão ilegal contra minha pessoa; da mesma forma, grupos violentos assaltaram minha casa. Os golpistas destroem o Estado de direito", escreveu ele no Twitter.

A polícia boliviana, por sua vez, negou que exista uma ordem de prisão contra o agora ex-presidente, e esclareceu que é o Ministério Público, e não a polícia, que emite mandados de detenção. 

"Quero informar à população boliviana que não existe um mandado de prisão contra funcionários do Estado como Evo Morales e seus ministros", disse o comandante da Polícia Nacional, Yuri Calderón, ao canal privado Unitel.

A mensagem de Morales sobre a ordem de prisão foi publicada depois de o líder opositor Luis Fernando Camacho também ter garantido nas redes sociais que havia um mandado para deter Morales.

"Confirmado! Mandado de prisão contra Evo Morales! A polícia e os militares o estão procurando em Chapare, lugar onde se escondeu", escreveu Camacho, um dos líderes dos protestos contra o ex-mandatário e que chegou a pedir intervenção militar contra Morales. "Os militares lhe tiraram o avião presidencial, e ele está escondido em Chapare, vão em frente!"

Morales ficou recluso neste domingo na zona cocalera de Chapare, seu berço político, para anunciar sua renúncia, depois de perder o apoio dos militares e da polícia. O ex-presidente chegou à tarde a bordo do avião presidencial ao aeroporto de Chimoré, que serve Chapare, acompanhado do vice-presidente, Álvaro García Linera, que também renunciou ao cargo e à presidência do Congresso.

O governo do México ofereceu acolhida a Morales, caso ele peça asilo político, e informou que sua embaixada em La Paz já abriga vinte integrantes do Legislativo e do Executivo bolivianos. A afirmação foi feita pelo ministro do Exterior mexicano, Marcelo Ebrard, que acusou haver um golpe de Estado na Bolívia e disse através das mídias sociais estar ocorrendo uma "operação militar" no país.

Horas depois do anúncio, Ebrard disse que Morales aceitou o asilo oferecido pelo México. "Informo que há pouco recebi uma ligação do presidente Evo Morales, mediante a qual respondeu ao nosso convite e solicitou verbal e formalmente o asilo em nosso país", confirmou o ministro.

Evo Morales anunciou sua renúncia neste domingo, após quase 14 anos no poder e horas após ter convocado novas eleições, numa declaração transmitida pela televisão do país. Antes, os chefes das Forças Armadas e da polícia exigiram que ele deixasse o cargo, para que a estabilidade e a paz pudessem regressar ao país.

Reeleito em 20 de outubro para um quarto mandato, Morales estava sob suspeita de fraude eleitoral. A Bolívia atravessa uma crise social e política, em que foram registrados três mortos e mais de 400 feridos em confrontos.

Segundo o comandante da Polícia Nacional, Yuri Calderón, 25 mandados de prisão foram emitidos contra presidentes e membros dos diferentes tribunais eleitorais departamentais.

Entre os presos está María Eugenia Choque, ex-presidente do Supremo Tribunal Eleitoral. Ela renunciara a seu cargo horas antes da renúncia de Morales. Também foi preso Antonio Costas, que renunciou à vice-presidência do órgão eleitoral pouco antes do final da apuração das eleições de 20 de outubro. Ambos foram exibidos algemados pela polícia durante uma entrevista coletiva.

Em um vídeo divulgado na noite de domingo, o opositor Camacho insistiu que a oposição boliviana pretende levar Morales e outros membros de seu governo a julgamento por responsabilidade nas mortes durante os protestos.

"Comecemos julgamentos aos delinquentes do partido do governo, colocando-os presos. Amanhã [segunda] começamos os processos", declarou ele, falando ainda na necessidade de se fazer "justiça divina".

Distúrbios e incerteza

Na noite de domingo, logo após a renúncia de Morales, a Bolívia virou palco de uma série de incêndios, saques e ataques a residências, incluindo a do próprio Morales. A capital La Paz e as cidades de El Alto e Cochabamba, entre outras das maiores do país, registraram vários casos de distúrbios.

Uma série de renúncias ministeriais se seguiu ao anúncio de Morales, levantando a questão sobre quem deve assumir o comando do governo, já que o vice-presidente Álvaro Garcia Linera também renunciou.

Segundo a Constituição, o poder passa para o presidente do Senado e o presidente da câmara baixa do Congresso, nessa ordem. Mas eles também renunciaram.

Uma senadora da oposição, Jeanine Áñez, disse no domingo que, por ser segunda vice-presidente do Senado, tem o direito de assumir a presidência da Bolívia de forma interina, pelo menos até a realização de novas eleições.

De maioria governista, o Parlamento boliviano deve se pronunciar sobre a sucessão. Nesta segunda-feira, os parlamentares receberam a carta de renúncia de Morales à Presidência, na qual ele disse estar determinado a evitar a violência e expressa seu desejo de que a paz social retorne ao país, do qual foi chefe de governo por 13 anos e nove meses.

"Minha responsabilidade como presidente indígena e de todos os bolivianos é evitar que os golpistas continuem perseguindo meus irmãos e irmãs líderes sindicais", afirmou o agora ex-presidente no texto.

Ainda se espera que a legislatura convoque uma sessão extraordinária para eleger um sucessor, que poderia ser Áñez. A senadora é a principal opção na cadeia de sucessão constitucional após as renúncias. Ela anunciou que pretende convocar eleições para que até 22 de janeiro haja um presidente eleito.

O governo da Colômbia convocou uma reunião de emergência do conselho permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) para discutir a situação no país.

Esquerda latino-americana fala em golpe

Além do México, lideranças de esquerda de países latino-americanos se uniram para denunciar um golpe de Estado na Bolívia, entre eles o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No Twitter, ele disse ser "lamentável que a América Latina tenha uma elite econômica que não sabe conviver com a democracia e a inclusão social dos mais pobres".

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, pediu uma mobilização de movimentos políticos e sociais "para exigir a preservação da vida dos povos nativos da Bolívia, vítimas do racismo". O ministro do Exterior de Cuba, Bruno Rodríguez, descreveu Morales como "um protagonista e um símbolo dos direitos dos povos indígenas de nossas Américas".

O presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, disse que um golpe foi realizado "por ações conjuntas de civis violentos, policiais que se confinaram em seus quartéis e a passividade do Exército".

Enquanto isso, a ONU afirmou, através de comunicado, que o secretário-geral António Guterres está "profundamente preocupado" com os acontecimentos na Bolívia e que ele "pede a todos os envolvidos que se abstenham de violência, reduzam a tensão e exerçam o máximo de contenção".

O presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, defendeu o voto impresso ao comentar a crise na Bolívia. "Denúncias de fraudes nas eleições culminaram na renúncia do presidente Evo Morales. A lição que fica para nós é a necessidade, em nome da democracia e transparência, da contagem de votos que possam ser auditados. O voto impresso é sinal de clareza para o Brasil!", escreveu.

MD/afp/lusa/efe

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