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Ex-embaixador alemão elogia governo Lula

Geraldo Hoffmann22 de janeiro de 2005

Uwe Kaestner, embaixador da Alemanha no Brasil de 2001 a 2004, diz que Lula pode entrar para a história como presidente voltado para o social e que aumentou autoconfiança do país no cenário internacional.

Kaestner atuou em Brasília de 2001 a 2004Foto: DW

O ex-embaixador alemão no Brasil, Uwe Kaestner, fez um balanço positivo dos dois primeiros anos de governo de Luiz Inácio Lula da Silva, dos quais acompanhou 18 meses diretamente em Brasília. “Lula pode entrar para a história como um governante que priorizou o social, mas ainda tem muito a fazer, para que a falta de segurança pública não indigne a população e assuste os investidores“, disse à DW-WORLD.

Em palestra realizada em Bonn, o presidente recém-eleito da Sociedade Brasil-Alemanha (DBG) impressionou a platéia reunida pela DBG e o Ibero Club no Departamento de Imprensa do governo alemão, com uma análise detalhada do que chamou de “primeiro tempo de Lula”.

Segundo ele, Lula assumiu a presidência sob o impacto da luta internacional contra o terrorismo, desencadeada pelo 11 de setembro, e da crise argentina de 2002. “Nem mesmo o crédito de 30 bilhões de dólares concedido pelo FMI, graças ao empenho de seu diretor administrativo e hoje presidente da Alemanha, Horst Köhler, foi capaz de melhorar o humor dos mercados financeiros. Por isso, a prioridade absoluta do governo foi reconquistar a confiança nacional e internacional. Isso Lula conseguiu fazer, com a formação de uma equipe econômica confiável, a contenção de gastos públicos e a elevação drástica dos juros. Mas o preço pago foi alto: estagnação do consumo interno e insatisfação do eleitorado”, disse Kaestner.

Fome Zero e globalização

Lula em encontro com o chanceler federal alemão Gerhard SchröderFoto: BPA

Ele falou também do programa Fome Zero (hoje chamado Bolsa Família), que virou marca do governo Lula no exterior e que, segundo dados oficiais, atende 5,5 milhões de lares. “Isso é pouco diante da enorme pobreza existente no país, mas já foi recompensado nas eleições municipais de 2004. O PT ganhou nas regiões de baixa renda, porém a paciência do grande número de pobres, eleitores cativos de Lula, não é ilimitada. Ele tem um longo caminho pela frente no segundo tempo“, disse.

Segundo Kaestner, “o grande mérito do programa Fome Zero foi desencadear, através do Fórum Social Mundial de Porto Alegre, uma discussão internacional sobre a desigualdade na globalização da economia. Desde 2003, os Fóruns Econômicos Mundiais são obrigados a discutir a liberação de mais recursos para os países em desenvolvimento. Lula ocupou internacionalmente um nicho, ao focalizar os perdedores da globalização”.

FHC x Lula

Kästner: "Poder aquisitivo dos operários caiu no governo FHC"Foto: AP

Um outro desafio social – continuou Kaestner – é a questão da reforma agrária. “Muitos governos brasileiros já iniciaram uma reforma agrária, mas faltou sustentabilidade em suas propostas. Na melhor das hipóteses, os assentados desenvolveram uma agricultura de subsistência, mas não podiam participar do mercado exportador. Foi assim no governo FHC, que até assentou muitas famílias. O governo Lula quer mudar isso, adotando um modelo alemão, o do incentivo à formação de cooperativas”, disse.

Como foi embaixador no Brasil de novembro de 2001 a junho de 2004, Kaestner acompanhou a transição de Fernando Henrique Cardoso para Lula, que considerou “exemplar”, e fez ainda outras comparações entre os dois governos. “No governo de FHC, o poder aquisitivo real dos operários caiu, um quadro que Lula quer reverter. Lula não faz uma política para os ricos, mas é claro que os exportadores saem beneficiados. Depende agora do setor exportador gerar mais empregos e melhorar as condições de vida nas fazendas, e que os sindicatos tenham a força para conquistar melhores salários.”

Na opinião do ex-embaixador alemão, “o maior progresso alcançado por Lula na tentativa de diminuir a desigualdade social é arrecadar mais impostos dos ricos. Mas esses recursos têm que ser repassados aos setores menos favorecidos, por exemplo, através de uma melhor educação pública”.

Brasileiros mais autoconfiantes

É na política externa, segundo Kaestner, que o governo Lula conseguiu o maior reconhecimento até agora. “Ele ajudou a estabilizar a situação na Argentina e a resolver crises em outros países vizinhos, como Bolívia, Colômbia, Venezuela, Paraguai e Uruguai. A posição de Lula, a favor de uma solução no âmbito da ONU para o Iraque, aumentou a autoconfiança dos brasileiros diante dos Estados Unidos. O país comanda a missão de paz da ONU no Haiti e reclama com boas razões um assento permanente no Conselho de Segurança.”

Porva de fogo: Brasil comanda missão de paz da ONU no HaitiFoto: AP

Kaestner disse também que "ainda há regiões do mundo em que o governo brasileiro poderia ser mais ativo na busca de soluções para conflitos, por exemplo, no Oriente Médio. Afinal, o Brasil é um país onde árabes e judeus convivem pacificamente".

Quanto às negociações do acordo UE-Mercosul, que terão continuidade no dia 31 de janeiro, em Luxemburgo, Kaestner mostrou-se otimista. “O avanços já são maiores do que nas negociações do Brasil com a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). O Itamaraty acha que, se esperar, pode obter mais concessões, mas há resistências a vencer na UE. Os europeus precisam decidir até onde podem continuar subvencionando sua agricultura. A Alemanha é claramente a favor de um acordo com concessões duradouras por parte da UE”, disse.

Amizade de longa data

Lula com o então presidente alemão Johannes Rau, em 2003Foto: BPA

As relações bilaterias nos dois primeiros anos de governo Lula tiveram uma boa estrela, disse Kaestner. Foram festejados os 180 anos da imigração alemã no Brasil, 175 anos do primeiro acordo teuto-brasileiro, 150 anos de cerveja alemã em solo brasileiro, 50 anos de Volkswagen e 40 anos de cooperação econômica.

Kaestner ressaltou também que Lula tem antigos aliados na Alemanha. Durante a ditadura militar, ele recebeu a visita do então chanceler alemão Helmut Schmidt e do governador da Renânia do Norte Westfália, Johannes Rau (mais tarde presidente alemão), e como líder sindical e partidário foi apoiado pela Fundação Friedrich Ebert. Por isso, Lula fez sua primeira viagem presidencial fora da América Latina à Alemanha, onde, como diz Kaestner, "abriu caminho para a futura cooperação no palco internacional".

No todo, o balanço feito por Kaestner dos dois primeiros anos de governo Lula foi positivo, salpicado até de elogios, mas ele advertiu: “Como no futebol, vem aí o segundo tempo e, com isso, a sentença final caberá ao eleitorado brasileiro em 2006. Daí será decidido se haverá um jogo de volta, um segundo período de governo”.

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