1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Execução de clérigo ameaça abrir nova crise no Oriente Médio

3 de janeiro de 2016

Arábia Saudita executa 47 pessoas por terrorismo, entre elas um famoso clérigo xiita. Iraque alerta para desestabilização na região, Irã fala em vingança e Riad convoca diplomata iraniano. Embaixada em Teerã é saqueada.

Jemen Protest Hinrichtung Scheich Nimr al-Nimr in Saudi Arabien Archiv
Foto: picture alliance/dpa/Y. Arhab

Após a Arábia Saudita ter executado 47 pessoas ligadas com terrorismo, entre elas o proeminente clérigo xiita Nimr Baqir al-Nimr, uma nova crise ameaça se abrir no Oriente Médio. Autoridades de Irã e Iraque, países de maioria xiita, condenaram veemente as execuções. Riad respondeu com convocação de embaixador iraniano e viu sua embaixada ser invadida em Teerã.

A maioria das pessoas executadas neste sábado (02/01) era de nacionalidade saudita, com exceção de um egípcio e um chadiano. As acusações incluem a adoção e promoção da ideologia takfiri (extremismo sunita), assassinato, sequestro, fabricação de explosivos e posse de armas. Dos 47 executados, a maior parte foi condenada por ataques da Al Qaeda na Arábia Saudita há uma década. Quatro, incluindo o clérigo Nimr, foram acusados de atirar em policiais durante protestos contra o governo.

O premiê do Iraque, Haider al-Abadi, condenou a execução do clérigo Nimr e pediu que figuras religiosas e políticas proeminentes quebrassem os laços com Riad. Ele também alertou para uma possível desestabilização na região. "A liberdade de expressão e de oposição são direitos humanos básicos concedidos por leis divinas e internacionais. Violá-los afeta a segurança e a estabilidade social da região", afirmou.

A Arábia Saudita havia reaberto sua embaixada em Bagdá nesta semana pela primeira vez desde que os laços entre os dois países foram cortados por causa da invasão do Kuwait pelo Iraque em 1990, evidenciando esforços para retomar relações para fortalecer a aliança regional contra o Estado Islâmico.

O Conselho Supremo Islâmico Xiita do Líbano chamou a execução do clérigo Nimr al-Nimr de "grave erro", enquanto o grupo Hezbollah a classificou de assassinato. O aiatolá iraniano Ahmad Khatami disse que as repercussões contra os governantes sauditas sunitas poderiam "tirá-los das páginas da história".

Estudantes manifestam na cidade iraniana de Qom contra a execução do clérigo Nimr Baqir al-NimrFoto: picture-alliance/AP Photo/D. Yasin

Irã ameaça com vingança

A Guarda Revolucionária do Irã afirmou que a família real saudita sofrerá consequências. "Num futuro próximo, a família Al Saud [que governa a Arábia Saudita] sofrerá uma dura vingança que causará a queda deste regime pró-terrorista e anti-islâmico", disse o grupo em comunicado.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã, Hossein Ansari Jaber, afirmou que a Arábia Saudita vai pagar um "preço elevado" pela execução do clérigo xiita. "O governo saudita apoia, por um lado, os movimentos terroristas e extremistas e, ao mesmo tempo, utiliza a linguagem da repressão e da pena de morte contra os seus opositores internos. Ele [governo] vai pagar um preço elevado por estas políticas", disse Ansari Jaber, citado pela agência de notícias iraniana Irna.

Em resposta às declarações de Ansari Jaber, a Arábia Saudita convocou o embaixador iraniano em Riad e fez um forte protesto contra declarações "hostis" do Irã sobre as execuções feitas pelos sauditas. O Ministério do Exterior saudita "entregou ao embaixador iraniano uma dura carta de protesto sobre as agressivas declarações iranianas sobre sentenças legais hoje executadas contra terroristas no reino", segundo comunicado divulgado pela agência de notícias estatal saudita SPA.

Riad expressou a sua "completa rejeição dessas declarações agressivas, que considera uma flagrante ingerência nos assuntos do reino". O governo saudita também considerou "o governo iraniano completamente responsável por proteger" os diplomatas do reino saudita no Irã e todos os seus funcionários de quaisquer "atos agressivos".

O ministério também acusou o Irã de ser um país "sem vergonha", ao apoiar o terrorismo e ameaçar a estabilidade regional, após os protestos de Teerã contra a execução de Nimr. "O regime iraniano é o último regime no mundo que pode acusar outros de apoiarem o terrorismo, já que o Irã apoia o terrorismo e foi condenado pelas Nações Unidas e por numerosos países", declarou um porta-voz do ministro do Exterior saudita.

Manifestantes invadem embaixada saudita em Teerã

No fim deste sábado, manifestantes iranianos atacaram a embaixada saudita. De acordo com a agência Irna, os manifestantes lançaram coquetéis Molotov contra a embaixada saudita na capital do Irã e forçaram a entrada na representação diplomática.

"Labaredas se elevam no interior da embaixada, onde manifestantes conseguiram entrar mas foram retirados em seguida", noticiou a agência, acrescentando que houve também manifestantes que conseguiram subir ao telhado do edifício.

"Consequências perigosas" com tensões entre xiitas e sunitas

A Arábia Saudita prendeu centenas de membros de sua minoria xiita, estimada em cerca de 15% da população saudita, após uma sequência de protestos entre 2011 e 2013. Nimr foi preso em 2012 sob a acusação de incitar o sectarismo por seu papel de liderança nos protestos. Ele advogou pela não violência, mas também ameaçou levar a região leste do país, rica em petróleo, à secessão se o governo não mudasse sua política com os xiitas.

Os protestos xiitas na Arábia Saudita ocorreram durante manifestações em massa no país vizinho Bahrein, em 2011. Aqueles protestos xiitas contra a monarquia sunita foram duramente reprimidos com o apoio de tropas sauditas.

Estados Unidos e União Europeia (UE) também condenaram as execuções. A chefe da política externa da UE, Federica Mogherini, advertiu que a execução do clérigo xiita traz "consequências perigosas" por inflamar ainda mais as tensões sectárias na região. E segundo o Departamento de Estado dos EUA, a execução de Nimr pode "exacerbar tensões intercomunitárias numa altura em que é urgente apaziguá-las".

PV/lusa/rtr/afp/ap