"Little America": soldados dos EUA em casa na Alemanha
Heike Mund lm
26 de março de 2018
Do fim da Segunda Guerra até 1980, os americanos mantiveram casernas em solo alemão, onde os militares viviam como na terra natal. Museu dos Aliados de Berlim revela o dia a dia dessas comunidades, em 200 fotos de época
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Com a vitória dos países aliados na Segunda Guerra Mundial, a Alemanha foi dividida em quatro zonas militares, administradas pelas potências vencedoras Estados Unidos, Rússia, Reino Unido e França, respectivamente. Em diversos pontos do país, militares dos EUA foram alojados em casernas nas bases das Forças Armadas americanas.
Embora a ocupação tenha sido encerrada em 1955, e a República Federal da Alemanha reconhecida como Estado soberano, os americanos mantiveram suas bases militares no país. E os assentamentos se tornaram uma espécie de segunda pátria para os soldados, sendo carinhosamente apelidados "Little America” (Pequena América).
Esse é justamente o título da mostra inaugurada em 21 de março de 2018 no Museu dos Aliados (Alliierten Museum), a qual reúne cerca de 200 fotos feitas nessas comunidades militares entre o fim da década de 40 e a de 80.
Dia a dia como nos EUA
Todas as fotografias da exposição provêm da coleção particular de um ex-morador da "Little America": o historiador de arte e colecionador John Provan passou a infância e juventude na base aérea de Sembach, no sudoeste da Alemanha, basicamente isolado da cultura alemã.
"O assentamento ficava num aeródromo afastado. Como filhos de soldados, nós, os assim chamados brats [pirralhos], nos sentíamos como um grupo bem coeso", contou Provan à curadora da mostra, Olivia Fuhrich. "A 'Little America' era como nos Estados Unidos: tudo vinha de lá; você nem sentia que estivesse em outro lugar."
Nos assentamentos, não era necessário aprender alemão: as crianças frequentavam a escola americana e depois iam para a high school. Tudo o que requer o American way of life para o quotidiano estava à disposição: gêneros alimentícios, roupas, artigos esportivos, brinquedos, material escolar.
Cultura americana na Alemanha
Era raro alguém ir até a cidade fazer compras. "Só circulava duas vezes por dia um ônibus que trazia e levava de volta os trabalhadores alemães", recorda Provan. "Tudo de que você precisasse, tinha no aeródromo. Para nós, crianças, era o paraíso."
Os assentamentos não eram muito grandes, todo o mundo se conhecia – como numa cidadezinha dos EUA. Também membros da comunidade eram os fotógrafos que, a serviço do Exército nacional, documentavam a vida na "Little America". Por isso, muitas das imagens na exposição em Berlim mais parecem instantâneos particulares do que fotos oficiais.
A coleção de John Provan abarca, ao todo, 220 mil fotografias, além de 16 mil discos fonográficos e numerosos documentos de áudio. O historiador de arte acredita ser uma "vocação" – "a calling", como ele diz – manter esses tesouros históricos.
"Para mim, é importante preservar a imagem que os GIs deixaram aqui na Alemanha: a influência da cultura americana, a língua, a democracia, até a comida, a fast food, a música pop, o esporte (basquetebol), as roupas – por exemplo, o jeans."
Em 2016 o Museu dos Aliados de Berlim assumiu todo o acervo de fotos sobre a vida na "Little America". Agora estão acessíveis pela primeira vez ao público não militar, numa exposição especial.
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Mostra "Esplendor e miséria na República de Weimar"
O fim da 1ª Guerra e a transformação do país em democracia iniciou um período conturbado na Alemanha, que levou à ascensão do nazismo. Este terreno fértil para a arte é tema de uma exposição em Frankfurt.
Foto: picture-alliance/dpa/F. Rumpenhorst
"Tiller Girls", de Karl Hofer
As duas bailarinas inglesas retratadas de forma abstrata pelo pintor Karl Hofer em 1927 eram lendárias em Berlim nos anos de 1920. Elas se apresentavam todas as noites no Admiralpalast, um famoso cabaré da época.
Foto: picture-alliance/dpa/F. Rumpenhorst
"Dama usando pele e véu", de Otto Dix
Depois da 1ª Guerra, Berlim cresceu e se tornou uma efervescente metrópole europeia, chegando a ser a terceira maior cidade do mundo. A vida noturna e o hedonismo dos anos de 1920 serviam de inspiração aos artistas. Um deles foi o pintor e veterano de guerra Otto Dix. Nesta pintura de 1920, ele mostra sua predileção por retratar prostitutas, sobreviventes de guerra e marginalizados sociais.
Foto: VG Bild-Kunst, Bonn 2017, Judy and Michael Steinhardt Collection, New York
"Gigolô e prostituta", de Otto Dix
Otto Dix retratava com frequência sujeitos simples que incorporavam o espírito da época da República de Weimar. Ele mesmo havia retornado da frente de batalha como veterano de guerra. Os desenhos revelam a predileção de Dix em retratar o irreparável e o mórbido na sociedade. Aqui, na obra de 1923, um gigolô com o bigode de Hitler – uma moda na época – com uma "flor da noite" atrás de si.
Foto: VG Bild-Kunst, Bonn 2017
"Rapazes amantes", de Christian Schad
A República de Weimar foi um período turbulento. Superada a monarquia, o anseio pela liberdade era imenso. A homossexualidade era socialmente aceitável, ainda que passível de punição perante a lei. O pintor Christian Schad, dadaísta e observador crítico, tomou isso como tema central para seus desenhos e telas, como na obra de 1929.
Foto: VG Bild-Kunst, Bonn 2017/Foto: J. Oschik, Museen der Stadt Aschaffenburg
"O carnaval de Weimar", de Horst Naumann
O pintor Horst Naumann usa seus quadros para denunciar as vivências da guerra e a morbidez da sociedade urbana. A ascensão do nazismo, o antissemitismo latente e a decadência de Berlim foram registrados pelo pintor em uma colagem de cenas fílmicas neste quadro de 1929.
Irmgard Keun ficou famosa ao publicar no início dos anos de 1920 o conto "A moça em seda artificial". Este era o tecido mais barato para os vestidos das prostitutas, que compunham o cenário da vida noturna de Berlim. Mas também "moças de família" aproveitavam o cenário decadente da cidade em bares, cabarés e clubes de dança, como "Margot", aqui retratada em 1924 por Rudolf Schlichter.
Foto: Viola Roehr von Alvensleben München/Foto: M. Setzpfandt
"Quarta-feira de cinzas", de Jeanne Mammen
Extremamente moderna, a pintora Jeanne Mammen afirmava-se no círculo berlinense de artistas com audácia e autoconfiança. Ela começou como estilista de moda e depois trabalhou para as revistas satíricas alemãs "Simplicissimus" e "Ulk". O estilo caricato de seu traço marcou também suas pinturas. Aqui, o desenho em aquarela de 1926 é um exemplo disso.
Foto: VG Bild-Kunst, Bonn 2017/Foto: M. Schormann
"Logenlogik", de Dodo
A mostra na Schirn Kunsthalle tem cerca de 200 obras de 62 artistas. Muitas mulheres fizeram parte do movimento artístico da Nova Objetividade. Aqui, uma caricatura da artista Dodo, aliás, Dörte Clara Wolff, publicada em 1929 na revista satírica "Ulk", demonstra a vida extravagante à margem da Grande Depressão, crise que eclodiria nesse mesmo ano.
Foto: Privatsammlung Hamburg/Krümmer Fine Art
"Café (Cavaleiro da suástica)", de Georg Scholz
Durante a República de Weimar, muitos pintores revelaram-se como sismógrafos sociais, pressentindo a catástrofe política que desembocaria no nazismo. Com a Grande Depressão de 1929, a pobreza do pós-guerra agravou-se ainda mais. A arte serviu como espelho dessa sociedade. As percepções artísticas da época podem ser vistas até fevereiro de 2018 na Schirn Kunsthalle em Frankfurt.
Foto: VG Bild-Kunst, Bonn 2017, Foto: Galerie Michael Hasenclever
"Das coisas por vir", de George Scholz
Em "Das coisas por vir", de 1922, George Scholz retrata a sociedade industrial alemã e o capitalismo. As chaminés das fábricas servem como pano de fundo para as três figuras masculinas estilizadas. A imobilidade dessas figuras é complementada com o geometrismo dos prédios ao fundo e o chão. O único movimento vem das chaminés, que insinuam a presença (ainda que oculta) da classe operária.