Ao prometer visão positiva da ditadura em livros didáticos, ministro da Educação irrita até militares, vê pressão contra sua permanência no cargo aumentar e tem mais dois indicados por ele exonerados.
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A fala do ministro da Educação em defesa do golpe militar de 1964 acirrou ainda mais a crise que paralisa a pasta e que opõe olavistas e militares no centro do governo de Jair Bolsonaro. O caso pode significar a gota d'água para a demissão de Ricardo Vélez, afirma a imprensa brasileira.
Em entrevista ao jornal Valor Econômico na quarta-feira (03/04), o ministro ecoou declarações do próprio presidente de que não houve golpe de Estado há 55 anos e afirmou que a ditadura que se seguiu à tomada do poder pelos militares foi um "regime democrático de força".
Vélez disse ainda que, para que as crianças possam ter uma "ideia verídica do que foi a sua história", seu ministério realizará "mudanças progressivas" nos livros didáticos para alterar a maneira como o golpe e ditadura militar são retratados nas escolas brasileiras.
O jornal Folha de S. Paulo publicou que, "numa ironia", as declarações do ministro irritaram a cúpula militar brasileira, que já pede a saída dele do cargo. "Eles farão chegar ao presidente Jair Bolsonaro que a paciência com o ministro acabou", diz o diário.
Segundo a reportagem, na visão de integrantes da ativa e do núcleo militar do governo Bolsonaro, a fala de Vélez é apenas uma tentativa do ministro de se manter no cargo.
O colunista do jornal O Globo Bernardo Mello Franco também diz que as afirmações do ministro não passam de uma "tentativa desesperada de bajular os generais do governo, que já pediram sua cabeça ao presidente Jair Bolsonaro".
"Depois dessa entrevista, Vélez não poderá reclamar se for chamado de 'lambe-botas'. É isso o que ele está fazendo em busca de apoio para continuar no MEC", escreve Mello Franco.
Se a tentativa era se segurar no posto, ela parece ter saído pela culatra. A principal evidência do enfraquecimento do ministro está na onda de demissões no alto escalão da pasta, que fez novas vítimas nesta quinta-feira com o afastamento de dois de seus indicados.
A Casa Civil divulgou a exoneração do assessor especial de Vélez, Bruno Meirelles Garschagen, e da chefe de gabinete, Josie de Jesus. As demissões foram assinadas pelo chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
Garschagen era um dos principais assessores de Vélez, responsável pela comunicação e contato com a imprensa. Jornalista e ligado a Olavo de Carvalho, espécie de guru do bolsonarismo, ele é autor do livro Pare de acreditar no governo, de 2015.
Segundo o jornal Estado de S. Paulo, Garschagen teria participado da decisão de pedir às escolas brasileiras que filmassem seus alunos cantando o Hino Nacional e lendo uma carta escrita pelo ministro, que terminava com o slogan da campanha de Bolsonaro, "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos". O ex-assessor nega participação.
O governo ainda não anunciou quem substituirá Garschagen na pasta. Para o cargo de chefe de gabinete, ocupando o lugar de Josie de Jesus, a Casa Civil nomeou o coronel da reserva da Polícia Militar Marcos de Araújo.
Desde que Vélez assumiu o MEC em 1º de janeiro, pelo menos 14 funcionários já foram dispensados de importantes cargos na pasta, em meio a uma queda de braço entre militares e seguidores do autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho para ver quem toma as rédeas do ministério.
Enquanto isso, questões centrais de um dos setores com necessidades mais urgentes do Brasil deixam de ser discutidas. Uma verdadeira paralisia toma conta do MEC e já vem tendo impactos em diferentes áreas da educação.
A nomeação de Marcos de Araújo para a chefia de gabinete representa mais uma vitória para os militares nesse embate. Na semana passada, o tenente-brigadeiro Ricardo Machado Vieira havia sido nomeado secretário-executivo, o "número dois" da pasta.
O grupo vinculado às Forças Armadas entende que Vélez está refém do campo ideológico, o que impede o avanço de projetos desenhados antes de sua nomeação. Além disso, a imagem do ministro tem sofrido um desgaste contínuo em meio à série de polêmicas, o que desperta críticas até mesmo de políticos da base do governo.
O processo de desgaste culminou em sua participação em audiência na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados na semana passada. Vélez foi duramente criticado por parlamentares, pela superficialidade das ideias apresentadas e a falta de clareza na apresentação de programas da pasta.
Com diplomação, presidente eleito conclui primeira fase da transição e já tem o gabinete formado. Durante a campanha, ele prometeu reduzir número de ministros de 29 para 15, mas acabou com 22. Veja quem são.
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Redução modesta
Durante a campanha, Jair Bolsonaro prometeu reduzir o número de ministérios de 29 para 15. Mas, durante a transição, o presidente voltou atrás e promoveu uma redução bem menor do que a prometida. Ao todo, há 22 pastas no novo governo. Entre os ministros, há filiados do DEM, PSL e MDB, além de dez com laços militares, dois discípulos de Olavo de Carvalho e apenas duas mulheres.
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Paulo Guedes
Guru econômico e ministro anunciado ainda durante a campanha, Paulo Guedes comanda o superministério da Economia, formado pela junção das pastas da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio Exterior. O economista é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF), suspeito de ter cometido fraudes na captação de recursos de fundos de pensão de estatais entre 2009 e 2013.
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Onyx Lorenzoni
Deputado federal do DEM, Onyx Lorenzoni articulou a campanha de Bolsonaro desde 2017 e foi indicado para assumir a Casa Civil. Em sua carreira política, já foi deputado estadual no Rio Grande do Sul e, desde 2003, tem mandatos na Câmara. Após ser citado na delação da JBS, ele admitiu ter recebido caixa dois de campanha, e está sendo investigado pela Procuradoria-Geral da República.
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Sérgio Moro
Juiz federal que foi responsável pela Lava Jato em primeira instância, Sérgio Moro comandará o Ministério da Justiça. Seu decisão de entrar para a política causou polêmica. Foi ele quem condenou Lula pela primeira vez em 2017, o que marcou o início dos problemas do ex-presidente em registrar sua nova candidatura ao Planalto em 2018. Fato que ajudou Bolsonaro a assumir a liderança nas pesquisas.
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Marcos Pontes
Astronauta que chegou a ser cotado para vice da chapa do PSL, Marcos Pontes chefiará o Ministério da Ciência Tecnologia. Formado em engenharia aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Pontes se tornou o primeiro astronauta brasileiro da história e foi enviado ao espaço pela Missão Centenário, em 2006, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele é filiado ao PSL.
A deputada federal Tereza Cristina (DEM) comandará o Ministério da Agricultura. Engenharia agrônoma e empresária, Tereza Cristina foi presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária e indicada pela bancada ruralista para o cargo. Ela defende a aprovação do projeto lei que flexibiliza as regras para a fiscalização e aplicação de agrotóxicos no país.
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Ernesto Araújo
Diplomata de carreira, Ernesto Araújo assumirá o Ministério das Relações Exteriores. Discípulo de Olavo de Carvalho, ele atuou no Itamaraty em várias áreas, porém, nunca chefiou uma embaixada. Araújo mantinha um blog no qual fez campanha para Bolsonaro, chamou o PT de "Partido Terrorista" e disse querer libertar o mundo da "ideologia globalista". Admira Donald Trump e nega o aquecimento global.
Foto: Getty Images/AFP/S. Lima
Luiz Henrique Mandetta
Deputado federal do DEM (MS), Luiz Henrique Mandetta ficou com o comando do Ministério da Saúde. Médico ortopedista e ligado a Lorenzoni, ele era crítico do Programa Mais Médicos. Entre 2005 e 2010, Mandetta foi secretário municipal de saúde de Campo Grande. A passagem pelo cargo lhe rendeu um inquérito por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois.
Foto: Agência Brasil
Fernando Azevedo e Silva
O general da reserva Fernando Azevedo e Silva foi escolhido para o Ministério da Defesa. Natural do Rio, ele deixou o Alto Comando do Exército em 2018 e passou a assessorar o presidente do STF, Dias Toffoli. Azevedo e Silva foi chefe do Estado-Maior do Exército e comandante da Brigada Paraquedista, onde serviu ao lado de Bolsonaro. Chefiou ainda operações na Missão de Paz da ONU no Haiti.
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Ricardo Vélez Rodríguez
Escolha do colombiano antipetista Ricardo Vélez Rodríguez para assumir o Ministério da Educação foi indicação de Olavo de Carvalho. Nascido em Bogotá e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é formado em filosofia e mostrou apoiar várias das bandeiras defendidas por Bolsonaro, como a expansão de escolas militares no país e o combate a uma suposta predominância de ideias esquerdistas no ensino.
Foto: Agência Brasil
Tarcísio Gomes de Freitas
O ex-diretor do Dnit Tarcísio Gomes de Freitas chefiará o novo Ministério da Infraestrutura, que deve englobar a atual pasta de Transportes, Portos e Aviação Civil. No governo Temer, Freitas foi secretário de Coordenação de Projetos do Programa de Parceria em Investimentos e consultor legislativo da Câmara dos Deputados. O engenheiro civil iniciou a carreira no Exército e atuou no Haiti.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Gustavo Canuto
Servidor efetivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Henrique Rigodanzo Canuto comandará o novo Ministério do Desenvolvimento Regional. Servidor sem filiação partidária, Canuto é formado em engenharia da computação e direito e já atuou na Secretaria Geral da Presidência da República, na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e na Secretaria de Aviação Civil.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Osmar Terra
Ex-ministro do governo Temer, Osmar Terra assumiu o novo Ministério da Cidadania e Ação Social. Médico, Terra é deputado federal pelo MDB desde 2001. Já foi prefeito de Santa Rosa (RS) e secretário de Saúde do RS. Terra poderá ser um dos ministros que trará dor de cabeça a Bolsonaro. O deputado apareceu na superplanilha da Odebrecht, que indicaria propinas pagas a políticos.
Foto: Viola Jr/Camara dos Deputados
Marcelo Álvaro Antônio
Deputado do PSL Marcelo Álvaro Antônio assumirá o Ministério do Turismo. Integrante da frente parlamentar evangélica, ele foi o candidato mais votado em Minas Gerais, reeleito para o segundo mandato neste ano. Antes de ser deputado, Antônio foi vereador de Belo Horizonte. Antônio é o segundo filiado do PSL escolhido por Bolsonaro para integrar seu governo.
Foto: Agência Brasil/Valter Campanato
Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior
O almirante Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior chefiará o Ministério de Minas e Energia. Ele atuou como diretor-geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, foi observador do Brasil na Força de Paz das Nações Unidas em Sarajevo, na Bósnia-Herzegovina, e comandante de submarinos.
Foto: Getty Images/AFP/H. Retamal
Damares Alves
Pastora evangélica e assessora do senador Magno Malta (PR), Damares Alves foi escolhida para chefiar o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. A advogada trabalha há mais de 20 anos no Congresso. Ela já declarou que a mulher nasceu para ser mãe, se posicionou contra o feminismo e políticas voltadas a diminuir a discriminação de homossexuais. É contra a legalização do aborto e das drogas.
Foto: Agência Brasil/V. Campanato
Ricardo de Aquino Salles
Advogado e criador do Endireita Brasil, Ricardo de Aquino Salles será o ministro do Meio Ambiente. Salles foi secretário estadual do Meio Ambiente no governo de Geraldo Alckmin. É réu por improbidade administrativa, acusado de esconder alterações em mapas do zoneamento ambiental do rio Tietê, numa ação que teria favorecido mineradoras. Foi ainda diretor da Sociedade Rural Brasileira.
Foto: Imago/Fotoarena
Ministérios dentro do Planalto
Além da Casa Civil, outros três ministérios funcionam dentro do Planalto. Ex-presidente do PSL e aliado próximo de Bolsonaro, Gustavo Bebianno será o chefe da Secretaria-Geral. O general reformado que comandou a Missão ONU para a Estabilização no Haiti Augusto Heleno ficou com o Gabinete de Segurança Institucional. Já o general Carlos Alberto dos Santos Cruz ficará com a Secretaria de Governo.
Foto: Getty Images/AFP/M. Pimentel
AGU e CGU
A Advocacia-Geral da União (AGU) ficará sob o comando do advogado André Luiz de Almeida Mendonça, que, ao longo da carreira, atuou em áreas de transparência e combate à corrupção. O Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) continuará a ser chefiado por Wagner Rosário (foto). O servidor de carreira ocupa o cargo desde junho de 2017, indicado pelo ex-presidente Michel Temer.
Foto: Agência Brasil/Marcelo Camargo
Roberto Campos Neto
O chefia do Banco Central ficou com o economista Roberto Campos Neto, neto do ex-ministro do Planejamento Roberto Campos, que comandou a pasta entre 1964 e 1967, durante a ditadura militar. Próximo de Paulo Guedes, já atuou no banco Santader, no banco Bonzano Simonsen e na gestora de fundos Claritas.