Fassbinder, uma trajetória abreviada
31 de maio de 2005Ele era um obsessivo. "Dormir eu posso quando estiver morto": esta era a resposta estereotípica de Rainer Werner Fassbinder, quando as pessoas se admiravam de sua incrível produtividade. O cineasta alemão cometia excessos não só no trabalho: casos amorosos, álcool, remédios e cocaína.
Neste 31 de maio era para Fassbinder estar comemorando 60 anos. Quando faleceu em 1982, aos 37 anos, o diretor deixou um conjunto de 43 filmes produzidos em apenas 13 anos, sem contar roteiros, séries de tevê e peças de teatro.
"Você morreu tão cedo por ter se apressado tanto?", perguntou a atriz Hanna Schygulla por ocasião de sua morte: "Ou será que se apressou por morrer tão cedo?". Talvez ambos. Muitas pessoas que conviveram com Fassbinder acham que ele também se afundava no trabalho por causa de seus medos. "O incrível era que este contraditor animava os outros com seu medo", disse o cineasta e ator Hark Bohm. Para a escritora e teórica norte-americana Susan Sontag, Fassbinder era um dos mais extraordinários talentos do século 20.
Fã de futebol, criança-prodígio, enfant terrible
O bávaro nascido em Bad Wörishofen, em 1945, foi um dos mais produtivos e significativos diretores alemães. Para ele, os filmes e o processo de produção eram sempre uma tentativa de compreender melhor a si mesmo. Sua obra é tão contraditória como sua personalidade.
Mesmo considerado incontrolável e maldoso, o cineasta não deixou de fazer filmes altamente sensíveis. Só em 1969, ele dirigiu dez filmes, entre os quais O Amor é mais Frio que a Morte e O Machão. Em ambos, Fassbinder interpreta um homem isolado que acaba fracassando.
Precauções diante de uma Prostituta Santa (1971), que aborda conflitos e agressões numa produção cinematográfica, também tem traços autobiográficos. O terror psicológico que ele gera na tela é absolutamente realista, segundo quem trabalhou com ele. Como toda diva, ele também sabia ser carinhoso e cruel.
O mais tardar no início dos anos 70, o bávaro aficcionado por futebol não podia mais ser ignorado pela crítica alemã. Aos 25 anos já era considerado enfant terrible ou criança-prodígio do cinema alemão.
As Lágrimas Amargas de Petra Kant (1972), o corrosivo melodrama Medo Corrói a Alma (1973) ou sua precisa adaptação do realista alemão Theodor Fontane Effi Briest (1974) impressionaram público e crítica.
Destinos femininos e crítica social
No início de sua carreira, que coincide com o começo da história da Alemanha Ocidental, Fassbinder aborda trajetórias femininas em filmes como O Casamento de Maria Braun (1979), Lola (1981) ou O Desespero de Veronika Voss (1982).
Por trás destes destinos, o diretor mostra o reverso do milagre econômico, o isolamento dentro da sociedade e o provincianismo alemão. Outro sucesso de público foi Lili Marleen (1981), com Hanna Schygulla interpretando a cantora Lale Andersen.
Na opinião da crítica, a obra-prima de Fassbinder é a adaptação cinematográfica do clássico de Alfred Döblin Berlin Alexanderplatz (1980). A série de tevê com 14 episódios representa uma grande homenagem a Franz Biberkopf, protagonista deste romance-chave do modernismo alemão.
Suas obsessões homossexuais foram trabalhadas na adaptação de Querelle (1982), de Jean Genet, que acabou sendo seu último filme.
Obsessões sexuais e criatividade
As opiniões sobre o homossexualismo de Fassbinder são divergentes. O ator Karlheiz Böhm, por exemplo, um dos protagonistas favoritos do cineasta, acha que "Rainer vendia essa imagem de homossexual como forma de protesto contra o pai e contra a sociedade".
Para sua companheira Juliane Lorenz, que também foi sua assistente de edição durante anos, "havia fases em que ele vivia como gay e outras como bissexual". "Provavemente ele preferia transar com homens", diz Lorenz: "Mulher dava mais trabalho e ele também tinha um certo medo". A cineasta Margarethe von Trotta considera a obsessão sexual de Fassbinder uma fonte de sua impressionante força criativa.
A morte repentina de Rainer Werner Fassbinder, em 10 de junho de 1982, deixou uma lacuna no cinema alemão. Na França e nos Estados Unidos, o cineasta tem mais prestígio do que na Alemanha. Um sinal disso é que uma atual e abrangente exposição sobre a sua vida e obra pode ser apreciada em Paris, no Centro Pompidou, não em Berlim ou Munique.