Dirigindo tratores, agricultores tomam vias urbanas para protestar contra pacote que visa reduzir uso de fertilizantes e banir glifosato. Organizadores expressam frustação com ambientalistas e com o acordo UE-Mercosul.
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Milhares de agricultores promoveram manifestações em 17 cidades da Alemanha nesta terça-feira (22/10) em protesto contra um pacote do governo federal que visa reduzir o uso de agrotóxicos e de certos tipos de fertilizantes.
O movimento foi organizado pelo grupo "O Campo Promove Conexão". Segundo os organizadores, pelo menos 40 mil agricultores participaram dos atos. Vários se dirigiram para as cidades com seus tratores, promovendo bloqueios no trânsito.
O epicentro do protesto foi a cidade de Bonn, a antiga sede do governo federal alemão, onde o Ministério da Agricultura ainda está sediado. Pelo menos 800 tratores bloquearam o trânsito nas vias da cidade, localizada no oeste do país. Protestos similares com tratores também foram registrados em Berlim, Munique, Hanover e Stuttgart.
Ainda em Bonn, 4 mil agricultores se reuniram em uma praça da cidade – um número menor do que o esperado pelos organizadores, que esperavam pelo menos 10 mil pessoas. Em Berlim, dezenas de tratores circularam em volta da Coluna da Vitória, um dos principais pontos turísticos da capital.
Na mira dos agricultores está uma série de medidas anunciadas pelo governo federal em setembro. O pacote pretende reduzir o uso de certos tipos de fertilizantes para diminuir os níveis de nitrato dos lençóis freáticos, e prevê o abandono do herbicida glifosato (também conhecido pelo nome comercial Roundup) até 2023.
Vários agricultores entrevistados pela imprensa alemã afirmaram que o pacote tem o potencial de arruinar pequenos agricultores familiares. Eles temem que um controle maior sobre o uso de fertilizantes acabe provocando uma diminuição da produção, especialmente em áreas de solo pouco fértil.
Vários fazendeiros também expressaram frustração com o discurso ambientalista e disseram que não estão sendo consultados pelo governo sobre medidas que afetam suas atividades.
Um comunicado divulgado pelos organizadores afirma que os agricultores alemães estão fartos de serem tratados como "bode expiatório" e "abusadores de animais e poluidores" por ONGs e grupos políticos. "O clima negativo permanente e a agressão aos fazendeiros vêm provocando raiva e frustração na profissão."
O documento ainda menciona a preocupação dos agricultores com o acordo entre a União Europeia e o Mercosul, afirmando que o pacto e seu potencial de trazer ao mercado alemão mais "produtos importados baratos [...] ameaça o fornecimento de alimentos seguros, de alta qualidade e certificados localmente".
Um dia antes do protesto, a ministra da Agricultura da Alemanha, Julia Klöckner, tentou acalmar os ânimos expressando simpatia pela causa dos fazendeiros. "Nossas agricultores familiares asseguram que sempre há comida em nossas mesas", disse à rede ZDF.
Por outro lado, ela também defendeu o pacote e falou da necessidade de proteger o meio ambiente e a qualidade dos alimentos. "Nós estamos do lado dos fazendeiros, mas também dos consumidores."
Há muito dinheiro envolvido: o setor que recebe as maiores verbas da União Europeia é o agrícola. No entanto, as condições nos diferentes países e regiões do bloco não poderiam ser mais diversas.
Foto: GEORGES GOBET/AFP/GettyImages
Setor bilionário
Com subsídios anuais de 47 bilhões de euros, a agricultura é o maior segmento orçamentário da União Europeia. Essa verba é distribuída entre os fazendeiros segundo a extensão de suas terras, independente da produção agrária real. No entanto, as condições de trabalho são extremamente diversas, não só entre os países-membros, como também dentro deles.
Foto: Getty Images
Falso idílio campestre
O leite do café da manhã vem de "vacas felizes", que vagam por verdes pastos: essa é a imagem de idílio rural que a publicidade tenta passar ao consumidor. Na realidade, o leite provém da produção em massa, e os animais passam o dia em pé nos estábulos, quase sem espaço para se mover. O capim que pisam é seco ou totalmente substituído por outro tipo de substrato.
Foto: imago/Eibner
Ordenha em ritmo industrial
Para que os agricultores europeus se mantenham competitivos no mercado mundial, eles precisam investir em métodos de produção eficientes. Carrosséis de ordenha economizam tempo e substituem mão de obra humana. As vacas são ordenhadas três vezes ao dia por esses dispositivos. A alta tecnologia expulsou o trabalho manual dos estábulos, e a agricultura é cada vez mais otimizada.
Foto: picture-alliance/ZB
Criação em massa
Os frangos de corte são engordados em tempo recorde nos galpões de criação intensiva, para que a fábrica produza o máximo possível de carne. Nesses galinheiros, eles crescem três vezes mais rápido do que as galinhas poedeiras, alcançando um peso entre 1,5 e 1,8 quilo no espaço de 30 dias. Os animais só sobrevivem a tal tratamento à custa de fartas doses de antibióticos.
Foto: Getty Images
Luta pela sobrevivência
Desde que vários países do Leste Europeu aderiram à UE, os agricultores locais competem por um lugar no mercado do bloco. As terras aráveis da Romênia são as mais valiosas da UE. Lá, grandes conglomerados compram áreas consideráveis e empregam máquinas modernas no cultivo. Enquanto isso, milhares de pequenos fazendeiros, que ainda usam arados puxados por burros ou bois, lutam pela sobrevivência.
Foto: DANIEL MIHAILESCU/AFP/Getty Images
Trabalho duro na vindima
Apesar da alta taxa de desemprego, vinicultores alemães quase não acham mão de obra para a colheita. Trabalhadores sazonais da UE têm permissão de auxiliar na agricultura, dentro do bloco, durante seis meses ao ano. Mas para romenos e búlgaros, esse acesso ainda é restrito. Somente a partir de 2014 eles se beneficiarão plenamente da liberalização do mercado de trabalho em todos os Estados da UE.
Foto: MARIO LAPORTA/AFP/Getty Images
Ouro verde
Para cada litro de puro óleo de oliva, é preciso prensar de quatro a cinco quilos de azeitonas. Colhê-los exige bastante esforço físico, e são geralmente os ajudantes estrangeiros a se encarregarem da tarefa. Mas para financiar seus salários, a safra precisa ser abundante e o lucro, elevado. Tarefa difícil para os pequenos produtores, já que cresce a concorrência por parte das grandes empresas.
Foto: Getty Images
Movidos pela esperança
Nenhum caminho é longo demais na procura por trabalho. Trabalhadores sazonais atravessam toda a União Europeia, na esperança de encontrar ocupação e ganhar o suficiente para alimentar suas famílias. Mas as crianças permanecem na terra natal, e as famílias são dilaceradas.
Foto: picture-alliance/ZB
Aeroporto subvencionado
Os subsídios agrícolas da União Europeia deveriam beneficiar os fazendeiros. No entanto, qualquer proprietário de campo arável, pedaço de floresta ou prado também recebe verbas do bloco. Um deles é o aeroporto Schiphol, de Amsterdã, quarto maior da Europa. Cerca de 50 milhões de passageiros e 1,5 milhão de toneladas de carga são transportados anualmente a partir dele. De agricultura, nem sombra.