Ele comandou Cuba por 49 anos, mais tempo que qualquer não monarca no século 20. Para uns, será lembrado como o líder que tornou a nação um modelo de saúde e educação. Para outros, foi um ditador e inimigo da democracia.
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Fidel Castro podia fazer discursos que duravam horas. Às vezes, o carismático revolucionário prendia seu público durante cinco, até sete horas. Seu alvo favorito nunca mudou, e até o fim da vida ele foi um incansável crítico do arqui-inimigo: os Estados Unidos da América. "A multinacionais yankees jamais renunciarão ao controle das terras, das águas, das minas, dos recursos naturais de nossos países", escreveu o ex-chefe de Estado, de governo, do Exército e do Partido Comunista – o único oficialmente reconhecido – na edição de 16 de abril de 2012 do Granma, o órgão oficial do partido.
Fidel, como é chamado por muitos cubanos, escolheu cedo lutar pelo socialismo e lutou toda a vida pelo seu ideal de justiça e pela independência de Cuba. Ele nutria ódio às nações industrializadas e sua ordem econômica capitalista.
De advogado a líder rebelde
Fidel Alejandro Castro Ruz nasceu em 1926, em Birán, no leste de Cuba. Alguns historiadores citam 1927 como o ano de nascimento. Ele e seus seis irmãos cresceram num ambiente abastado. Depois de estudar Direito, Fidel se estabeleceu como advogado em Havana. Sua clientela seria composta principalmente por habitantes dos bairros mais pobres. Ele já atuava politicamente nos tempos de universitário, chegando a se candidatar em 1952 às eleições parlamentares. Mas as votações não chegaram a acontecer devido ao golpe de Estado promovido por Fulgencio Batista.
A partir desse momento, Fidel passou a ter como sua principal meta derrubar o ditador, reunindo em torno de si pessoas com essa mesma intenção – entre elas, Ernesto "Che" Guevara. As tentativas promovidas pelo exército rebelde de Fidel fracassaram em 1953 e 1955, e o comandante en jefe foi forçado a fugir para as montanhas.
"Quando Castro anunciou que derrubaria Batista, as pessoas pensavam que ele não estava muito bem da cabeça", afirma Volker Skierka, jornalista alemão e autor de uma biografia sobre o "máximo líder". Foi então que aconteceu o triunfo que o transformou num libertador, aos olhos de muitos cubanos e de seus seguidores. Batista fugiu da ilha. Em 1° de janeiro de 1959, Castro proclamou o triunfo da revolução e chegou ao poder na nação caribenha, consolidando-o, a partir de então, de forma contínua.
Cuba de Fidel
Com seus planos socialistas, Fidel atraiu repetidamente contra si a ira dos Estados Unidos – encontrando aliados no chamado bloco comunista, incluindo a Alemanha Oriental. De acordo com estimativa do Ministério alemão do Exterior, cerca de 30 mil cubanos estudaram ou trabalharam na Alemanha, especialmente na antiga Alemanha Oriental.
A União Soviética apoiou Cuba, a princípio financeiramente, e em 1962 também estacionou mísseis de médio alcance na ilha. Os EUA responderam prontamente, mas a chamada "crise dos mísseis de Cuba" conseguiu ser superada sem a temida guerra nuclear.
No entanto, o embargo comercial dos EUA a Cuba, que entrou em vigor naquele mesmo ano, ainda pesa sobre a relação entre os dois países – e sobre a economia da nação caribenha. Após o colapso da União Soviética, a situação econômica de Cuba voltou a piorar devido à dependência dos recursos vindos de Moscou.
Desde o início, Fidel investiu continuamente nos sistemas estatais de educação e de saúde. Até hoje, são considerados os melhores da região. Mas, ao mesmo tempo, negou a seu povo a liberdade de expressão e de informação, mandou opositores políticos para a prisão e "acertou as contas de forma implacável com seus inimigos", como definiu o ex-embaixador alemão em Cuba, Bernd Wulffen.
"Fidel Castro ficará em nossa memória como aquele que mandou prender centenas de pessoas apenas devido a suas pacíficas atividades políticas", ressalta Maja Liebing, especialista em Cuba da seção alemã da Anistia Internacional. Ela lembra que centenas de milhares de cubanos deixaram a ilha por causa da política de Fidel.
Para o consultor financeiro alemão Hans-Olaf Henkel, detentor de diversos prêmios por seu engajamento social e econômico, Fidel era um exemplo na década de 60, por causa de sua coragem. "Se ele tivesse se tornado um democrata, as pessoas construiriam monumentos para ele no mundo inteiro", afirma.
Quase meio século no poder
Após adoecer gravemente, em julho de 2006, Fidel se retirou da política e, em 2008, entregou formalmente a liderança do Estado a seu irmão Raúl Castro. Fidel permaneceu 49 anos no poder – nenhum outro não monarca governou por mais tempo uma nação no século 20.
Raúl Castro, que foi eleito em 2008 pelo Parlamento como o novo presidente dos conselhos de Estado e de Ministros e, depois, como secretário-geral do PCC, começou lentamente a abrir o país. Como consequência dessa abertura, em julho de 2015, os Estados Unidos e Cuba anunciaram a normalização de suas relações diplomáticas e a abertura de embaixadas após mais de 50 anos sem laços diplomáticos. Em 20 de março de 2016, Barack Obama se tornou o primeiro presidente dos Estados Unidos em exercício do cargo a visitar Cuba em 88 anos.
A vida de Fidel Castro em imagens
Mesmo após abdicar do poder, Fidel Castro permaneceu sendo uma presença marcante. Não só em Cuba: admirado ou atacado, o líder revolucionário merece integrar a seleta galeria dos grandes mitos da política mundial.
Foto: AP
Educação jesuítica
Esta foto data de 1940, época em que Fidel Castro estudava no Colégio de Dolores, dirigido por jesuítas. Aos 14 anos, ninguém poderia prever como transcorreria sua biografia. Ainda assim, ele se destacava entre seus companheiros em Santiago de Cuba, sobretudo pela inteligência e aptidão oratória.
Foto: picture-alliance/dpa/Jose Maria Patac
Aluno destacado
Nascido no povoado cubano de Birán em 13 de agosto de 1926, Fidel Castro Ruz queria chegar longe. Seus pais, imigrantes da Galícia, eram bem estabelecidos, e Fidel desfrutou de uma boa educação. Esta foto é de 1945, quando finalizou o bacharelado. O anuário do colégio o descreve como um "aluno destacado e bom esportista". Cinco anos mais tarde, formava-se como advogado.
Foto: AP
Luta contra Batista
Sua candidatura como deputado, em 1952, foi frustrada pelo golpe de Estado do general Fulgencio Batista. Tendo tentado combatê-lo nos tribunais, Castro logo passou à luta armada. Depois do assalto fracassado ao quartel de Moncada, da prisão, anistia e temporada no exterior, ele retornou clandestinamente a Cuba. Em Sierra Maestra, onde começou a luta de guerrilhas, foi tirada esta foto, em 1958.
Foto: AP
A Revolução triunfa
Vitórias dos guerrilheiros custaram a Batista o apoio militar e o forçaram a fugir. Em 1º de janeiro de 1959, a Revolução celebrava vitória. No mês seguinte, Castro foi nomeado primeiro-ministro pelo novo presidente, Manuel Urrutia. Devido a diferenças com o líder revolucionário, ele renunciou em meados do ano, sendo substituído em Havana por Osvaldo Dorticós, que confiou o poder a Fidel Castro.
Foto: AP
Baía dos Porcos
A tensão entre Cuba e os EUA aumenta à medida que as desapropriações na ilha afetam os interesses americanos. Washington responde com embargo amplo, e em 3 de janeiro de 1961 rompe relações diplomáticas com Havana. Em abril, 1.500 exilados cubanos apoiados pela CIA desembarcam na Baía dos Porcos, com o intento de derrubar Castro. Este dirige a contraofensiva, e a invasão fracassa após três dias.
Foto: AP
Crise dos mísseis
"Não sei se Fidel é comunista, mas eu sou fidelista", dizia Nikita Krushchev em 1960. Moscou reatou relações diplomáticas com Cuba, interrompidas desde 1952, e incrementou seu apoio. A descoberta pelos EUA de bases nucleares soviéticas na ilha desencadeou a "crise dos mísseis". A URSS só cedeu com a promessa de John Kennedy de não invadir Cuba e também de desmontar as bases americanas na Turquia.
Foto: imago/UIG
Laços na América Latina
O episódio da Baía dos Porcos acelerara a proclamação do caráter marxista-leninista da Revolução Cubana. Em resposta, a OEA expulsou de suas alas o país, isolando-o. Mas não indefinidamente, pois a esquerda avançava em outros Estados da América Latina. Em 1971, Fidel Castro foi recebido pelo presidente chileno Salvador Allende (foto), que dois anos mais tarde seria derrubado por Augusto Pinochet.
Foto: AFP/Getty Images
Hora de Perestroika
A ascensão de Mikhail Gorbatchov ao poder, em 1985, marcou uma nova era em Moscou, de Glasnost e Perestroika. A "Cortina de Ferro" começou a ser perfurada, até se despedaçar; o império soviético acabou por cair. Sem sua principal base de sustento no exterior, Cuba precipitou-se em aguda crise. Milhares tentaram fugir para Miami em botes precários. Para muitos, era certo o fim do regime castrista.
Foto: picture-alliance/dpa
Visita papal
Um decreto do papa Pio 12 proibia a todos os católicos apoiar os regimes comunistas. Em consequência, o Vaticano havia excomungado Fidel em janeiro de 1962. Com o fim da Guerra Fria, contudo, chegou também o momento da reaproximação. Em 1996, Castro visitou João Paulo 2º, que lhe retribuiu a visita dois anos mais tarde, num gesto considerado histórico.
Foto: picture-alliance/AP/Michel Gangne
Jimmy Carter em Cuba
Houvera poucos momentos de distensão em Washington e Havana desde1962, quando os EUA impuseram seu embargo comercial, econômico e financeiro a Cuba. Um dos poucos sinais nessa direção foi a viagem do ex-presidente americano Jimmy Carter em 2002, com o fim de encontrar pontos de aproximação. Mas seus esforços tampouco trouxeram mudanças substanciais a Havana.
Foto: Adalberto Roque/AFP/Getty Images
Nova cara da Revolução
A partir da década de 90, Cuba deixou de ser vista como perigosa exportadora de revoluções. Com a estrepitosa queda do Bloco Soviético, as ideologias de esquerda naufragavam. Mas, na Venezuela, assumiu ao poder um dirigente disposto a propagar o que denominava de "Revolução Bolivariana": Hugo Chávez, admirador declarado de Fidel, ofereceu a Havana respaldo efetivo, além de apoio econômico.
Foto: picture-alliance/dpa/dpaweb
Entrega de poder
A enfermidade forçou Fidel a abandonar o poder formal, que entregou nas mãos do irmão Raúl Castro. Tudo para evitar uma guinada radical num sistema que – apesar de todos os avanços na educação e saúde – cobrava de seus cidadãos o alto preço da repressão e perda de liberdade. Enquanto apontavam os primeiros vislumbres de mudança, Fidel Castro ia se despedindo, embora defendendo sua visão até o fim.