Senado cassa mandato do "homem-bomba" de Brasília, que denunciou Dilma, Lula, Cunha, Renan e Aécio na sua delação premiada e acabou dando novo impulso ao processo de impeachment da presidente.
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Quase seis meses após a sua prisão, o senador Delcídio do Amaral chegou ao fim de sua carreira política nesta terça-feira (10/05), quando o plenário do Senado votou pela cassação do seu mandato, por 74 votos a favor e uma abstenção.
Ex-líder do governo na casa, Delcídio, de 61 anos, virou um "homem-bomba" quando passou a colaborar com a Justiça e denunciou 74 pessoas, entre elas a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Em uma entrevista, ele se autodenominou um "profeta do caos" e deixou claro que queria se vingar do governo, a quem acusou de usá-lo e depois abandoná-lo.
Em março, a divulgação pela imprensa da sua colaboração com a Justiça acabou influenciando o processo de impeachment de Dilma, que estava parado desde dezembro, dando novo ânimo aos oposicionistas e às manifestações de rua contra a presidente. Foi a partir dessa delação que o primeiro pedido de investigação de Dilma foi feito.
Delcídio pode ter sido expulso do Senado, mas os efeitos das suas acusações ainda serão sentidos pelos próximos meses.
Do PSDB ao PT
Ao longo de décadas, a trajetória de Delcídio esteve ligada ao setor de energia. Ele foi funcionário da Shell no final dos anos 80 e depois passou a ocupar cargos governamentais em estatais, como Eletrosul, Vale e Petrobras. Em 1994, chegou a assumir interinamente o Ministério de Minas e Energia por cerca de três meses.
O passo a passo do impeachment
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Na Petrobras, foi diretor de Gás e Energia durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Foi lá que seu caminho cruzou com Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa, outros dois delatores da Operação Lava Jato.
No final do governo Fernando Henrique, Delcídio se aproximou do PT. Antes, ele chegou a ser filiado ao PSDB entre 1998 e 2001. Em 2002, já no PT, pegou carona na vitória de Lula e se elegeu senador pelo Mato Grosso do Sul, seu estado natal.
Nessa época, candidatou-se duas vezes ao governo do Estado, mas perdeu em ambas. Em 2010, quando se reelegeu senador, empresas do lobista Júlio Camargo, apontando como um dos integrantes do esquema do Petrolão, estavam entre os seus doadores de campanha.
Delcídio recebeu projeção nacional pela primeira vez em 2005, durante a CPI dos Correios, que ele presidiu. A comissão investigou crimes relacionados ao mensalão. Em sua delação, o senador afirmou que os trabalhos foram influenciados por Lula, que queria a exclusão do seu nome e de um dos seus filhos do relatório final.
Em abril de 2015, o governo Dilma, já debilitado pelos conflitos políticos, escolheu Delcídio para ser líder no Senado. No período em que ocupou a posição, ele pouco conseguiu fazer para debelar a crise. Ao final contribuiu para incendiá-la ainda mais quando se tornou o primeiro senador em exercício a ser preso em flagrante.
"Errei, mas não sou corrupto"
Em 25 de novembro, a notícia da sua prisão caiu como uma bomba em Brasília. Delcídio foi acusado de oferecer ajuda para elaborar um plano de fuga para Cérvero, seu antigo colega de Petrobras, que estava na iminência de assinar um acordo de delação com os procuradores da Lava Jato. A oferta incluía ainda uma mesada pelo silêncio do ex-executivo da estatal. A conversa entre Delcídio e Cerveró, sobre a oferta, foi gravada pelo filho deste, Bernardo, um ator.
Ao tomar conhecimento do caso, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a prisão do senador. A decisão foi confirmada pelo Senado pouco depois. A partir daí, Delcídio substituiu Cerveró no posto de "homem-bomba" do governo, e começaram as especulações se ele revelaria o que sabia.
A delação de Cerveró acabou sendo homologada e implicou o próprio Delcídio. Segundo Cerveró, o senador recebeu milhões em propinas relacionadas com a Petrobras e outras empresas ao longo da sua carreira.
Já a delação de Delcídio começou a se desenhar depois da sua prisão, quando o PT tratou de se distanciar do senador. Interlocutores relataram que o senador ficou furioso por ter sido abandonado pelo governo. Em entrevistas, Delcídio afirmou que fez a oferta a Cerveró a mando de Lula. O ex-presidente nega.
Em fevereiro, Delcídio foi solto após negociar um acordo. As implicações da delação começariam a ter efeito no mês seguinte, com a publicação do conteúdo dela pela imprensa. No documento, Delcídio afirmou que Dilma usou sua influência para evitar a punição de empreiteiros, ao nomear o ministro Marcelo Navarro para o STJ (Superior Tribunal de Justiça), e tentou sabotar a Lava Jato com a ajuda de José Eduardo Cardozo, que ocupava o Ministério da Justiça.
Além de Dilma e Lula, Delcídio também fez acusações contra o deputado Eduardo Cunha, os senadores Renan Calheiros e Aécio Neves e o vice-presidente Michel Temer. Todos negam as acusações.
Nas últimas semanas, ele passou a falar frequentemente com a imprensa. "Errei, mas não sou corrupto", disse numa entrevista. Num lance surreal, o próprio Delcídio, já em liberdade condicional, tomou parte nos protestos de rua de 13 de março, comparecendo ao ato contra o governo, na Avenida Paulista. Ele afirmou ter usado um capacete de motociclista para evitar ser reconhecido.
Três dias depois, o acordo com a Justiça foi homologado. No mesmo dia, ele pediu desfiliação do PT. O acordo prevê que ele terá que devolver 1,5 milhão de reais aos cofres públicos por seu envolvimento com o esquema de desvios na Petrobras e que ficará dois anos em prisão domiciliar.
Os envolvidos na Operação Lava Jato
A operação que investiga um megaesquema de corrupção na Petrobras já acusou mais de 200 pessoas, sendo que metade delas foi condenada. Relembre as principais ações penais da Lava Jato e seus envolvidos.
Foto: picture-alliance/AP Photo/N. Antoine
Youssef absolvido
Denúncia: Evasão de 124 mil dólares não declarados, lavagem de dinheiro proveniente do tráfico de drogas e tráfico de 700 kg de cocaína.<br/> Resultado: Dois condenados (René Luiz Pereira e Carlos Habib Chater, dono do posto que deu nome à operação), um absolvido em 1ª instância (o doleiro Alberto Youssef, na foto) e um absolvido em 2ª instância (André Catão).<br/> Data: 21 de outubro de 2014.
Foto: cc-by/Valter Campanato/ABr
Primeira condenação de Youssef e Costa
Denúncia: Lavagem de dinheiro e formação de grupo criminoso organizado. Houve desvio de dinheiro público na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por meio de contratos superfaturados.</br> Resultado: Oito condenados (entre eles, Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, na foto) e dois absolvidos.</br> Data: 22 de abril de 2015.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agencia Brasil
Youssef e o dinheiro do mensalão
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Os recursos, que ultrapassam 1 milhão de reais, pertenciam ao ex-deputado federal José Janene, morto em 2010, e eram provenientes do esquema do mensalão.</br> Resultado: Quatro condenados: Alberto Youssef, Carlos Habib Chater, Ediel Viana da Silva (funcionário do Posto da Torre) e Carlos Alberto Pereira da Costa (laranja de Youssef).</br> Data: 6 de maio de 2015.
Foto: Reuters
Cerveró é condenado
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Nestor Cerveró (foto), ex-diretor da área Internacional da Petrobras, comprou um apartamento de luxo no Rio de Janeiro – hoje avaliado em 7,5 milhões de reais – com dinheiro de propina da Petrobras.</br> Resultado: Um condenado.</br> Data: 26 de maio de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
A primeira sentença a empreiteiros
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da construtora Camargo Corrêa com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas pela empresa ultrapassam os 50 milhões de reais.</br> Resultado: Seis condenados (entre eles, Youssef, Costa e três ex-dirigentes da Camargo Corrêa) e três absolvidos.</br> Data: 20 de julho de 2015.
Foto: AFP/Getty Images/Y. Chiba
Próximo alvo: executivos da OAS
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da empreiteira OAS com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas somam quase 30 milhões de reais.</br> Resultado: Sete condenados (Youssef, Costa, na foto, e mais cinco executivos ligados à OAS, entre eles, o presidente, José Aldemário Pinheiro Filho).</br> Data: 5 de agosto de 2015.
Foto: picture-alliance/AP/E. Peres
Novo operador: Fernando Baiano
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo pagamento e recebimento de propina em contratos com a Petrobras. As vantagens indevidas superam 50 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (Nestor Cerveró, em sua segunda condenação, o lobista Fernando Baiano e um ex-consultor da Toyo Setal, Júlio Camargo) e um absolvido (Youssef).</br> Data: 17 de agosto de 2015.
Foto: Reuters/S. Moraes
Um petista e mais dois ex-Petrobras
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. As propinas negociadas chegaram a 40 milhões de reais.</br> Resultado: Dez condenados (entre eles, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, na foto, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, o ex-gerente da estatal Pedro Barusco e Alberto Youssef) e um absolvido (Paulo Roberto Costa).</br> Data: 21 de setembro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/C. Villalba Racines
Primeiro político condenado
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 1 milhão de reais, por meio de contratos de publicidade firmados com a Caixa e o Ministério da Saúde.</br> Resultado: Três condenados: o ex-deputado federal André Vargas (foto), o irmão dele, Leon Vargas, e o publicitário Ricardo Hoffmann.</br> Data: 22 de setembro de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
O segundo político
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 11 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (entre eles, o ex-deputado federal Pedro Corrêa, que chegou a receber propina enquanto era julgado na Ação Penal 470, o mensalão, processo em que também foi condenado) e dois absolvidos.</br> Data: 29 de outubro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
Mais empreiteiras na mira
Denúncia: Lobistas, doleiros, ex-diretores da Petrobras e executivos ligados à construtora Andrade Gutierrez (entre eles, o presidente da empresa, Otávio Marques de Azevedo, na foto) foram denunciados por formação de quadrilha, corrupção, organização criminosa e lavagem de capitais, após envolvimento no esquema da Petrobras.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: Reuters/F. de Holanda TPX Images of the day
Agora, a Odebrecht
Denúncia: Preso desde junho de 2015, Marcelo Odebrecht – então presidente da empreiteira Odebrecht – é acusado de envolvimento com o esquema de corrupção. A empresa pagava propina, que era repassada a funcionários da Petrobras.</br> Resultado: Foi condenado a 19 anos de prisão por crimes como corrupção e organização criminosa.</br> Data: 8 de março de 2016.
Foto: Reuters/E. Castro-Mendivil/Files
Mais uma vez condenado
Denúncia: O ex-ministro José Dirceu passou a ser réu da Lava Jato enquanto cumpria pena pelo mensalão. Ele e outras 14 pessoas foram denunciadas por vários atos de corrupção dentro da Petrobras.</br> Resultado: Dirceu foi condenado a 23 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Outras dez pessoas também foram condenadas.</br> Data: 18 de maio de 2016.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Alves
Outra denúncia contra Odebrecht
Denúncia: Marcelo Odebrecht é reu outra vez, junto a outros executivos do grupo, em processo que investiga irregularidades em oito contratos firmados pela empresa com a Petrobras. Segundo o MPF, as propinas chegaram a 137 milhões de reais.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: picture alliance/ZUMAPRESS.com
Collor acusado de corrupção
Denúncia: O senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) é acusado de cometer crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, tendo recebido pelo menos 3 milhões de reais em propinas de contratos da Petrobras. Em julho, a Polícia Federal fez buscas em suas propriedades e confiscou três carros de luxo.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: ROBERTO SCHMIDT/AFP/Getty Images
Repasses ao PT
Denúncia: O pecuarista José Carlos Bumlai é acusado de corrupção, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro, por fraudes na compra de um navio-sonda pela Petrobras. Em depoimento, confessou ter feito um empréstimo de 12 milhões de reais no Banco Schahin para repassar ao PT. Entre os outros dez réus, estão Cerveró, Vaccari e executivos do Grupo Schahin.</br>Resultado: Denúncia aceita pela Justiça.
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
A denúncia contra Cunha
Denúncia: O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é acusado de receber milhões de reais em propina no esquema de corrupção na Petrobas, que teriam sido depositados em contas em seu nome na Suíça. Ele responde pelos crimes de corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réu aguarda julgamento.
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Mulher de Cunha também é ré
Denúncia: A jornalista Cláudia Cordeiro Cruz, mulher de Eduardo Cunha, é acusada de esconder, em conta secreta no exterior, valores provenientes do esquema criminoso instalado na diretoria internacional da Petrobras. Ela responde pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.<br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; ré aguarda julgamento.
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Lula e Delcídio
Denúncia: O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-senador Delcídio do Amaral e outras cinco pessoas são acusados de terem tentado atrapalhar as investigações da Lava Jato ao negociar para impedir que o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró assinasse acordo de delação premiada.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam julgamento.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Ex-ministro e senadora denunciados
Denúncia: A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo (foto), são acusados de pedir e receber propina no valor de 1 milhão de reais oriundos da Petrobras. O montante teria sido usado na campanha de Gleisi ao Senado em 2010.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Lula e o tríplex
Denúncia: O ex-presidente Lula é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por ter supostamente recebido 3,7 milhões de reais em vantagens indevidas da construtora OAS. Parte do montante está relacionada a um tríplex no Guarujá. Também são alvos da ação a mulher do petista, Marisa Letícia, e mais seis pessoas.<br> Resultado: Denúncia apresentada pelo MPF, aguarda decisão.