Hollande confirma participação na intervenção aérea dos Estados Unidos em território iraquiano, mas descarta envio de tropas e também ações militares na Síria.
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O presidente francês, François Hollande, anunciou nesta quinta-feira (18/09) a adesão do país à campanha aérea liderada pelos EUA contra o "Estado Islâmico" (EI). A França, que notoriamente se recusou a participar da guerra liderada pelos EUA no Iraque em 2003, justificou a atual decisão com o fato de que o governo iraquiano solicitou a ajuda.
"Eu decidi responder ao pedido das autoridades iraquianas para fornecer apoio aéreo", disse Hollande, que esteve em Bagdá na semana passada. "Mas não vamos além disso. Não haverá tropas terrestres e só vamos intervir no Iraque", acrescentou o presidente, seguindo assim a mesma linha adotada pelo presidente dos EUA, Barack Obama.
Assim que missões de reconhecimento identificarem possíveis alvos, os caças franceses começarão os ataques aéreos contra os militantes do EI. "Será um apoio para proteger os soldados iraquianos e as forças curdas peshmerga, para reduzir e enfraquecer esse grupo terrorista", explicou Hollande.
O presidente descartou qualquer envolvimento em solo sírio, onde os jihadistas também controlam um grande território. "Estamos conscientes do aspecto jurídico internacional. Fomos chamados pelo governo do Iraque, e não pelo da Síria", justificou Hollande. O presidente sírio, Bashar al-Assad, disse que qualquer ação militar unilateral no seu país seria vista como um ato de agressão à soberania.
Os Estados Unidos saudaram a decisão francesa. "A França é um dos países com os quais estamos contando", disse o secretário de Estado, John Kerry, que nos últimos dois dias foi pressionado pelo Congresso para descrever qual será a exata contribuição de cada um dos mais de 50 países que formam a coalizão contra o EI.
Ajuda contra o ebola
Hollande também confirmou que a França vai montar um hospital militar na Guiné para combater o vírus ebola. "Acabo de decidir a instalação de um hospital militar nos próximos dias na área florestal da Guiné, o local principal da epidemia", disse o presidente.
O anúncio veio no momento em que a França aguarda o retorno de seu primeiro paciente infectado com o vírus, uma voluntária da organização Médicos sem Fronteiras que adoeceu na Libéria. Ela será tratada num hospital de Paris.
Referendo escocês
Por fim, o chefe de Estado francês aproveitou a data em que a Escócia vota a sua independência para alertar para um possível crescimento do populismo e separatismo na Europa. "Se o projeto europeu é diluído, a porta está escancarada para o egoísmo, o populismo e o separatismo. Quem pode dizer qual é o real resultado deste referendo, que pode decidir não só o futuro do Reino Unido, mas também da Europa?", questionou Hollande.
O referendo na Escócia acontece exatamente na véspera de o Parlamento regional de Barcelona aprovar uma nova lei de consultas populares, que deverá servir de base legislativa para uma consulta, não autorizada por Madri, sobre a independência da Catalunha, agendada para 9 de novembro.
"Estado Islâmico": de militância sunita a califado
Origens do grupo jihadista remontam à invasão do Iraque, em 2003. Nascido como oposição ao domínio xiita e inicialmente um braço da Al Qaeda, EI passou por mudanças e virou uma ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com a derrubada do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo sunita surgiu a partir da união de diversas organizações extremistas, leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra a ascensão dos xiitas ao governo iraquiano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al Qaeda
A insurreição se tornou cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi, fundador da Al Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se voltaram contra eles e se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
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Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea e ele foi sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Omar al-Bagdadi. A AQI mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). No ano seguinte, Washington intensificou sua presença militar no país. Masri e Bagdadi foram mortos em 2010.
Foto: AP
Volta dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a se reagrupar, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o EIIL atravessou a fronteira para participar da luta contra o presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram se fundir com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EIIL e a central da Al Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do racha com a Al Qaeda, o EIIL fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando sua segunda maior cidade, Mossul, em 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já havia sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
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Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Ela é uma importante rota de exportação de petróleo e ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Mas a conquista da cidade é vista como apenas uma etapa para os extremistas, que pretenderiam avançar a partir dela.
Foto: Getty Images
Atual abrangência do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho, a organização declarou um "Estado Islâmico" que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e tem Abu Bakr al-Bagdadi como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da charia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado" após serem colocados diante da opção: converter-se ao islã sunita, pagar um imposto ou serem executados. Os xiitas também eram alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o patrimônio histórico
O EI destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. Eles diziam que esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do Islã. Especialistas afirmam, porém, que o grupo faturou alto no mercado internacional com a venda ilegal de estátuas menores, enquanto as maiores eram destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Durante suas ofensivas armadas, o "Estado Islâmico" saqueou centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupou diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Seus militantes também se apossaram do armamento militar de fabricação americana das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional.