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Fritz Walter, um protótipo de jogador moderno

Geraldo Hoffmann10 de março de 2006

Ídolo do Kaiserslautern e da seleção alemã, Fritz Walter recusou-se a jogar em grandes clubes europeus e virou nome de estádio da Copa 2006.

Fritz Walter brilhou também fora dos gramadosFoto: AP

Um "armador e goleador genial, carismático, protótipo do moderno jogador de futebol". Essas são algumas das expressões usadas para caracterizar Fritz Walter (1920-2002), que, ao lado do pugilista Max Schmeling, tornou-se o esportista mais popular da Alemanha.

O capitão do time que conquistou o primeiro título mundial para os alemães na Copa de 1954, na Suíça, não só virou titular absoluto da história do futebol alemão, após o glorioso "Milagre de Berna". Ele é considerado um símbolo do renascimento alemão, tendo devolvido aos seus conterrâneos um pouco da auto-estima perdida na Segunda Guerra. Foi um embaixador esportivo do retorno da Alemanha à comunidade internacional.

Fiel ao Kaiserslautern

Nascido em 31 de outubro de 1920, Fritz Walter deu seus primeiros passos nos gramados aos sete anos de idade, como lateral-direito do infantil do FV Kaiserslautern, que mais tarde se uniu ao Phönix para formar o FC Kaiserslautern (FCK). Aos 17 anos, estreou no time profissional do clube, ao qual se manteve fiel até o final da carreira, em 1958.

Em 379 jogos pelo Kaiserslautern, marcou 306 gols e sagrou-se campeão alemão em 1951 e 1953 pela equipe conhecida como "Os 11 de Walter". Em 1956, diante de 100 mil torcedores, fez o chamado "gol do século", com um chute alto de calcanhar, após cobrança de escanteio, contra o Wismut Aue.

Os "11 Caçadores Vermelhos"

Em 1954, com a taça conquistada no 'Milagre de Berna'Foto: AP

Em sua estréia na seleção, treinada pelo "mestre" Sepp Herberger, em 14 de julho de 1940, marcou três gols na vitória alemã de 9 a 3 sobre a Romênia. Contundido no jogo contra a Suécia, na semifinal da Copa de 1958, encerrou sua carreira, após marcar 33 gols em 61 jogos pela seleção.

"Fico triste quando penso que a guerra me roubou os melhores anos de futebol", disse certa vez. Embora Herberger tivesse conseguido privilégios para os jogadores da seleção, Fritz Walter foi recrutado para a infantaria alemã que combateu na França, mais tarde na Sardenha e na frente oriental.

Nessa época, jogou futebol no time dos soldados, fato que relatou em seu livro 11 rote Jäger (11 Caçadores Vermelhos). O "Milagre de Berna", talvez, jamais tivesse acontecido, se não tivesse ocorrido um milagre antes da final em Berna.

Em 1945, Walter tornara-se prisioneiro de guerra da Rússia. Se não tivesse sido reconhecido por soldados húngaros e eslovacos no campo de prisioneiros de Marmaros-Szigett, na Romênia, teria sido mandado para a Sibéria. Um major fascinado por futebol mandou-o de volta à Alemanha.

Ofertas de clubes europeus

No início dos anos 50, o Atlético de Madri ofereceu-lhe um contrato de dois anos, por 250 mil marcos de luvas mais prêmios, uma casa e um carro. Depois de consultar seu "superpai" Sepp Herberger, Walter recusou a proposta. Dehäm is dehäm, disse no dialeto do palatinado: "Em casa é em casa". Seguiram-se recusas semelhantes ao Nancy, da França, e à Inter de Milão.

Como muitos astros do futebol, Fritz Walter também tinha um defeito carismático: sua genialidade em campo contrastava com seu nervosismo. Em jogos decisivos, seu lugar cativo até poucos minutos antes do apito inicial era o banheiro, como ele mesmo contou. Herberger era mais seu psicólogo do que treinador.

Após sete anos de ausência, voltou à seleção como capitão, em 1951, num amistoso contra a Suíça. Três anos mais tarde, voltaria ao país para conquistar um título que era considerado certo para o húngaros. Os "Magiares Mágicos", comandados por Ferenc Puskas, dominavam o futebol mundial à época.

O "Milagre de Berna"

A Alemanha estreou na Copa de 1954 com vitória sobre a Turquia, mas levou uma goleada de 8 a 3 da Hungria no jogo seguinte. Nas oitavas-de-final, novamente contra os turcos, Walter brilhou no 7 a 2 dos alemães. Depois de se destacar também contra a Iugoslávia (2 a 0), o capitão converteu dois pênaltis na vitória de 6 a 1 sobre a Áustria na semifinal.

A caminho da revanche – a final de 4 de julho–, Herberger disse a Walter: "Chegou seu tempo, Fritz". Os húngaros abriram uma vantagem de 2 a 0, mas Max Morlock e Helmut Rahn empataram. O "milagre" só veio nos últimos minutos, quando Rahn assinalou o 3 a 2. Walter foi o primeiro capitão alemão a erguer a taça Jules Rimet, no primeiro momento de alegria coletiva da jovem Alemanha Ocidental.

Homenagem póstuma a Fritz Walter e sua esposa no estádio que leva seu nomeFoto: AP

Ao contrário de alguns outros heróis do Mundial de 1954, Walter, o "gigante sensível e tímido", soube aproveitar sua fama para fazer carreira fora dos gramados. Depois de pendurar as chuteiras, ainda ganhou um bom dinheiro como representante de um fabricante de artigos esportivos, foi dono de um cinema e de uma lavanderia e escreveu vários livros sobre esporte. Em 1985, o estádio do Kaiserslautern foi rebatizado com seu nome.

Em 1948, ele se casara com Italia, uma italiana que fora intérprete das tropas de ocupação francesa na Alemanha. A morte da esposa, no final de 2001, após 53 anos de matrimônio, foi o golpe mais duro sofrido por Fritz Walter, na opinião de amigos. Meio ano depois, em 16 de junho de 2002, despediu-se para sempre de seus fãs.

Ele nunca lamentou o fato de não haver se tornado milionário como jogador de futebol. "Nós vivenciamos os mais belos tempos do futebol. Tudo era familiar e marcado pela camaradagem. Na nossa época, o coração jogava o papel decisivo", escreveu. Bom tempo deve ter sido esse "tempo do Fritz".

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