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Gargalos na Eurocopa desmascaram mito da eficiência alemã

Tom Gennoy de Gelsenkirchen
22 de junho de 2024

Torcedores estrangeiros que viajaram para a Eurocopa 2024 se mostram chocados com problemas no transporte público de cidades-sede e atrasos intermináveis dos trens da rede ferroviária alemã.

Caos no transporte de Gelsenkirchen
Cenas de caos em Gelsenkirchen se tornaram rotina na EurocopaFoto: Thomas Gennoy/DW

É perto da meia-noite de quinta-feira (20/06) e dezenas de milhares de torcedores espanhóis e italianos caminham calmamente por uma passarela em direção à estação de bondes da Arena AufSchalke, em Gelsenkirchen, no oeste da Alemanha. Os italianos estão previsivelmente abatidos depois de passarem a noite assistindo ao seu time ser derrotado na Eurocopa 2024. Estranhamente, porém, os vitoriosos espanhóis também parecem tristes. É fácil de entender.

Abaixo deles, a cada cinco minutos mais ou menos, um bonde passa e recolhe passageiros antes de seguir, em ritmo de lesma, em direção ao centro da cidade. Ocasionalmente, do outro lado da estação mal sinalizada, um ônibus estacionado nas proximidades dá sinais repentinos de vida, abre as portas, enche-se de torcedores e sai para se juntar imobilizado a um engarrafamento próximo.

Nesses intervalos irregulares e infrequentes, a multidão avança alguns metros, mal diminuindo, antes de retomar o que parece ser uma espera interminável. Por que há tão poucos veículos? Por que isso está demorando tanto? E por que isso continua a acontecer?

Sensação geral de desordem

Os primeiros torcedores a serem submetidos a essa provação foram os que assistiram ao jogo da Inglaterra contra a Sérvia no domingo (14/06), o primeiro dos quatro jogos da Eurocopa a serem realizados nesse estádio.

Muitos passaram mais de uma hora amontoados na passarela próxima da estação. Centenas de pessoas optaram por caminhar mais de sete quilômetros de volta ao centro da cidade ou às cidades vizinhas em vez de enfrentar a espera ou a multidão. Outros problemas os aguardavam na estação central de Gelsenkirchen, com a superlotação nas plataformas e a falta de comunicação dos operadores, aumentando a sensação geral de desordem.

A DW conversou com funcionários da empresa de transporte público local, a Bogestra, que pareciam orgulhosos do suposto progresso que haviam feito desde domingo. Posteriormente, a reportagem da DW também conversou com torcedores que se mostraram atônitos ao serem informados que as autoridades de trânsito consideravam os preparativos de quinta-feira uma melhoria do quadro.

"Melhorias em relação a quê?", perguntou Finn, um jovem torcedor escocês que só conseguiu chegar à estação central de Gelsenkirchen duas horas depois do apito final. "Aquela passarela era tão estreita que estávamos amontoados lá dentro como sardinhas", disse ele.

Estacionamento vazio

Duas horas antes, grupos de torcedores puderam ser vistos subindo as margens íngremes e lamacentas até a passarela em questão, depois de terem errado o caminho ao sair do estádio. Em seguida, eles foram forçados a escalar as grades para acessar a passarela, que tem vista para um vasto edifício-garagem. O estacionamento estava quase totalmente vazio no domingo e na quinta-feira.

"Quando o Schalke joga, muitas pessoas vêm com seus carros", disse um policial à DW no domingo. Mas, embora o carro possa ser um meio de transporte viável para os torcedores que chegam de cidades próximas, como Wattenscheid ou Herne, dificilmente faz sentido para aqueles que moram em Milão ou Madri e vieram para a Alemanha de avião.

"Todos os trens parecem estar atrasados"

Um porta-voz da prefeitura de Gelsenkirchen disse à DW que, no jogo entre a Sérvia e a Inglaterra, no último domingo, foram disponibilizados o dobro do número de bondes do que aqueles normalmente em serviço para um jogo do Schalke. Mas provavelmente os torcedores ingleses e sérvios que foram engolidos pelo caos não encontrarão muito conforto nessa afirmação.

Dada a capacidade geral limitada da rede de bondes e a dependência óbvia do transporte público pelos torcedores visitantes da Eurocopa , o horário de início das partidas nesse estádio – 21h – tem se mostrado problemático. Em duas ocasiões, a saída simultânea de 50 mil torcedores evidenciou a deficiência da infraestrutura nesse tipo de situação, causando muita angústia e desconforto entre os torcedores cansados.

Também se pode questionar a escolha de Gelsenkirchen como cidade-sede. Cidades como Nurembergue, Bremen ou Hanôver têm estádios grandes e modernos, mas não foram selecionadas.

Mas os torcedores também enfrentaram problemas em outros locais. A DW conversou com torcedores escoceses que descreveram condições caóticas de viagem em Munique, Colônia e outras cidades desde que chegaram à Alemanha, como atrasos inesperados e inexplicáveis nos trens, que têm sido a principal fonte de frustração.

"A atmosfera tem sido fantástica, mas o sistema de transporte tem sido um pesadelo", disse Davey, que regularmente assiste aos jogos da Escócia fora de casa na Europa. "Todos os trens parecem estar atrasados."

Painel mostrando atrasos na rede ferroviária alemãFoto: Paul Zinken/dpa/picture alliance

O mito da eficiência alemã em questão

O mito da "eficiência da Alemanha" saiu chamuscado na última semana. Torcedores que visitam o país têm se mostrado decepcionados com frequência, enquanto a imprensa estrangeira, incluindo o jornal The New York Times, chamou a atenção para as deficiências na infraestrutura e destacou que velhos estereótipos de eficiência estão ultrapassados. Se não fosse pelo futebol e pela atmosfera contagiante que a Eurocopa 2024 tem apresentado até agora, as falhas no transporte e a má organização poderiam ter prejudicado ainda mais a imagem do torneio.

Gelsenkirchen, no entanto, ainda não foi palco de um clássico. Poucas cenas da sofrida vitória da Inglaterra sobre a Sérvia deverão ser lembradas nos destaques do torneio. Mesmo a partida entre a Espanha e a Itália não esteve à altura das expectativas. Portugal e Geórgia, que jogam na próxima quarta-feira, terão que se esforçar se quiserem que a Arena AufSchalke seja palco de algum momento de destaque ainda na fase de grupos. Depois disso, resta apenas um jogo das oitavas de final. Isso pode ser um alívio tanto para os torcedores quanto para os organizadores.

O futebol, assim como a organização, ainda não conseguiu brilhar nessa cidade no coração do Vale do Ruhr. Os problemas são abundantes em muitas cidades do país, mas o epicentro do caos organizacional foi mesmo aqui. O mito da eficiência alemã está sendo enterrado – e Gelsenkirchen parece ser o cemitério.