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Gestão da pandemia evidencia morosidade da política alemã

19 de novembro de 2021

Alemanha vive uma quarta onda de covid-19 e, de novo, o governo parece despreparado e inerte, repetindo um comportamento observado também em outras crises, apontam especialistas. Os políticos não aprendem com seus erros?

Enfermeira cuida de paciente na unidade de terapia intensiva de um hospital em Berlim
A incidência de novas infecções nos últimos sete dias ultrapassou 300 na AlemanhaFoto: Fabrizio Bensch/REUTERS

Com 894 gols marcados e 1.963 assistências, não é à toa que Wayne Gretzky é considerado o melhor jogador de hóquei no gelo de todos os tempos. Quando questionado sobre o segredo de seu sucesso, o canadense disse uma vez: "A maioria dos jogadores é muito boa, mas eles patinam para onde o disco está. Eu ia para onde o disco iria estar."

É este senso de antevisão que separa os bons jogadores dos craques. Levada esta analogia à administração pública, a Alemanha seria um time de hóquei no gelo bem medíocre, porque mesmo na quarta onda de coronavírus, o país apenas corre desnorteado atrás do disco. Vacinas de reforço para maiores de 70 anos? Preparadas tarde demais. Testes obrigatórios em lares de idosos? Negligenciados. Taxa de vacinação estagnada? Politicamente aceita, segundo críticos.

"Queremos agradar a todos"

"Para mantermos a analogia, as condições instáveis do ringue de patinação respectivas a uma pandemia não condizem com os pontos fortes dos alemães. O disco não se comporta de maneira previsível. A espontaneidade não é um ponto forte dos alemães, mas em tempos de crise muitas vezes é o caminho para o sucesso", diz Frank Roselieb, especialista em comunicação de crises.

"Queremos planejar tudo, levar todo mundo em conta e agradar a todos – desde o defensor da privacidade em relação ao aplicativo Corona-Warn [para o rastreamento de infectados] ao cético da vacina que hesita sobre a regra 2G [medida que restringe o acesso a locais apenas a vacinados e curados] em áreas de alta incidência. Isso não tem como funcionar. Não é assim que você se torna um campeão mundial de hóquei no gelo", continua. E também não é assim que se contém o coronavírus neste segundo outono europeu na pandemia.

Números aumentam, e Alemanha só observa

Em tempos de pandemia, Roselieb se tornou bastante procurado: ele comanda o Instituto de Pesquisa de Crises, localizado na cidade de Kiel, no extremo norte da Alemanha, e especializado em comunicação de crises.

A Alemanha caminha para fornecer a prova final de que não é mais capaz de lidar com crises adequadamente. Na quarta-feira, o país registrou uma taxa de incidência de sete dias de 319,5 casos por grupo de cem mil habitantes, além de 294 mortes em 24 horas e quase 53 mil novas infecções – um recorde em toda a pandemia.

E tudo isso apesar dos inúmeros alertas de cientistas durante o verão europeu de que os casos aumentariam com a chegada dos meses mais frios. E também apesar de haver doses de vacina suficientes para proteger a todos.

Como o especialista em crises classificaria alguém que comete erros similares repetidamente? "Incapaz de aprender. A Alemanha não comete necessariamente os mesmos erros. Ela apenas se mostra bastante persistente em não aprender rápido o suficiente e em não tomar decisões difíceis e impopulares, caso necessário", diz Roselieb.

"Depois de tomar medidas corajosas em março de 2020, a Alemanha frequentemente agiu de forma muito hesitante e exageradamente correta nas fases posteriores da pandemia. Um pouco de ditadura controlada faz parte de toda boa democracia em tempos de crise. Outros países conseguem fazer isso muito melhor", afirma.

Exterior dá exemplo

Na França, por exemplo, o presidente Emmanuel Macron tornou a vacinação obrigatória para profissionais de saúde, implementou um passaporte de covid-19 uniforme e iniciou uma campanha de vacinação massiva para jovens de 12 a 17 anos A Espanha, que está próxima da imunidade coletiva, fez com que as pessoas ligassem e pedissem por vacinas. E na Itália há o risco de multas elevadas para pessoas que foram trabalhar sem apresentar comprovante de vacina, recuperação da doença ou teste negativo.

No exterior, há espanto e consternação quando se olha para a titubeante Alemanha. No mapa que retrata as incidências locais, os tons de vermelho estão ficando mais escuros a cada dia. A Alemanha tem uma taxa de pouco mais de 67% da população completamente imunizada e poucos curados – o que é abaixo do necessário para alcançar a tal imunidade de rebanho.

"Em quase 25 anos que tenho feito isso, nunca vi um caso em que um político fosse punido por agir desmoderado ou muito rapidamente", afirma Roselieb. "Os punidos [politicamente] são aqueles que mantiveram as mãos no colo e disseram: 'Vai ficar tudo bem'. Portanto, todo político é aconselhado a fazer além do habitual, em vez de muito pouco, em tempos de crise e desastre. Muitos preferem não fazer nada porque temem as más notícias e que o estigma da pandemia permaneça com ele", analisa.

Várias crises ao mesmo tempo

O coronavírus provavelmente teve uma vida fácil no país porque o foco da Alemanha estava completamente em outro lugar em meados do ano: nas enchentes na Renânia-Palatinado e na Renânia do Norte-Vestfália; no desastre em torno da retirada de militares e cidadãos do Afeganistão; e nas eleições federais. Os políticos ficaram obviamente sobrecarregados com a multitarefa, ou seja, com a necessidade de ter que lidar com várias crises ao mesmo tempo.

E como se isso não bastasse, o coronavírus encontra agora um país com um vácuo de poder: um governo administrativo que não pode mais tratar da crise de maneira adequada, e um novo que ainda está em meio a negociações de coalizão.

"Este é um momento desfavorável para a Alemanha ser capaz de tomar decisões sobre a pandemia de coronavírus. O antigo governo não se sente mais responsável, e o novo ainda não é capaz de funcionar e agir. E é claro que o coronavírus não se incomoda com esse interregno, esse ínterim", diz Karl-Rudolf Korte, professor de ciência política da Universidade de Duisburg-Essen.

Korte tem se empenhado em responder a questão sobre o papel da política na imponente quarta onda de covid-19. O especialista, que é frequentemente entrevistado em programas de TV como analista eleitoral, publicou um livro intitulado Coronacracia – Governança democrática em tempos excepcionais. A questão central: o que a pandemia está fazendo ao nosso sistema político?

"Na Alemanha somos apaixonados por mesas redondas, todos os envolvidos devem ser conduzidos a uma democracia do afago. Isso leva mais tempo, mas garante um alto grau de paz social. A política se preocupa em manter isso e, portanto, reluta em tomar medidas duras. Raramente invoca o tom de ordem", diz Korte.

Angela Merkel ou Olaf Scholz? Vácuo no poder deixa indefinido quem é responsável pelo combate à pandemiaFoto: Kay Nietfeld/dpa/picture alliance

Pouca pressão sobre os não vacinados

A Alemanha é um dos países que evitam tomar medidas mais severas contra os céticos da vacinação. O ministro da Saúde, Jens Spahn, teme que, caso fosse implementada a vacinação obrigatória a profissionais de saúde, haveria uma onda de pedidos de demissão – o que seria um desastre para a já desesperadora escassez de funcionários em asilos e hospitais alemães.

Recentemente, a Academia Nacional de Ciências Leopoldina também defendeu a vacinação obrigatória para educadores e profissionais de saúde, mas o porta-voz da Chanceleria Federal, Steffen Seibert, rejeitou imediatamente.

"O governo tem que lidar com a acusação de que há meses não aumenta a pressão sobre os não vacinados", diz Korte. Como o governo sempre descartou a vacinação compulsória, ele agora se depara com um dilema: a atual situação da pandemia torna a vacinação obrigatória inevitável para certos grupos profissionais, mas, assim sendo, os políticos teriam que quebrar sua palavra. "A afirmação foi um erro porque ela destruiu oportunidades num estágio inicial", afirma o especialista em crises.

Discussões sobre o "Dia da Liberdade"

Há ainda mais declarações e resoluções emitidas nas últimas semanas que não se enquadram na atual situação do coronavírus na Alemanha. Por exemplo, o debate alimentado por alguns políticos e tabloides sobre o fim da situação epidêmica – o chamado "Dia da Liberdade" –, quando será possível fechar os postos de vacinação e abolir os testes gratuitos.

Para os críticos, são muitas avaliações errôneas. Para além da pandemia, os políticos costumam estar errados em tempos de crise, como foi o caso no desastre das inundações, devido à escassez de precauções e alertas, mas também na morosa retirada do Afeganistão – muitas vezes, por inação.

Há um outro comentário famoso do jogador de hóquei no gelo Wayne Gretzky, e que cabe à analogia com o comportamento político da Alemanha: "100% dos tiros que você não dispara erram o alvo".

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