Governo anuncia ação e pede 20 bilhões a Samarco, Vale e BHP
28 de novembro de 2015
União e estados de Minas Gerais e Espírito Santo vão pleitear criação de fundo para custear ressarcimentos, minimizar impactos ambientais e revitalizar a bacia do rio Doce. Recursos serão gerenciados pela Justiça.
Anúncio
O governo federal e os estados de Minas Gerais e do Espírito Santo vão processar a Samarco e suas controladoras, as empresas Vale e BHP Billiton, para que arquem com 20 bilhões de reais das despesas de recuperação dos danos e revitalização das áreas atingidas pelo rompimento de uma barragem de rejeitos de mineração no município mineiro de Mariana.
A tragédia ambiental, ocorrida há três semanas, deixou 13 mortos e resultou no despejo de mais de 50 toneladas de lama ao longo de 850 quilômetros do rio Doce nos dois estados.
"Na segunda-feira, vamos entrar com uma ação de iniciativa conjunta da União e dos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo com o objetivo de criar um fundo de 20 bilhões de reais no seu resultado final", disse o advogado-geral da União Luís Inácio Adams, após reunião com a presidente Dilma Rousseff com os governadores de Minas Gerais, Fernando Pimentel, e do Espírito Santo, Paulo Hartung.
De acordo Adams, o valor, que poderá ser aumentado ao longo da ação, compreenderá uma linha de quatro ações: acabar com os danos, minimizar os impactos do desastre, revitalizar e recompor biologicamente a bacia do rio Doce e indenizar as pessoas que foram prejudicadas.
A intenção do governo é que as empresas façam um ajustamento direto com a Justiça, mas, caso isso não ocorra, a União e os estados podem pedir o sequestro dos recursos com base no faturamento ou no lucro dessas empresas.
Segundo a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que participou da reunião, cabe às empresas a responsabilidade cível, criminal e dos danos, além das multas, e dessa forma os recursos não serão obtidos por meio do Orçamento Geral da União. "O que foi perdido ali está perdido. A cadeia biológica não será reconstruída. Temos que criar condições [para que haja revitalização da bacia]. Teremos que remediar determinadas áreas, trabalhar com sociedade civil e avaliar [os danos]", disse Izabella.
Efeitos a longo prazo e multas
O fundo será composto progressivamente pelos próximos dez anos. No entanto, assim como o valor, o prazo das ações também poderá ser estendido, já que o governo prevê que os efeitos da revitalização podem se estender por até 25 anos. O fundo será privado e não vai passar pelos fundos estaduais, nem da União. A intenção do governo é de que seja administrado pelo Poder Judiciário
"As prioridades são definidas de acordo com um programa que vai ser ainda apresentado. A nossa ação pede que empresa faça uma proposta [de programa] que será homologada pelo juiz. Nós vamos fiscalizar. Se a empresa fizer uma proposta inferior ao que for necessário à recomposição, vamos questionar", explicou Adams.
O advogado-geral informou que a ação proporá que o juiz convide os municípios envolvidos dos dois estados a participar do processo. As três empresas estão em "pé de igualdade", afirmou Adams, já que, como são controladoras, a Vale e a BHP Billiton têm responsabilidade financeira e obrigação de supervisionar as ações da Samarco.
De acordo com Teixeira, os cinco autos de infração que o Ibama já emitiu nas últimas semanas determinam multas, que chegam a 250 milhões de reais com base em legislações sobre poluição por rejeitos e mineração. A ministra informou que o prazo para que a Samarco pague as multas ou recorra da medida ainda não venceu. Outros autos ainda serão protocolados pelo órgão, o primeiro deles relacionado a danos a áreas de preservação permanente.
PV/ab/ots
Tragédia em Mariana
Enxurrada que atingiu Mariana após rompimento de barragem do Fundão, em 5 de novembro, deixou rastro de destruição. Cidade ainda está enterrada na lama.
Foto: DW/N. Pontes
Dificuldades para chegar aos locais atingidos
A reportagem da DW Brasil acompanhou a primeira visita da Defesa Civil de Mariana ao distrito de Paracatu, que fica a 35 quilômetros do centro e foi arrasado pela tragédia. Foi preciso vencer muitas dificuldades na estrada para chegar ao local. Devido ao risco, barreiras de terra foram construídas pela empresa para evitar que ex-moradores trafegassem pelo local.
Foto: DW/N. Pontes
Tentativa de recuperação
Máquinas e homens da Samarco, mineradora responsável pela barragem que se rompeu, trabalham diariamente tentando recuperar as estradas destruídas. Todos os corpos d'água que cruzavam a região ganharam um tom vermelho escuro por causa da presença de minérios. Com as chuvas, o terreno fica ainda mais instável.
Foto: DW/N. Pontes
Lama perigosa
Caminhar pela lama é perigoso. O material despejado sobre o solo endurece quando o sol bate, mas praticamente se liquefaz quando entra em contato com a água. Segundo especialistas, o rejeito de mineração é um material inerte e que não pode ser usado em nenhum setor, como na construção civil. Moradores reviram os escombros sem luva ou qualquer outro equipamento de proteção.
Foto: DW/N. Pontes
Campo de futebol
No antigo campo de futebol, hoje tomado pelos rejeitos, o helicóptero da empresa Samarco pousou para avisar os moradores que eles tinham cinco minutos para fugir antes que a enxurrada de lama chegasse. Vizinhos deixaram tudo para trás e correram pela vizinhança para ajudar crianças e idosos a chegarem ao ponto mais alto do vilarejo.
Foto: DW/N. Pontes
Igreja havia sido reformada
A igreja do vilarejo de Paracatu, construída há mais de 100 anos, havia sido reformada há pouco tempo. Uma cratera ocupa hoje a antiga praça, onde moradores se reuniam todas as noites. Cerca de 70 famílias moravam em Paracatu. Expulsas pela lama, elas estão hospedadas em hotéis de Mariana e querem que o distrito seja reconstruído em outro local.
Foto: DW/N. Pontes
Santos perdidos
Marca na parede do interior da igreja mostra onde a altura que a enxurrada de lama atingiu. De volta ao vilarejo pela primeira vez após a catástrofe, antigos moradores lamentam a destruição e tentam recuperar imagens de santos escondidas na lama. É preciso se equilibrar sobre os assentos que restaram para não afundar.
Foto: DW/N. Pontes
À espera dos donos
Animais de estimação de antigos moradores perambulam pelos escombros das casas, à espera da volta dos donos. Sem água ou comida, eles reviram a lama em busca do que comer. Veterinários de São Paulo fizeram uma campanha e arrecadaram três toneladas de suprimentos para tratar dos animais que estão sendo resgatados.
Foto: DW/N. Pontes
"Eu não sei se esse barro um dia irá sair"
Antigos moradores buscam objetos pessoais enterrados na lama. Depois de uma manhã revirando os escombros, uma moradora mostra o que encontrou: talheres, um aparelho de celular, livros, fotos e até dinheiro. "Eu não sei se esse barro um dia irá sair", diz Uliane Marcelino Tete, que fazia a busca com a ajuda de uma enxada.
Foto: DW/N. Pontes
Centros de doações lotados
Voluntários trabalham no ginásio da cidade para separar roupas e outros objetos destinados aos desabrigados. Em Mariana, os dois centros recebem doações já estão lotados. Mas apesar da grande quantidade de gêneros alimentícios, é provável que o estoque se esgote em trinta dias. Segundo a prefeitura, cidade precisa de mais voluntários para ajudar na separação dos itens.
Foto: DW/N. Pontes
Cidade debaixo da lama
Casas do distrito de Paracatu ainda estão debaixo da lama. A enxurrada atingiu o vilarejo no começo da noite do dia 5 de novembro. Moradores contaram que ouviram um barulho forte se aproximando, mas não conseguiam ver a destruição que ele causava porque já começava a escurecer. Todos os residentes do distrito conseguiram escapar com vida.