Governo e oposição fazem últimas investidas por votos
Jean-Philip Struck16 de abril de 2016
Estimativas indicam disputa apertada na votação do impeachment na Câmara, com oposição em vantagem, mas por pouca margem. Expectativa é que 300 mil pessoas acompanhem processo no gramado da Esplanada.
Anúncio
Após dois dias de debates na Câmara, a votação do processo de impeachment pelo plenário começa neste domingo (17/4) sem que nenhum dos dois lados tenha assegurado uma maioria confortável que permita prever o desfecho da disputa com segurança.
Placares com as intenções de votos elaborados pelos principais jornais do país apontam que a oposição conquistou ao longo da semana uma maioria para dar continuidade ao processo, mas por pouca margem – as sondagens não iam além de cinco votos acima do número de 342 deputados necessários para remeter o processo ao Senado.
A horas do início da votação, prosseguiam negociações de ambos os lados para atrair um grupo de 35 deputados considerados “flutuantes”, que ainda estão indecisos ou não declararam publicamente o voto. A maioria dos levantamentos dos jornais aponta que o governo está abaixo da meta de 172 votos necessários para barrar o processo – ela teria entre 126 e 134.
Só que no caso de Dilma, eventuais ausências a beneficiam, já que na prática contam como um voto a favor do Planalto – e na última semana o governo tem tentado convencer vários deputados indecisos a boicotar a votação. Já é certo que pelo menos dois deputados que entraram de licença vão faltar a sessão – um deles é Clarissa Garotinho (PR-RJ), que estava sendo computada no campo da oposição.
Estratégias
Nos últimos dias, os adversários de Dilma foram tomados por um clima de “já ganhou” causado por uma debandada na quinta e sexta-feira entre aliados do governo, que acabou engordando o placar pró-impeachment poucos dias antes da votação. A oposição também dominou os fatos políticos da semana, ao anunciar praticamente todos os dias o desembarque de um partido da base de apoio da presidente e ao acusar o governo de “comprar” deputados em troca de apoio.
Só que ao mesmo tempo os opositores também têm manifestado preocupação com os últimos movimentos do Planalto, que arregimentou governadores aliados para tentar convencer as bancadas dos seus estados a aderirem ao governo.
O passo a passo do impeachment
03:07
O governo também tem apostado em uma estratégia de tentar solidificar a imagem de Dilma como uma chefe de Estado com reputação honesta que está sendo vítima de um golpe orquestrado por adversários de ficha suja. Com isso, o governo pretende atrair deputados que não gostam muito da ideia de se associar com figuras como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acusado de não ter legitimidade para conduzir o processo.
A oferta de cargos para atrair apoios também não parou. O governo publicou na sexta-feira de noite um número extra do Diário Oficial para nomear e exonerar mais de uma centena de cargos de comissão do governo federal.
Na noite de sexta-feira, Dilma lançou um dos seus últimos apelos ao público. Em um vídeo publicado na internet, ela voltou a afirmar que está sendo vítima de um golpe, chamou os deputados pró-impeachment de “traidores da democracia” e reciclou a estratégia do “medo” já usada contra seus adversários na campanha de 2014.
Só que desta vez o alvo foi seu vice, Michel Temer, a quem ela acusou de pretender cortar programas sociais, caso assuma a Presidência. Temer rebateu a presidente em sua conta no Twitter e disse que as declarações são uma “mentira rasteira”.
Mas o governo também tem mandando sinais contraditórios. Alguns ministros falam que permanecem otimistas, mas outras figuras já especulam como deve ser a batalha no Senado e uma eventual oposição a um governo Temer, apostando que o PT deve abraçar a tese da necessidade de novas eleições gerais.
Outros fatores, como a ordem de votação estabelecida por Cunha, que prevê intercalar inicialmente a votação com as bancadas do Sul e do Sudeste, também devem influenciar a contagem. O Planalto teme que as bancadas sulistas, mais numerosas e hostis ao governo, inflem os números iniciais e acabem provocando pressão sobre deputados pouco convictos de votar a favor do governo ou que vão decidir seu voto na hora, seguindo a tendência que conseguir uma vantagem na largada.
Protestos
Se no interior da Câmara o desfecho ainda permanece incerto, do lado de fora o clima também deve ser de tensão. A Esplanada dos Ministérios vai contar com a presença de 3 mil policiais militares e 500 bombeiros. Um muro de contenção foi levantado para separar os grupos pró e contra o impeachment que vão se reunir em frente ao Congresso para acompanhar a votação. A expectativa é que 300 mil pessoas acompanhem a votação no gramado da Esplanada.
As autoridades do Distrito Federal também resolveram proibir que os manifestantes usem balões aéreos de identificação dos movimentos e bonecos considerados ofensivos e provocativos para grupos adversários, como forma de conter os ânimos. Portanto, peças como o "Pixuleco" e o pato inflável da Fiesp não devem ser vistos em locais próximos do Congresso neste domingo.
Também são esperadas manifestações em outras capitais. Em São Paulo, grupos opositores devem se reunir na Avenida Paulista. Serão montados dois telões para acompanhar a votação. Já os manifestantes pró-governo vão se reunir no Vale do Anhangabaú, no centro.
A cronologia do processo de impeachment
Em dezembro de 2015, Eduardo Cunha dava início ao processo de impeachment da então presidente da República. De "carta-desabafo" à cassação de Dilma Rousseff, relembre os episódios que marcaram o julgamento.
Foto: Reuters/J. Marcelino
O aval
Em 2 de dezembro de 2015, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. A decisão foi tomada no mesmo dia em que a bancada do PT anunciou que votaria pela continuidade do processo de cassação de Cunha no Conselho de Ética, acirrando uma crise política já inflamada no Brasil.
Foto: Getty Images/AFP/Evaristo Sa
Motivo: "pedaladas fiscais"
No mesmo dia, em pronunciamento público, Dilma disse ter recebido "com indignação" a notícia. O pedido de impeachment – apresentado em outubro pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal – acusa a presidente de cometer crime de responsabilidade fiscal, com base na reprovação das contas de 2014 pelo Tribunal de Contas da União, incluindo as chamadas "pedaladas fiscais".
Foto: picture-alliance/dpa
O dia seguinte
Dilma foi notificada oficialmente da abertura do processo em 03/12, logo após Cunha (foto) ler a decisão em plenário. O presidente determinou ainda a criação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados para analisar o pedido de impeachment. Na mesma data, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou duas ações – uma do PT e outra do PCdoB – que tentavam barrar o processo de afastamento de Dilma.
Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
A carta de Temer
Em 07/12, o vice-presidente Michel Temer enviou uma "carta-desabafo" a Dilma, em que expressa mágoas por ter sido, desde o primeiro mandato, um mero "vice decorativo". Ele diz ainda ter "ciência da absoluta desconfiança" da presidente. Especialistas interpretaram o texto como um rompimento de Temer com Dilma – lembrando que é ele quem assume a presidência caso ela sofra o impeachment.
Foto: AFP/Getty Images/E. Sa
Próximo passo: a comissão
O trâmite do processo exige a formação de uma comissão especial, com 65 deputados titulares e igual número de suplentes, indicados por líderes partidários, em quantidade proporcional ao tamanho de cada bancada – é obrigatória a participação de todas as legendas da Casa. Essa comissão dará um parecer pela abertura ou não do processo, que depois irá a plenário.
Foto: Luis Macedo /ABr
Tumulto na Casa
Em 08/12, a Câmara dos Deputados se reuniu pela primeira vez para definir a comissão especial, em votação secreta marcada por tumulto e quebra-quebra. Concorriam duas chapas: uma formada por deputados simpáticos ao governo, e outra oposicionista, favorável à saída da presidente. Venceu a chapa da oposição, com 39 membros, e uma votação suplementar seria realizada para escolher os nomes restantes.
Foto: Antonio Augusto /ABr
Processo suspenso
Essa votação, porém, nunca foi realizada. Ainda na noite de 08/12, o STF suspendeu a tramitação do processo, impedindo temporariamente a instalação da comissão especial. O plenário da Corte decidiu julgar um pedido liminar do PCdoB sobre a constitucionalidade da lei que regulamenta as normas de julgamento de impeachment. O partido criticou, por exemplo, o voto secreto na escolha da comissão.
Foto: EVARISTO SA/AFP/Getty Images
Novo rito de impeachment
Quase dez dias depois, em 17/12, o plenário do STF determinou algumas mudanças no rito de impeachment, que em sua maioria favoreceram a presidente. Os ministros decidiram conceder maior poder ao Senado na análise do afastamento; determinaram que não cabe voto secreto, nem formação de uma chapa alternativa para compor a comissão; mas negaram o pedido do PCdoB de afastar Cunha do processo.
Foto: Roberto Stuckert Filho
Recesso parlamentar
Para angústia do governo – que chegou a sugerir o cancelamento da pausa parlamentar de janeiro –, a análise do processo de impeachment entrou em hiato no fim de dezembro e assim permaneceu até 2 de fevereiro, quando os parlamentares voltaram do recesso. Segundo Cunha, a expectativa era de votar a comissão especial e concluir o processo na Câmara até março, para seguir para julgamento no Senado.
Foto: picture-alliance/Lou Avers
STF analisa embargos
O teor do acórdão em que o STF considera inconstitucionais alguns aspectos do processo de eleição da comissão especial da Câmara foi publicado em 08/03. No mesmo dia, a Câmara reapresentou os questionamentos e pediu a revisão do rito de impeachment pelos ministros do Supremo. Em votação realizada em 16/03, porém, a Corte rejeitou os recursos de Cunha e decidiu manter o rito definido em dezembro.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Comissão está formada
A comissão especial, responsável por analisar o pedido de impeachment na Câmara, foi finalmente formada em 17/03, com deputados indicados pelos próprios líderes partidários. O relator da comissão é Jovair Arantes, líder do PTB na Casa e um dos principais aliados de Eduardo Cunha; e o presidente é Rogério Rosso, líder do PSD na Câmara.
Foto: G.Lima/Câmara dos Deputados
Trabalhos da comissão
Em 30/3, os membros da comissão ouviram dois autores do pedido de impeachment: os juristas Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal. No dia seguinte, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, foi ouvido como testemunha de defesa. No dia 4/4, o ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União, entregou a defesa escrita da presidente e fez a sustentação oral.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Comissão instaura processo
Parlamentares da comissão especial do impeachment votaram no dia 11/04 pela abertura do processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, em sessão marcada por troca de insultos. O placar sobre o parecer do relator Jovair Arantes (PTB-GO) foi de 38 votos a favor e 27 contra.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
A votação na Câmara
Com o parecer admitido pela comissão especial, o processo seguiu para votação no plenário da Câmara dos Deputados. No dia 17/04, em sessão tumultuada e acalorada, os parlamentares decidiram pela continuidade do processo de impeachment, com 367 votos a favor e 137 contra – eram necessários 342 votos favoráveis para a aprovação. A questão segue agora para análise no Senado.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Comissão especial de senadores
Dois dias após a apresentação do parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG, foto), favorável ao afastamento de Dilma, a comissão especial do Senado aprovou, em 06/05, a continuidade do processo de impeachment. Dos 21 senadores, 15 votaram pela aprovação, e apenas cinco votaram contra – três do PT, um do PCdoB e outro do PDT. O presidente da comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB), não votou.
Foto: Agência Brasil/F. Rodrigues Pozzebom
Anulação da votação
Em 09/05, o presidente interino da Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA) – que assumiu o comando da Casa após o afastamento de Eduardo Cunha –, anulou a votação do processo de impeachment realizada na Câmara semanas antes. Horas depois, no mesmo dia, Maranhão voltou atrás na decisão, provocando euforia entre os parlamentares governistas. Votação no Senado aconteceria em apenas dois dias.
Foto: Imago/Zumapress
Senado aprova afastamento da presidente
Em 12/05, após uma sessão de mais de 20 horas, o Senado aprovou por clara maioria a continuidade do processo de impeachment de Dilma. Foram 55 votos a favor do impedimento e 22 contrários. Após o aval dos senadores, a presidente fica afastada por 180 dias, enquanto é julgada, e o vice Michel Temer assume a presidência interinamente.
Foto: Getty Images/M.Tama
Relator defende julgamento final
Em seu relatório final sobre o processo de impeachment, apresentado em 02/08, o relator e senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) defendeu que Dilma vá a julgamento final pelo crime de responsabilidade fiscal. Anastasia argumentou que a presidente afastada abriu créditos suplementares sem autorização do Congresso Nacional e praticou as chamadas pedaladas fiscais.
Foto: Reuters/U.Marcelino
Comissão aprova relatório
Em 04/08, a Comissão Especial do Impeachment no Senado aprovou o relatório do senador Anastasia, favorável ao prosseguimento do processo de impeachment contra Dilma. Dos 21 senadores que compõem a comissão, 15 votaram a favor da continuação do processo, e cinco, contra. Com isso, a comissão encerrou os trabalhos. O relatório seguiu para votação por todos os 81 senadores.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Senado decide levar Dilma a julgamento
Em 10/08, os senadores decidiram, por 59 votos contra 21, levar Dilma a julgamento. A maioria dos senadores seguiu o parecer do relator Anastasia, cujo relatório havia sido aprovado pela comissão especial do impeachment. O resultado indica que Dilma terá dificuldade para reverter seu afastamento definitivo na votação final. Para a condenação são necessários 54 votos.
Foto: Reuters/A. Machado
Iniciada fase final do processo
O Senado deu início à fase final do processo de impeachment no dia 25/08, quase nove meses após sua abertura. O primeiro dia de audiência teve mais de 15 horas de duração e foi marcado por bate-boca entre petistas e senadores favoráveis à saída definitiva de Dilma. O julgamento, que começou com os depoimentos de testemunhas, é comandado pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Discurso de defesa de Dilma
Em 29 de agosto, a presidente afastada Dilma Rousseff apresentou sua defesa da acusação de crime de responsabilidade no Senado. Em sua fala, a petista garantiu que sempre seguiu a Constituição, lembrou os tempos da ditadura militar, usou repetidas vezes o termo golpe e reiterou sua luta pela democracia. "Jamais haverá justiça na minha condenação", afirmou.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Dilma é cassada pelo Senado
Na votação final do processo de impeachment, o Senado decidiu, em 31/08, afastar em definitivo Dilma da Presidência da República. Foram 61 votos favoráveis ao impeachment e 20 contrários – eram necessários 54 para a cassação. Todos os 81 senadores participaram da sessão. Em segunda votação, porém, os parlamentares decidiram por manter o direito de Dilma de exercer cargos públicos.