Governo fecha acordo de leniência de R$ 1,9 bi com a OAS
14 de novembro de 2019
Quantia será devolvida à União ao longo de 28 anos e corresponde ao montante pago em propinas e acumulado no enriquecimento ilícito, além de multas. Empresa foi investigada na Lava Jato.
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O governo federal assinou nesta quinta-feira (14/11) um acordo de leniência com a empreiteira OAS, dado o envolvimento da empresa em desvios de recursos públicos investigados na Operação Lava Jato.
Assinado pela Advocacia-Geral da União (AGU) e a Controladoria Geral da União (CGU), o acordo prevê que a empreiteira pague 1,9 bilhão de reais em até 28 anos. Em troca desta diminuição da pena, a empresa se comprometeu a colaborar com as investigações.
O pagamento deste valor foi dividido em parcelas, corrigidas pela Selic, que começam a cair em 2020 e irão até dezembro de 2047. O montante será destinado aos cofres públicos e as estatais lesadas.
Calculado com base na capacidade de pagamento da empreiteira, que passa por recuperação judicial, o valor total corresponde ao montante pago em propinas e acumulado no enriquecimento ilícito devido a contratos fraudulentos, além de multas.
"As negociações foram realizadas de dezembro de 2018 a novembro de 2019, quando o Grupo OAS colaborou com informações e provas sobre atos ilícitos cometidos por mais de 304 pessoas e de 184 empresas", destacou a CGU em comunicado.
A OAS foi investigada na Operação Lava Jato por realizar pagamentos de subornos e superfaturar obras de licitações públicas em diversos estados do país. Leo Pinheiro, ex-executivo da empresa, foi ainda a principal testemunha na acusação contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso sobre o tríplex no Guarujá, que levou o petista à prisão.
Com o acordo, a OAS poderá voltar a fechar novos contratos com o governo federal. Caso não cumpra o acertado, a empreiteira perde essa possibilidade e também não poderá por três anos celebrar novos acordos de leniência.
Em nota, a OAS afirmou que o acordo é um "marco no processo de colaboração da empresa com as autoridades do país". Além de não comprometer o fluxo de caixa da empreiteira, possibilitando a continuidade da empresa, ele "fortalece a segurança jurídica no combate à corrupção", diz a empresa.
"Este acordo vira uma página e abre a possibilidade de construção de novas histórias", conclui o texto.
Esse foi o 11º acordo de leniência assinado pelo governo federal, sendo nove deles feitos com empresas investigadas na Lava Jato. Segundo a CGU, os acordos preveem pagamentos que chegam, no total, a 13,6 bilhões de reais.
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
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As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
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As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
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De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
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... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
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O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
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Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
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Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.