Governo Lula pretende revogar decretos de armas de Bolsonaro
17 de novembro de 2022
Membro da equipe de transição afirma que revogações devem atingir especialmente armamentos e munições de grosso calibre. Clubes de tiro não serão fechados, mas devem passar por controle mais rígido.
Anúncio
Decretos que passaram a flexibilizar o acesso da população a armas de fogo durante o governo Jair Bolsonaro (PL) deverão ser revogados pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A afirmação foi feita nesta quinta-feira (17/11) pelo senador e ex-governador do Maranhão, Flávio Dino (PSB-MA), que lidera o grupo técnico de Justiça e Segurança Pública da equipe de transição.
Armas de grosso calibre – liberadas a partir de decretos editados por Bolsonaro – são o principal alvo da medida. Elas poderão ser recolhidas porque seus portes, atualmente permitidos, não configuram direito adquirido, de acordo com Dino.
O senador maranhense é cotado para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública – embora haja a possibilidade de as pastas atuarem separadamente – e esteve no Centro Cultural Banco do Brasil, a sede do governo provisório, para a primeira reunião do grupo técnico, que avalia o assunto em detalhes para definir quais ações serão tomadas.
Ainda nesta quinta-feira, Dino se reuniria com o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres.
A revogação das determinações impostas por Bolsonaro é encarada como "escopo principal" dentro da equipe de transição. A razão para isso decorre das promessas e declarações feitas por Lula em relação aos armamentos no país. Durante a campanha, o presidente eleito criticou os decretos que facilitam a compra de armas e de munição.
A jornalistas, Dino destacou que o Estatuto do Desarmamento, de 2003, foi objeto de desmanche durante o governo Bolsonaro. Na época, a legislação tornou mais rígido o controle sobre o comércio de armas no Brasil.
"Temos uma lei vigente, o Estatuto do Desarmamento, que foi objeto de desmonte por atos infralegais, decretos, portarias. Isso, sem dúvida, é um tema fundamental do grupo de trabalho, pois é um tema que o presidente Lula escolheu, e é um tema aprovado pela sociedade brasileira", disse.
Nesse sentido, uma das principais tarefas da transição é avaliar profundamente que tipos de armamentos e de munições estão nas mãos da população brasileira. E, devido a isso, Dino acredita que será necessária uma "modulação", ou seja, uma maior regulação, principalmente em relação às armas de grosso calibre, como fuzis e metralhadoras.
"Provavelmente, haverá uma modulação, no sentido de que aquilo que for de grosso calibre, por exemplo, deve ser devolvido, [deve ocorrer] algum tipo de recadastramento, recenseamento", disse. "O certo é que, daqui para frente, o conceito fundamental é da lei de 2003, do Estatuto do Desarmamento", afirmou.
Controle também em clubes de tiro
Em relação aos clubes de tiro, ligados muitas vezes a partidários de Bolsonaro, o senador Flávio Dino falou que há a possibilidade de ser instituído um maior controle, mas não o fechamento generalizado desses locais.
Anúncio
"Vai haver fechamento generalizado de clubes de tiro? [...] Seguramente, não. Mas não pode ser algo descontrolado [...], porque todos os dias se noticia tiros em lares, em vizinhança, em bares e restaurantes, de pessoas cuja observação está nas matérias dos senhores: possuía registro de CAC [Colecionador, Atirador e Caçador]", afirmou.
Antes, o atirador desportivo era dividido em três níveis, com o mais alto deles, que compete em torneios nacionais, podendo comprar até 16 armas e 40 mil munições por ano. No atual governo, isso caiu. As novas normas extinguiram os níveis. Agora, qualquer um pode adquirir até 60 armas e 180 mil munições por ano.
As piores matanças com arma de fogo nos EUA desde Columbine
Com uma cultura de armamento popular que contrasta com outras nações desenvolvidas, EUA são palco regular de massacres. Até mesmo terroristas islâmicos conseguiram comprar legalmente armas para cometer atentados no país.
Foto: Getty Images/E. Miller
Massacre na escola Columbine, 20/04/1999: 13 mortos
Em 1999, os estudantes Eric Harris e Dylan Klebold assassinaram 12 colegas e um professor, antes de cometerem suicídio. Imagens da frieza demonstrada pela dupla provocaram choque nos EUA. "Columbine" se tornou sinônimo para massacres em escolas. Foi até cunhada a expressão "efeito Columbine" para descrever o impacto que a chacina teve sobre as medidas de segurança e na inspiração de imitadores.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Jefferson County Sheriff's Department
Ataque terrorista em San Bernardino, 02/12/2015: 14 mortos
Em 2015, o casal Syed Rizwan Farook e Tashfeen Malik abriu fogo na sede de um centro de atendimento para portadores de deficiências em San Bernardino, matando 14 e ferindo 22. Farook e Malik haviam se tornado radicais islâmicos nos anos precedentes. Ambos acabaram sendo mortos pela polícia. Os dois fuzis de assalto usados na chacina haviam sido comprados legalmente por um cúmplice
Foto: picture-alliance/dpa
Massacre na base militar de Fort Hood, 05/11/2009: 14 mortos
O major Nidal Hasan, psiquiatra do Exército dos EUA, matou 14 pessoas, entre as quais uma grávida de oito meses, e feriu 30 na base militar de Fort Hood, Texas, em 2009. Mesmo demonstrando sinais de radicalização islâmica, Hasan conseguiu comprar legalmente a pistola semiautomática usada no massacre. Preso em seguida, Hasan foi condenado à morte em 2013 e ainda aguarda execução.
Foto: Reuters
Matança em escola de Parkland, 14/02/2018: 17 mortos
Armado com um fuzil de assalto comprado legalmente, o ex-estudante Nikolas Cruz, de 19 anos, dirigiu-se a sua antiga escola em Parkland, Flórida, onde matou três funcionários e 14 estudantes. Tendo se entregado e se declarado culpado, ele ainda aguarda sentença. Semanas depois do massacre, milhões de jovens protestaram nos EUA por mais controle sobre as armas.
Foto: picture-alliance/newscom/G. Rothstein
Duplo ataque no Maine, 25/10/2023: 18 mortos
Armado com um fuzil, Robert Card, um reservista do Exército dos EUA de 40 anos, abriu fogo em uma pista de boliche da cidade de Lewiston, no estado do Maine. Depois, seguiu para um bar e voltou a disparar. Dezoito pessoas morreram nos dois ataques. Outras 13 ficaram feridas. A caçada ao agressor durou dois dias. Card foi encontrado morto em uma área rural, aparentemente depois de cometer suicídio
Foto: Androscoggin County Sheriff's Office via AP/picture alliance
Massacre em escola de Uvalde, 24/05/2022: 21 mortos
Após comprar legalmente dois fuzis de assalto, Salvador Ramos, de 18 anos, invadiu a escola de ensino fundamental Robb, em Uvalde, Texas. matando dois professores e 19 alunos entre 9 e 10 anos. A polícia demorou mais de uma hora para entrar no local e abater Ramos. O crime reacendeu o debate sobre o comércio desenfreado de armas de fogo nos EUA.
Foto: San Antonio Express-News/ZUMA Press/IMAGO
Ataque racista em hipermercado de El Paso, 03/08/2019: 23 mortos
Com um fuzil de assalto comprado legalmente, o supremacista branco Patrick Wood Crusius, de 21 anos, viajou até El Paso, Texas, cidade com mais de 80% da população de origem latina. Num hipermercado, matou 20 imediatamente, e mais três morreram no hospital. A polícia o identificou também como autor de um manifesto racista publicado na internet.
Foto: picture-alliance/dpa/Bildfunk/AP/The El Paso Times/M. Lambie
Chacina em igreja batista de Sutherland Springs, 05/11/2017: 26 mortos
Devin Patrick Kelley, ex-militar de 26 anos, com histórico de indisciplina e violência doméstica, matou 26, incluindo uma gestante de oito meses, na Primeira Igreja Batista em Sutherland Springs, Texas. Durante a chacina, Kelley foi baleado por um morador da vizinhança. Após fugir, cometeu suicídio. Ele comprara legalmente o fuzil e a pistola usadas no massacre.
Massacre de crianças na escola Sandy Hook, 14/12/2012: 27 mortos
Armado com um fuzil comprado legalmente por sua mãe, Adam Lanza, de 20 anos, abriu fogo na Escola Sandy Hook em Newtown. Das 26 vítimas, 20 eram crianças entre 6 e 7 anos. Antes de se dirigir à escola, Lanza assassinou sua mãe. A escala do massacre provocou indignação, mas ativistas pró-armas tentaram minimizar o episódio, espalhando mentiras de que o massacre fora encenado
Foto: Reuters
Massacre da Universidade Virginia Tech, 16/04/2007: 32 mortos
Armado com duas pistolas semiautomáticas, o estudante sul-coreano Seung-Hui Cho, de 23 anos, matou 32 e feriu 17 no campus da Universidade Virginia Tech, em Blacksburg. Cercado pela polícia, Cho cometeu suicídio. Mesmo sofrendo problemas mentais, ele conseguiu comprar legalmente as armas usadas na chacina. Num manifesto, Cho chamara os autores do massacre de Columbine de "mártires"
Foto: TIM SLOAN/AFP/Getty Images
Ataque terrorista em boate gay de Orlando, 12/06/2016: 49 mortos
Armado com um fuzil de assalto e uma pistola, o americano de origem afegã Omar Mateen, de 29 anos, entrou na boate gay Pulse, em Orlando, e matou 49, ferindo ainda 53. Em telefonema à polícia durante a chacina, Mateen fez um juramento de lealdade ao grupo jihadista "Estado Islâmico". Ele acabou sendo abatido pela polícia. As armas usadas na chacina haviam sido compradas legalmente .
Foto: Reuters/S. Nesius
Massacre em show de Las Vegas, 01/10/2017: 60 mortos
Stephen Paddock, investidor de 64 anos, se hospedou num hotel de Las Vegas e estocou mais de 20 fuzis de assalto comprados legalmente em duas suítes do 32º andar, que tinham vista para um espaço de concertos a céu aberto. Quando o local sediou um festival, Paddock abriu fogo, matando 60 e ferindo 413, e suicidou-se em seguida. Foi o pior massacre cometido por um só individuo na história dos EUA