Governo turco admite que pode haver "injustiça" pós-golpe
1 de agosto de 2016
Primeiro-ministro da Turquia afirma que erros podem ter sido cometidos e que Ancara vai verificar possíveis falhas. Desde a tentativa de golpe, quase 20 mil pessoas foram detidas, e mais de 50 funcionários, afastados.
Anúncio
O primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, admitiu nesta segunda-feira (01/08) que pode ter havido um tratamento "injusto" na repressão iniciada na sequência da tentativa de golpe de estado na Turquia.
Desde 15 de julho, quase 19 mil pessoas foram detidas e estima-se que mais de 50 mil funcionários públicos e membros das Forças Armadas tenham sido afastados dos cargos.
"Definitivamente, deve haver alguns entre eles que foram submetidos a procedimentos injustos", reconheceu Yildirim em entrevista à agência estatal de notícias Anadolu. "Vamos fazer uma distinção entre os que são culpados e os que não são", prometeu.
O vice-primeiro-ministro, Numan Kurtulmus, endossou o posicionamento do governo: "Se houver qualquer erro, vamos corrigi-los."
A comunidade internacional pressiona a Turquia a dar esclarecimentos sobre o expurgo. EUA e Europa fizeram duras críticas às medidas adotadas pelo presidente Recep Tayyip Erdogan.
A decisão foi condenada na Turquia, e o porta-voz da presidência, Ibrahim Kalin, a chamou de "violação da liberdade de expressão e do direito à liberdade de reunião".
O protesto pró-Erdogan em Colônia reuniu neste domingo de 30 mil a 40 mil pessoas, segundo a polícia. Os manifestantes foram às ruas para demonstrar solidariedade ao líder turco após a tentativa de golpe de Estado.
O regime de Erdogan também ameaça a União Europeia (UE) com o rompimento do acordo sobre refugiados se a exigência de visto para cidadãos turcos que desejarem viajar para países do bloco não for eliminada até outubro.
Nesta segunda-feira, autoridades turcas se encontraram com chefes das Forças Armadas dos EUA para discutir a extradição do clérigo muçulmano Fethullah Gülen, acusado por Erdogan de ter coordenado a tentativa de golpe de Estado. Gülen vive em exílio autoimposto nos EUA.
KG/afp/rtr/dpa
Hagia Sophia na disputa das religiões
A Basílica de Santa Sofia, ou Hagia Sophia, em Istambul, é objeto de uma disputa. Nacionalistas turcos querem transformar atual museu em mesquita; enquanto o patriarca dos cristãos ortodoxos quer que volte a ser igreja.
Foto: picture-alliance/Marius Becker
Marco arquitetônico
No ano de 532, o imperador romano Justiniano 1º, que residia em Constantinopla, ordenou a construção de uma imponente igreja, "como não existe desde a época de Adão e nunca existirá novamente". Mais de 10 mil operários trabalharam nela. Dentro de apenas 15 anos, a estrutura externa era inaugurada. Durante um milênio a basílica foi o maior templo do cristianismo.
Foto: imago/blickwinkel
Palco de representação estatal
Consta que Justiniano 1º investiu quase 150 toneladas de ouro na construção da Hagia Sophia ("Sagrada Sabedoria" em grego). Mas em breve ela precisou ser reformada: projetada com uma forma plana demais, sua cúpula desabou durante um terremoto. Em breve a basílica passou a ser utilizada como igreja do Estado. Desde meados do século 7º, quase todos os soberanos bizantinos foram coroados nela.
Foto: Getty Images
De igreja a mesquita
O domínio bizantino sobre Constantinopla teve fim em 1453, quando o sultão otomano Mehmet 2º conquistou a cidade e transformou a Hagia Sophia em mesquita. Cruzes cederam lugar à lua crescente, sinos e altar foram destruídos ou desmontados, mosaicos e pinturas murais foram caiados por cima. Com a construção do primeiro minarete, o prédio sacro ganhou aparência muçulmana também por fora.
Foto: public domain
De mesquita a museu
Em 1934, o fundador da República da Turquia, Mustafa Kemal Atatürk (foto), transformou em museu a "Ayasofya", como é denominada em turco, na atual metrópole de Istambul. A secularização acarretou minuciosos trabalhos de restauração. Os antigos mosaicos bizantinos foram revelados, porém cuidou-se também para não destruir os posteriores acréscimos muçulmanos.
Foto: AP
Islã e cristianismo lado a lado
A agitada história da Hagia Sophia se apresenta a cada passo aos visitantes atuais: nesta foto, os nomes "Maomé" (esq.) e "Alá" (dir.) ladeiam Nossa Senhora com Jesus no colo (ao fundo). Notáveis são também as 40 janelas da grande cúpula: além de deixar entrar a luz, elas impedem que rachaduras se expandam, destruindo a estrutura cupular.
Foto: Bulent Kilic/AFP/Getty Images
Ícones bizantinos
O mosaico mais imponente da Basílica de Santa Sofia (como também é conhecida no mundo cristão) é uma imagem do século 14, na parede da galeria sul. Mesmo não estando completamente preservado, os rostos ainda estão bem visíveis: no meio aparece Jesus, como senhor do mundo, Maria está à sua esquerda e João, à direita.
Foto: STR/AFP/Getty Images
Proibido rezar
Hoje em dia é proibido orar na Hagia Sophia. Bento 16 também obedeceu essa determinação durante a visita que fez ao local, em 2006, a qual transcorreu sob forte esquema de segurança, devido aos protestos dos nacionalistas contra a presença do papa. Recentemente a associação nacionalista-conservadora Juventude Anatólia reuniu 15 milhões de assinaturas, para que o museu volte a ser mesquita.
Foto: Mustafa Ozer/AFP/Getty Images
Alto valor simbólico
Não faltam construções sacras muçulmanas nas cercanias da Hagia Sophia. Logo ao lado erguem-se os minaretes da Mesquita do Sultão Ahmed, também conhecida como Mesquita Azul (dir.). Os nacionalistas exigem a transformação da basílica em mesquita: ela simbolizaria a tomada de Constantinopla pelos otomanos, constituindo, portanto, um legado islâmico que precisa ser preservado.
Foto: picture-alliance/Arco
Reivindicações ortodoxas
O patriarca de Constantinopla Bartolomeu 1º também reivindica a Hagia Sophia. Há anos o líder honorífico de todos os cristãos ortodoxos apela para que a basílica seja reaberta à liturgia. "A Hagia Sophia foi construída para ser testemunha da fé cristã", argumenta o bispo ortodoxo.
Foto: picture-alliance/dpa
Destino em aberto
O futuro da Hagia Sophia é incerto. Até agora, somente o partido nacionalista MHP reivindica a transformação do museu em mesquita. Dois requerimentos seus já fracassaram no Parlamento. O governo turco não se manifesta sobre essa questão, aparentemente em reação a protestos internacionais. A Unesco também está preocupada: afinal, desde 1985 a Hagia Sophia é Patrimônio Cultural da Humanidade.